Lúcia Freitas é uma química-enóloga do Dão, ainda jovem, que começou na Dão-Sul com Carlos Lucas, continuando com ele na Magnum Vinhos. Neste projecto, que tem Lucas como protagonista principal, desentenderam-se e Lúcia passou a fazer os seus próprios vinhos, assumindo a gestão da propriedade do avô, a Quinta da Mariposa, situada em Carregal do Sal, permanecendo, contudo, como sócia da Magnum Vinhos. É um regresso às origens e um corte com aquele que foi o seu mestre, mas o estilo dos primeiros Mariposa ainda não denota uma grande ruptura no modo de interpretar o Dão. Isso é especialmente notório no topo de gama, o branco Sombrio, de 2014, apesar do ambiente em que o vinho foi produzido revelar algum esforço de inovação.
Para honrar o nome, e porque, como justifica Lúcia Freitas, a luz também oxida os vinhos, quer a vindima, quer a vinificação e engarrafamento foram feitos de noite. E a garrafa também é bastante opaca. O vinho só verá a luz quando chegar ao copo. É uma bonita narrativa, mas não passa disso mesmo: de uma narrativa. Para ficar mais completa, só faltou associar ao vinho a própria mariposa, uma borboleta que faz a sua vida de noite.
Indo ao vinho, que é “feito” sobretudo na vinha e não no lagar, necessitando apenas de um processo natural de fermentação para nascer, estamos perante um branco de Inverno, maduro, gordo, amplo e fumado (fermentou em barricas usadas, estagiando nas mesmas durante 18 meses com battonage regular), mas com uma belíssima frescura. Juntando três castas muito interessantes — Bical, Cerceal e Encruzado —, compensa a sensação fumada e madura do nariz com uma acidez cítrica exaltante e uma boa expressão mineral. Quando tudo estiver mais bem casado, pode deixar muita gente de boca aberta, sobretudo aqueles que não fazem dos brancos com barrica um anátema. Os grandes brancos do mundo sempre contaram com o conforto da madeira.