Há vinhos que, independentemente da sua qualidade intrínseca, nos tocam de uma maneira especial, em particular aqueles que nos remetem para memórias da nossa meninice. Um determinado aroma ou um traço de sabor que havíamos guardado desses tempos são capazes de nos emocionar, provocando uma empatia imediata com o vinho. Um alentejano que beba este José de Sousa Mayor 2009 pode viver uma experiência semelhante, porque é provável que o mesmo lhe evoque o sabor tão característico da água guardada em vasilhas de barro. Para os saudosistas dos vinhos de talha, a empatia ainda deve ser maior, pois parte do lote que deu origem a este vinho fermentou em ânforas de barro.
A um transmontano-duriense, como é o nosso caso, não é tão familiar esse ligeiro sabor a barro que é possível detectar no vinho desta semana, mas há algo de distinto nele que nos agrada muito. Pode ser do método de vinificação usado (parte em talha e outra em lagar) ou simplesmente do predomínio no lote da casta Grand Noir, um meio-irmão da Alicante Bouschet (esta nasceu do cruzamento da Petit Bouschet com a Grenache e a Grand Noir é “filha” da Petit Bouschet e da Aramon) .
Variedade de bago pequeno (diz-se que as uvas com bagos pequenos têm pedigree, e normalmente são as melhores para vinho), a Grand Noir tem a frescura ácida que muitas vezes falta ao Aragonez. Seja por isso ou não, é muito boa a vivacidade que este José de Sousa apresenta, sobretudo no aroma, ressoando até um pouco ao delicioso vinagrinho que se encontra no vinho Madeira e no Porto Tawny mais velho. Esse lado mais vibrante tem também uma natureza vegetal e especiada, que ajuda a avivar a fruta e a atenuar a sensação de debilidade tânica que a prova de boca pode sugerir num primeiro momento, induzida pela suavidade dos taninos. Muito bom.