“I had a farm in Africa.” Assim começa o filme e o livro África Minha, de Karen Blixen. Já tinha visto o filme há muitos anos e logo nessa altura fiquei com vontade de conhecer o país que lhe serviu de cenário. Partimos assim para Nairobi, onde nos esperava um guia simpático que tinha por missão levar-nos à casa que foi de Karen Blixen e que serviu de cenário ao filme.
Actualmente é um pequeno museu cheio de memórias da escritora. Ainda se podem ver algumas das suas roupas, a máquina de escrever, a mala, o gira-discos, o relógio de cuco. Com o guia, aprendemos que algumas das palavras do dialecto suaíli ( o mais falado no Quénia, sendo certo que há 42 tribos e cada uma fala ao seu dialecto) foram levadas pelos portugueses.
De seguida, partimos em direcção a Abardare, região onde vive a tribo kikuio, a mais populosa do Quénia. Na berma da estrada, vendiam os seus produtos agrícolas. Pelo caminho, uma curta paragem para apreciar a cascata Thompson, que tem servido de cenário a vários filmes: Sheena, a Rainha da Selva e também O Rei Leão. Aqui tivemos o primeiro contacto com o povo queniano, muito simpático e bem disposto com a vida. Poucos quilómetros à frente, mais uma curta paragem, agora para ver o local onde passa a linha imaginária do Equador. Fizemos a foto da praxe, um pé no hemisfério Norte, outro no hemisfério Sul.
Chegados a Abardare, localizado numa área montanhosa, próxima do Monte Kenya. Ficámos instalados no Abardare Country Club. O local é de uma beleza de espantar. Jardins bem cuidados por onde se passeiam esquilos, macacos, pavões, zebras, javalis e outros animais. Logo nesse dia, na companhia de Boris, funcionário do empreendimento, fizemos um pequeno safari a pé pelas imediações do parque. São mais de cem hectares de savana a perder de vista e onde vimos pela primeira vez muitas girafas que nos olhavam lá do alto com a sua expressão simpática e amistosa. Vimos impalas, macacos, zebras, gazelas e muitos javalis.
No dia seguinte, continuámos a nossa aventura por terras quenianas com o motorista Ali. Começámos pelo lago Naivasha, um dos maiores do Quénia, repleto de hipopótamos. Nas margens do lago, é possível visitar a casa da conservacionista Joy Adamson, autora do best-seller A história de Elsa sobre a amizade dela com a leoa Elsa. Joy era uma personalidade influente no Quénia, pois ao lado do marido lutou contra os caçadores ilegais do parque Kora. Foi assassinada por um ex-funcionário em 1980, o marido deu seguimento ao trabalho mas também teve o mesmo fim nove anos depois. A belíssima casa de Joy Adamson está aberta a visitas.
Nessa tarde, fizemos um passeio de barco pelo lago Naivasha e foi impressionante a quantidade de aves que vimos, entre as quais a imponente águia pesqueira. No lago, eram dezenas de hipopótamos que entravam e saíam pachorrentamente da água.
Mesmo ao lado, a pequena ilha Crescent Island, onde foram filmadas algumas das cenas de África Minha.
Depois do jantar, um segurança munido de uma lanterna veio ao nosso encontro para nos acompanhar ao quarto, não fosse algum hipopótamo aparecer pelo caminho. Disse-nos que se quiséssemos ver os hipopótamos no jardim ele poderia chamar-nos pelas 22h, altura em que eles começam a sair do lago e vão passear-se pelo jardim. Achámos boa ideia e ficámos à espera. Pouco depois das 22h, vieram chamar-nos e ficamos pasmados de ver tantos hipopótamos passeando-se pelo jardim, pastando pachorrentamente. Contudo, o melhor ainda estava para vir. Cerca da meia noite, ouvimos um pequeno barulho no exterior, levantei-me, afastei os cortinados e, surpresa das surpresas, a um metro da janela dois enormes hipopótamos comiam a relva do jardim. Mesmo ao lado, duas enormes girafas estendiam o pescoço ao cocuruto das árvores para apanhar os ramos mais tenrinhos. Parecia uma cena do filme Jurassic Park.
No dia seguinte, já outro parque natural nos esperava, a Reserva Natural Masai Mara, já na fronteira com a Tanzânia, mesmo às portas do Serengeti, região muito procurada para ver a migração anual dos milhares de gnus. Depois de nos instalarmos numa tenda bem junto a um pequeno rio, de imediato fomos fazer um pequeno safari. Foi inesquecível. Vimos avestruzes na sua dança de acasalamento, suricatas, leões e suas crias a banquetearem-se com uma carcaça de gnu, abutres, chitas e um sem número de aves.
Nessa noite choveu copiosamente. Pela madrugada dentro, apesar da chuva que não parava de cair, ouviam-se os chocalhos das vacas que os masai conduziam para os pastos. Tínhamos de nos levantar pelas 7h para novo safari. Os caminhos estavam cheios de água e poucos quilómetros à frente ficámos parados na estrada. A água que corria na ribeira era muita e o Ali não quis arriscar. Esperámos cerca de duas horas e depois, já com o caudal bem mais reduzido, continuámos e só parámos numa pequena aldeia masai, um grupo étnico africano de seminómadas. É um povo orgulhoso e indomável, composto por pastores e guerreiros, que tem muito orgulho nas suas tradições. A sua beleza negra é conhecida, assim como as roupas tingidas em tons de vermelho e o andar majestoso. A vida deles gira em torno do gado, que fornece a base da sua dieta. A classe social de um masai é determinada pelo número de vacas e cabras pertencentes à família.
Foi enriquecedor o contacto com esta tribo. A forma como vivem, as casas minúsculas dispostas em forma circular e feitas de estacas de acácia, revestidas de bosta de vaca, material que por aqueles lados será o mais usado na construção. Essa única “assoalhada” não terá mais de 5m2 e serve de cozinha, quarto e sala de estar, como explicava Tinkói, o simpático masai que fez de cicerone pela aldeia. As danças características desta tribo guerreira são um encanto e foi dessa forma que nos saudaram com a dança da fertilidade e a dança a pedir chuva. Os homens brindaram-nos com a dança guerreira, que servia para para se motivarem para as lutas ou para a caça.
Partimos depois em direcção ao rio Mara à procura de crocodilos mas vimos apenas muitos hipopótamos. Em busca de leões, o guia começou a ir por trilhos completamente alagados e começámos a ficar preocupados, pois corríamos sérios riscos de ficar atolados na lama. O risco valeu a pena e fomos parar mesmo junto a um grande leão entretido com uma grande carcaça. Um pouco à frente, uma grande manada de elefantes passeava-se calmamente pela savana. Ao longe, o guia apercebeu-se de um grande leopardo, imóvel, possivelmente a caçar. Dirigimo-nos para lá, ficámos a cerca 50 metros dele mas só o vimos fugazmente. No último dia na reserva, e já a caminho de Nairobi, voltámos a ver uma grande manada de elefantes. Um pouco à frente, um grande rinoceronte negro.
Chegámos a Nairobi e no dia seguinte iniciámos a viagem de regresso a casa. Pelo meio, uma escala em Istambul. Quando voltámos a Lisboa, já só pensávamos na próxima viagem.