Quem já provou vinhos antigos de Favaios sabe que é possível fazer moscatéis extraordinários no planalto desta vila do concelho de Alijó. Vinhos viscosos e de grande riqueza sensorial, que os produtores locais guardavam e guardam para dias especiais. Em geral, o que o consumidor comum bebe é Moscatel jovem, cheio de doçura mas sem a subtileza e a complexidade que o tempo e o estágio em pipas e tonéis avinhados conferem. As excepções são alguns vinhos datados que a Quinta do Portal e, sobretudo, a Adega Cooperativa de Favaios vão lançando, como é o caso do seu magnífico 1980.
Em Setúbal há mais produtores a apostar no envelhecimento de Moscatel e a quantidade de vinhos datados que chegam ao mercado é muito maior. Acresce que Setúbal dispõe não de uma mas de duas variedades de Moscatel: o Moscatel de Alexandria e o Moscatel Roxo (resultante de uma mutação genética do Moscatel Galego do Douro). Setúbal tem também uma história mais antiga e gloriosa, ligada à monarquia nacional e europeia e à epopeia dos Descobrimentos, período em que se tornaram célebres os moscatéis de “torna-viagem”, vinhos que depois de passarem longas temporadas no mar ao sol e à chuva e cruzarem duas vezes o Equador ganhavam qualidades inesperadas.
Hoje, o método é replicado em cave, o que faz com que um vinho de apenas dez anos pareça muito mais velho. Isso é evidente neste formidável Moscatel de 2004 da José Maria da Fonseca, fortificado com aguardente de Armagnac e povoado de deliciosas notas salinas e de evocações de bolo de mel e fruta doce mas com alguma acidez (ameixas, citrinos). Rico e subtilmente especiado, cola-se à boca e à memória ao primeiro trago.