Há vinhos que representam muito mais que aquilo que está na garrafa: são história, património, arte. Tal como uma jóia ou objecto artístico, a sua avaliação não se restringe ao mero valor económico. E se há vinhos de algumas regiões — francesas, em regra — que pela sua qualidade, raridade e perspectiva de longevidade facilmente atingem cifras de milhares de euros, então porque não há-de um vinho histórico da Bairrada valer 500 euros?
Este Coleção Privada 1991 de João Póvoa é um vinho monumental. Não só pela juventude que exibe aos 25 anos e garantia de, pelo menos, outros tantos, mas também pela concentração de cor, finesse e profundidade. Como vinho é extraordinário, daqueles que causam verdadeiro prazer, satisfação e emoção, mas o que faz dele um valor histórico são ainda as características que lhe marcaram a criação e a vida e a raridade das apenas 300 garrafas que são colocadas no mercado.
Representa também a consagração da Baga como uma casta de enorme potencial. E da Bairrada. O que significa que vinhos destes não há em mais parte nenhuma. Casta que, felizmente, é agora reconhecida, mas que foi já mal-amada na região. Difícil e exigente na vinha e a requerer cuidados especiais, que à época eram vistos como heresias.
João Póvoa recorda a paciência da mãe para cumprir os seus caprichos. A preocupação em enterrar os cachos da monda, para não ser criticada pelos vizinhos que viam valor apenas na quantidade de uvas. A vinificação foi feita (e continua a ser) em lagar aberto e sem desengace e o estágio em tonéis, como sempre viu fazer ao avô. Mas naquela vindima de 1991 ousou também experimentar algum controlo de temperatura: um tubo em serpentina ligado à água da rede, uma gerigonça que elaborou com o ferreiro da aldeia.
O vinho saiu potente e poderoso, mas rude e bruto como são os Baga nos tempos de infância. Guardou boa parte que, com mudanças de propriedade, andou “perdido” em paletes que saltaram de lugar e até passaram temporadas ao ar livre. Dez anos passados foi assinalada a sua existência e dele temos estas 300 garrafas de história, património e arte. Da Bairrada e da sua Baga!