A malha embrenhada e confusa que cobre o céu nas principais ruas e o amarelo vivo dos eléctricos que percorrem os centros turísticos fazem parte do quotidiano de quem vive ou trabalha em Lisboa. Jaime Nascimento e Guilherme Nunes vivem na cidade há pouco mais de meio ano e terá sido esse fascínio recente que os levou a observar com mais atenção as particularidades da sua paisagem. Ficaram "encantados com Lisboa". E, de nariz no ar, decifraram a LX Type — a "fonte oficial de Lisboa".
Para além da “paixão pela cidade” e do “gosto em andar de eléctrico”, o copywritter e o director de arte explicaram ao P3 que estão habituados a olhar constantemente à sua volta, na tentativa de encontrar ideias diferentes nas pequenas coisas. “Por defeito profissional”, acrescenta Jaime Nascimento.
A percepção dos caracteres no cruzamento entre os cabos dos eléctricos foi a ideia inicial que deu origem a um novo tipo de letra, a LX Type, reconhecida como fonte oficial pela Câmara Municipal de Lisboa. A fonte desrespeita as próprias regras da tipografia: “normalmente tem de ser muito certa, tem de corresponder a regras rígidas, com uma proporção e um padrão. Aqui a regra foi não ter regras”.
Mas o que em primeiro lugar foi idealizado como um simples projecto de tipografia tornou-se em algo mais abrangente em contexto do trabalho de equipa com a Leo Burnett. "O projecto está a tomar proporções que nós nem imaginámos”, assume Guilherme Nunes.
Em cada letra há uma história
Uma das sugestões que nasceu em equipa veio dar ao projecto um traço característico que permite a turistas ou mesmo aos próprios lisboetas redescobrir a sua cidade através da fonte LX Type. “Ultrapassa-se o simples exercício tipográfico e transforma-se num roteiro personalizado para conhecer ou reconhecer a cidade”, explica um dos criadores, Jaime Nascimento. Isto porque a cada caracter está associado um monumento ou centro histórico de Lisboa, de Alfama a Alcântara, da Bica ao Rossio, da Sé a Belém, locais por onde passa necessariamente um eléctrico.
Esta forma de descobrir a cidade de Lisboa foi concebida inicialmente para turistas e visitantes de passagem pela cidade. Mas desde logo se aperceberam que são principalmente os próprios lisboetas a procurarem os locais que lhes são indicados por correspondência do próprio nome: “As pessoas acabam por se identificar com os lugares a que o seu nome corresponde, lugares que as marcaram ao longo da vida. Onde nasceram e cresceram, onde passam todos os dias”.
Mas por serem tão confusas e intrigantes, as malhas dos eléctricos estão também associadas a algumas histórias e singularidades da cidade, como por exemplo "a luz de lisboa", que corresponde à letra U. Um dos desafios futuros a lançar a quem passar por Lisboa será descobrir entre ruas e vielas novas formas de caracteres ou imagens interessantes destes cabos que "riscam o céu de azul".
O futuro do projecto passa também por expor esta força de identificação e de familiaridade com uma cidade, com a perspectiva de realizar “mini-documentários” sobre a relação das pessoas com os locais a que as suas letras correspondem. O que tinha sido pensado inicialmente para oferecer um guia personalizado especificamente para turistas, acaba por ser uma forma de aproximar os lisboetas à sua própria cidade.