Fugas - dicas dos leitores

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Está-se muito bem em Belgrado

Por Miguel Machado

Em Belgrado, capital da Sérvia e da antiga Jugoslávia, memória bem presente dos museus aos quiosques de lembranças para turistas, não há qualquer aparato de segurança.

Um ou outro polícia ligeiramente armado, nada de capacetes e coletes à prova de bala, pistolas-metralhadoras, muito menos blindados e revistas para entrar em lugares públicos ou religiosos. Estamos de facto muito longe de Madrid, Bruxelas, Paris, Londres e mesmo de Lisboa. Frente à Narodna Skupstina (Assembleia Nacional) uma tarja a toda a largura do edifício no centro da capital, fotos das vítimas do ataque da NATO em 1999 (75 dias de campanha aérea), exige-se justiça e... o Kosovo. Em frente, com o Pionirki Park pelo meio, o pequeno Predsednistvo (Palácio Presidencial) está guardado apenas por um par de polícias e outro de sentinelas em guarda de honra, as pessoas e o trânsito passam, encostados ao palacete, sem qualquer interferência de segurança.

Nos edifícios do ministério da defesa bombardeados pela NATO — na Avenida Kneza Miloša, dos ministérios e embaixadas, entre as quais o palacete dos EUA, que mais parece um bunker com janelas blindadas — as ruínas permanecem propositadamente visíveis e um painel de enormíssimas dimensões mostra uma militar sérvia, confiante e desafiante, “dizendo” não temos medo, vamos em frente!

Numa das muitas zonas verdes da cidade, um complexo de três edifícios relembra Tito em todas as suas facetas, incluindo a morte (ali está sepultado, com a mulher, na Kuca Cveca, Casa das Flores). Excursões e escolas vêem o que foi o seu consulado no Muzej Istorije Jugoslavije (Museu de História da Jugoslávia), num registo de autêntico culto da personalidade.

Pelas igrejas ortodoxas da cidade, desde logo pela maior do mundo, a Hram Svetog Save, dedicada a São Sava, mas também a Catedral dedicada a São Miguel ou a São Marcos, muitos fiéis de todas as idades fazem as suas orações e ofertas.

No centro da cidade, entre a Trg Republike (Praça da República) e a enorme Fortaleza e jardins Kalemegdan, com a sua fantástica vista para o Danúbio e o Sava, lojas de marcas internacionais repetem-se; restaurantes, cafés e bares, muitos, bons, nada caros e com esplanadas sempre a fervilhar de actividade; parques com muita gente; livrarias um pouco por todo o lado — a vida decorre com normalidade. A cidade, um pouco como Lisboa, talvez mais, tem muita coisa a precisar de reparação, mas alguns novos edifícios vão surgindo. Poucos falam a língua inglesa, regra geral só os mais novos, o alfabeto cirílico é para nós impossível de decifrar, poucas ruas e locais vão tendo também o alfabeto latino afixado. O turismo tem aqui um caminho a percorrer mas, contraditoriamente, talvez por isso, está-se bem, muito bem por estes lados. Em Zemun, junto ao Danúbio, depois de ultrapassado o Sava em direcção a Nova Belgrado, nos cafés e restaurantes junto ao rio, ou pelas ruelas estreitas e com calçadas tortuosa que nos levam à Milenijumska Kula (Torre do Milénio, construída em 1896), para ver a paisagem, a vida decorre sem pressas e com alguma animação.

Estamos na Europa e nas terras de quem sempre a defendeu contra os ventos do Oriente. Monumentos e museus militares isso atestam, o turismo nacional da Sérvia, no âmbito do centenário da  Primeira Guerra Mundial, lançou um livro dedicado aos 1,1 milhões de sérvios, militares e civis, que nela perderam a vida, cerca de 1/3 da sua população dessa época, lutando ao lado de Franceses e Ingleses nos Balcãs.

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