Como é que o Vinhão, uma casta tão apreciada no Douro, onde, sob o nome Sousão, faz verdadeiros milagres, aduzindo aos seus vinhos tranquilos a tão escassa frescura ácida e enriquecendo o vinho do Porto com cor, taninos e acidez, continua remetido ao papel de vinho étnico na sua região de origem, o Minho?
Será que o clima húmido do noroeste explica tudo? Ou serão os minhotos uma espécie de irredutíveis gauleses que nunca se preocuparam em domar a casta porque só são felizes bebendo malgas de vinho tinto opaco, acerbo e adstringente? E não estará essa felicidade ligada a uma coisa tão moderna, o pairing (emparelhamento vinho/comida), e ao gosto minhoto por comidas difíceis, tipo lampreia, papas de sarrabulho ou umas simples cebolas com sal e vinagre?
Provavelmente, serão várias as causas. Mas falta saber quem está errado: se os que diabolizam os tintos de Vinhão, por os acharem demasiados rudes e rústicos; se os minhotos, por não estarem a tirar o devido partido de uma belíssima casta, não conseguindo vender estes vinhos para além das fronteiras minhotas.
Uma nota pessoal: já bebi muito Vinhão com familiares de Cerva (Ribeira de Pena) que me soube pela vida. Mas, fora do reduto tradicional da casta, raramente me lembro dela. Será porque disponho de vinhos melhores ou será porque também nos vinhos se deve ser fiel à velha máxima “na terra dos lobos uiva com eles”? A tantas perguntas, vale a pena responder com o último Anselmo Mendes Vinhão Escolha 2016, um vinho retinto e de aroma delicioso (mirtilos maduros, sugestões florais semelhantes às da Touriga Nacional, de violeta, e especiarias). Na boca, é um Vinhão típico na sua fantástica acidez mas com uma civilidade tânica pouco comum para este tipo de vinho. Muito bom (para beber com a comida certa, claro). Um Vinhão assim pode ter mercado fora do Minho.