Na moderna geração de vinhos do Alentejo raramente se dispensa o recurso à casta Alicante Bouschet e as plantações de Syrah não pararam de crescer. Um pouco por toda a região, as velhas vinhas baseadas na Trincadeira, no Castelão ou na Aragonez foram recuando, deixaram de fazer parte dos planos das mais recentes gerações de investidores e limitaram-se a ser objecto de culto para jovens que fazem da tradição um acto de irreverência, como António Maçanita.
Não há dúvida que os grandes Alicante exibem uma complexidade e um classicismo irrecusável, nem há margem para se questionar a valia da Syrah. Mas vale a pena perguntar se faz sentido remeter o património de castas da região para a subalternidade.
A resposta está no Reserva da Herdade dos Machados, uma imensa propriedade (são 1900 hectares, mas antes da Reforma Agrária eram 6100) que não deixou de prestar culto a uma tetralogia de castas com uma presença bem vincada na história alentejana – a Aragonez, a Trincadeira, a Alfrocheiro e a Castelão. Os adeptos dos tintos depurados, sem artifícios e portadores das singularidades regionais só podem aplaudir a sua estrutura consistente, os seus aromas vinosos e o seu nervo que recomenda o diálogo com a comida.
No nariz, este vinho nascido no prodigioso ano 2011 mostra fruta madura, que indicia doçura e concentração, e notas de resina do seu já razoável estágio em garrafa. Na boca estreia-se com sensações de veludo, mas depressa deixa transparecer taninos com alguma secura vegetal e acaba com notas de pimenta preta envoltas numa boa acidez. É um vinho potente mas ao mesmo tempo subtil, intenso mas sem deixar de exibir elegância e complexidade. Um Alentejo com identidade de origem, sem facilidades nem concessões, que já se bebe mas ainda dispõe de uma vida longa na garrafa – até porque não foi estabilizado e conserva o depósito natural que o vai alimentar por mais tempo.