O minhoto Anselmo Mendes é um dos grandes enólogos nacionais e, talvez, o que mais inova a partir da tradição. Como consultor enológico, está associado a vários projectos de sucesso e a vinhos de referência. Bastaria citar os exemplos dos vinhos da Quinta da Gaivosa, no Douro, e da Casa de Cello, Quinta do Ameal e Provam, na Região dos Vinhos Verdes. Mas é como produtor dos seus próprios vinhos que merece os maiores elogios.
Ainda antes dos 50 anos, Anselmo Mendes atingiu a sua idade de ouro com o seu fantástico portfolio pessoal da vindima de 2009 das castas Alvarinho e Loureiro. Trabalhador e criador incansável, reuniu um conjunto de vinhos capazes de surpreenderem os enófilos mais exigentes em qualquer parte do mundo e alcançou a genialidade com o novo Anselmo Mendes Parcela Única, da casta Alvarinho. Era o vinho que sempre quis fazer, o "tal vinho" que persegue todos os enólogos.
Mas começamos pelos outros. Partindo da base da pirâmide, tendo em conta apenas o preço, o seu Muros Antigos Escolha Loureiro 2009 é um caso sério. Porque custa apenas 4,90 euros e é vinho para valer bastante mais. Parece saído de um jardim minhoto. Muito cítrico e floral de aroma, bastante mineral e elegante na prova de boca, compensa a exuberância aromática com uma acidez deliciosa, nada acerba, que torna o vinho muito delicado, fresco e guloso.
Da gama Muros Antigos da colheita de 2009 há ainda o verde Escolha 2009, feito de Alvarinho e Loureiro (4,90 euros) e o Alvarinho (8,5 euros), ambos perfumados e minerais.
O cabaz prossegue com o Alvarinho Contacto (8,5 a 9 euros), um vinho em que as películas estão em contacto com o mosto e que, depois de fermentar, estagia durante quatro meses em cubas de inox sobre as borras finas. Encantador de aroma, com sugestões de citrinos e de algum tropical, é muito enxuto e mineral na boca, com a fruta bem contida por uma frescura que lembra o orvalho da manhã.
Subindo na escala, surge o Muros de Melgaço Alvarinho 2009 (14 euros), um vinho que fermenta e estagia em barricas usadas durante seis meses sobre as borras totais - as borras que resultam da fermentação e a que os antigos chamavam "a mãe". Revolvidas regularmente, protegem os vinhos da oxidação e deixamnos mais estruturados. O risco é poderem ficar um pouco reduzidos e a cheirar a ovos podres. Não é o caso. Menos marcado pela madeira que as anteriores colheitas, é um vinho elegante que exala uma complexidade aromática e uma fi nesse e frescura de boca admiráveis.
Anselmo Mendes repete o procedimento no seu Alvarinho Curtimenta 2009 (22 euros). Inspirado nas suas memórias minhotas, deixa fermentar durante um ou dois dias o vinho em contacto com as películas, leva-o depois à prensa e deixa-o acabar a fermentação em barricas de 225 litros, também usadas, onde estagia sobre as borras totais durante seis meses. É um Alvarinho com o melhor dos anteriores mas mais gordo e envolvente. Um moderno clássico.
Para completar estas variações em torno do Alvarinho, Anselmo Mendes criou o Parcela Única (24 euros). Como o nome indica, o vinho é proveniente de uma única parcela das vinhas que possui em Melgaço. Plantada pelo próprio, desde há 10 anos que andava de olho nela, surpreendido com a qualidade dos vinhos que originava (Anselmo prova os seus vinhos às cegas e aquela parcela sempre se destacou).
O vinho fermentou e estagiou igualmente sobre as borras totais, mas, ao contrário dos outros, passou nove meses em barricas de 450 litros e foi sujeito a pequenas doses de oxigénio (técnica que Anselmo Mendes tem vindo a testar, por acreditar que o oxigénio nos vinhos brancos, introduzido na dose certa, pode ter um papel positivo e não negativo, como é tese corrente).
A primeira surpresa deste Parcela Única reside na falta de evidências que o associem de imediato à casta Alvarinho. A componente frutada típica da casta está lá, mas de forma mais dissimulada. É um vinho menos óbvio que cresce e se vai descobrindo com o arejamento. Os nove meses de estágio em barrica e a battonage deram-lhe uma grande estrutura e complexidade, sem o deixarem refém da influência por vezes excessiva do contacto prolongado com a madeira, apesar de ao primeiro gole o vinho parecer um pouco rugoso. Mas é uma impressão que passa depressa. O que fica é o seu carácter enxuto e seco, o frutado da casta e a sua impressionante mineralidade, que deixa uma interminável sensação de frescura na boca. Um vinho monumental que eleva a casta Alvarinho a um novo patamar de excelência.