Fugas - dicas dos leitores

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Chegar ao Brasil de navio por Salvador

Por Maria Helena

Saí do Porto de Salvador e logo ali apanhei um táxi. Oitenta reais? Nem pensar! Setenta? Não, sessenta e não se fala mais nisso! Mesmo assim fui aldrabada, soube mais tarde que a corrida nunca seria mais de 40, já por cima, incluindo o trânsito que estava intenso àquela hora da manhã e a mala pesada, pesadíssima!

Passei pelo Mercado Modelo, mesmo ali ao lado, pelo Elevador Lacerda, onde, em andamento, tirei a primeira fotografia. A conversa com o taxista fluía naturalmente e, sempre disponível, respondia-me com ar de sabedor e perguntava com curiosidade.

– Meu nome é Chico. É um prazer!, cumprimentou. Qual o destino, senhora?

– Ah, prazer senhor Chico! Eu vou para a Pousada Colonial, lá na Rua Direita de Santo António, devolvi.

– Bem lá no centro … é rápido mas este trânsito atrasa tudo, né!, reclamou. Então veio neste navio? Lindão ele?! Veio lá da Europa, fez a travessia de Álvares Cabral! Deu até na televisão a sua chegada ao porto!, disse-me. É bom pró negócio!

– É, fiz a travessia nesse navio!, respondi certa de uma realidade passada. Saiu muita gente, então deve ser bom mesmo.

– E seu esposo? Não veio? Já está cá?, perguntou, curioso.

– Ah, eu vim sozinha!, esclareci.

– É mesmo!, exclamou alto. Atravessou esse marzão sozinha? Vixe, dá até medo!

– É, nove dias! Mas não dá medo, é bem tranquilo!, acalmei-o, mudando de assunto. Salvador é lindo e é bem parecido com Portugal, com o Porto e Lisboa! Você já foi a Portugal?

– Que nada! Nunca saí daqui não! Mas já vi na televisão e sempre os portugueses me dizem isso … também cês que chegaram cá primeiro!, afirmou. É lindo sim, mas é um lamento de se ver cada casa mais linda que a outra, dessa era colonial, destruída e ninguém se interessa em melhorar, em “tombar”!

– “Tombar”?! Você quer dizer classificar o património?, tirei a dúvida.

– Isso! Os políticos não cuidam de Salvador e chega nessa destruição e ninguém faz nada, reclamou de novo.

– Infelizmente, isso é assim um pouco por todo o mundo. É preciso muito dinheiro para recuperar e os privados deveriam investir mais!, opinei.

– Ah, dona, isso você não tem cá … Cada um só pensa em encher mais o bolso, que já é cheio … O povo é que vive na miséria. É muito triste!, filosofou sobre a realidade difícil, para logo de seguida agradecer a vida. Mas a gente leva! E a gente é feliz também, graças a Deus … Olha só esse solzão abençoado! Deus é pai e Deus é brasileiro também! Ele cuida da sua gente, quem num cuida é político safado e rico sem vergonha!, concluiu.

Concordei.

Depois de dez, talvez quinze minutos de rodagem, sem saber se era o melhor caminho, mas confiando, sempre confiando, entrei no centro histórico de Salvador e cheguei à minha rua.

A beleza da traça herdada dos tempos coloniais misturava-se com o evidente descaso. Há casas cuidadas porque são utilizadas para o turismo, penso que será um dos maiores ganha-pão de Salvador, senão da Bahia, mas depois todas as outras, que são a maioria, estão entregues à capacidade de cada um cuidar ou estão mesmo abandonadas

Mas eu apenas via a beleza, e só mais tarde percebi que Salvador encerra em si mais que beleza. Não é melhor, nem pior. É uma herança secular muito pesada, presente nas diferenças sociais que vai mais além da raça, e que se vive, sobrevive e convive como em nenhum outro lugar. E isso também me fazia feliz!

Sorria, você está na Bahia!

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A autora assina o site Viagens da Helena. No Facebook em 
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