Fugas - Viagens

  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos
  • Fernando Veludo/nFactos

Da Régua ao Tua numa tonelada de carvão

Por Romana Borja-Santos

Só no ano passado os comboios históricos do Douro transportaram mais de 4000 pessoas. Até Outubro, a velhinha locomotiva Henschel está de novo nos carris. A Fugas entrou na máquina do tempo e só parou no início do século passado.

A caminho de curvas e curvinhas, em que o carro praticamente tem de pedir licença às ribanceiras para circular, prepara-nos e embala-nos no antigamente. Mesmo assim, quando se chega à estação da Régua é impossível não ficar surpreendido com o fumo enegrecido que emerge e que sobe o suficiente para contrastar com as nuvens brancas e cinzentas prenúncio de que o Sol que espreita não durará toda a tarde. Um incêndio? Nada disso. Um verdadeiro regresso ao início do século passado, em que o carvão e os comboios se tratavam por tu. E por falar em comboio o melhor é entrar, que a locomotiva já apita.

A expressão "a todo o vapor" não é com certeza a que melhor que se aplica a esta viagem, em que a paisagem pode ser apreciada bem devagar. O caminho de 46 quilómetros entre a estação de comboios da Régua e a foz do rio Tua é percorrido a 30 quilómetros por hora e comandado por uma velhinha locomotiva da marca alemã Henschel que circulou "a sério" nos anos 20 do século XX uma verdadeira peça de museu que desde 1999 abdicou da reforma para tirar o passado do baú e encarrilar no projecto "Comboios Históricos do Douro". A viagem nostálgica, que se realiza todos os sábados entre Maio e Outubro, tem uma duração de pouco mais de três horas, que proporcionam um encontro com o rio sempre súbito e deslumbrante. A viagem começa às 14h46 e a chegada está prevista para as 18h05 isto se o comboio não se lembrar de pregar nenhuma partida, como já fez em edições anteriores, em que preferiu descansar mais vezes do que as previstas.

A locomotiva serpenteia quase sempre à flor da água e é abraçada pelo Douro Vinhateiro, sendo raro o momento em que as vinhas e os socalcos não acompanham o percurso das cinco carruagens puxadas e que têm capacidade para transportar 250 pessoas. Não fosse o barulho das rodas a resistirem ao atrito do ferro enferrujado dos carris, e a verdadeira massagem anticelulítica digna de um spa que os bancos proporcionam, e quase seria possível ouvir o silêncio da natureza que foi elevada a Património Mundial em Dezembro de 2001 e é, também, a mais antiga região demarcada vinícola do mundo, instituída em Setembro de 1756 por alvará de D. José I.

Música a condizer
O interior do comboio também nos remete para o tempo dos avós. Todo forrado a madeira envernizada, com bancos de ripas da mesma cor, contrasta com o negro do exterior, riscado de vermelho vivo. Ainda assim, à medida que o tempo e o comboio avançam, as cinzas da tonelada de carvão que é queimada durante a viagem vão tentando entrar por todas as frestas e mancham os colarinhos brancos de quem se enganou na cor da roupa para um passeio deste género.

Os que não resistem a mudar de carruagem e se detêm um pouco nas passagens ao ar livre pestanejam incessantemente, ora para evitar o forte vento, ora para prevenir a entrada de carvão. Lá dentro, muitos lutam com as janelas que, quais guilhotinas, insistem em cair ou em ficar presas sem justificação aparente. Nada como um veterano deste passeio para ensinar que "o material tem sempre razão" e nos mostrar a técnica.

De carruagem em carruagem circulam, também, as músicas populares e tradicionais. O grupo "Paco Maduro" vem propositadamente a este passeio com notas musicais e trajes tradicionais, que se destacam pelo lenço vermelho ao pescoço, completar o regresso ao que foram as primeiras viagens de comboio.

Entre "O meu amor é padeiro, faz a casa em farinha e os seus beijos sabem a pão" ou "Ó minha Rosinha, ó meu coração, vais para Lisboa e não me levas paixão", os turistas não resistem e lá vão batendo o pé. E, mesmo depois de o grupo mudar de carruagem, quase todos continuam a papaguear algum pedaço de letra que ficou na memória.

De propósito de Dusseldorf
Mas, como a música não enche barriga, ainda na viagem de ida é servida uma bola tradicional, daquelas que cheiram a azeite verdadeiro. Para ajudar a diluir esta especialidade, não podia faltar também vinho do Porto servido ao som de "Se queres que cante dá-me uma pinga de vinho para molhar a garganta", com o único senão de vir em copos de plástico. Uma opção considerada demasiado "moderna" e "pouco ecológica" por António Manuel e Catarina Fonseca, dois agentes de turismo que se juntaram ao grupo e que asseguram que esta solução é especialmente mal vista pelos estrangeiros.

Este não parece ser o caso do casal alemão Gerda e Werner Gipper, que veio de propositadamente de Dusseldorf para fazer a viagem inaugural dos comboios históricos deste ano, objecto de uma reportagem na televisão local. Tudo no comboio é também "perfeito" para o alemão Wendhausen, de 71 anos, para quem "o cheiro característico do carvão misturado com o ferro vale tudo".

Quando menos esperamos, e apesar de o programa nos alertar para tal, paramos na estação no Pinhão, onde o pretexto são os 24 painéis de azulejos anteriores a 1940, de valor documental, que retratam paisagens e construções já desaparecidas, bem como formas de fazer a vindima ou de transportar o vinho. Mas quem pensa que a paragem se destina única e bancos, no corredor ou nas zonas de passagem entre carruagens, todos comentam como os transportes do século passado eram mais cansativos, mas também mais bonitos. João Paulo, de 14 anos, veio com os pais. Apesar de estar "fascinado com a paisagem" pensava que os "bancos eram almofadados".

A falta de conforto leva-o a dizer que "para férias isto era demasiado complicado".

A locomotiva ainda não apita mas as pingas de água que começam a cair quase sem intervalo aconselham-nos a voltar para os nossos lugares, apesar de Carlos Madeira, da CP, garantir que "chuva civil não molha ferroviários". E é com uma paisagem enevoada e mais triste, mas também com o cheiro e o verde da terra mais vivo, que chegamos à foz do Tua.

É aqui, rodeados de pão, bolos e licores tradicionais, que Acúrsio dos Santos, da organização do passeio, informa que só em 2007 esta viagem teve mais de quatro mil pessoas, pelo que nesta edição houve uma aposta mais forte em "promover a região e oferecer produtos locais" aos turistas, "porque o passeio tem o dever de promover a imagem histórica".

A locomotiva já bebeu mais água e, por isso, é hora de voltar. O regresso é mais silencioso. Os olhos quase não saem das encostas de xisto e dos socalcos que potenciam a paisagem original e que um dia o médico, escritor e historiador Jaime Cortesão apelidou como "o mais belo e doloroso monumento ao trabalho do Povo Português", ao ponto de ter considerado que estava perante "''Os Lusíadas'' sem Camões".

Preços (2012)
45€ para os adultos; 25 euros para crianças dos cinco aos 12 anos. Acúrsio dos Santos, da organização da viagem, reconhece que talvez seja um pouco elevado, mas faz questão de sublinhar que a manutenção da Henshel é "muito dispendiosa".

Onde ficar
Em 2012, o bilhete do comboio histórico dá direito a condições especiais de alojamento nos hotéis:

Douro River Hotel&SPA
Hotel Régua Douro
CS Vintage House Hotel
Hotel Quinta Nova
Hotel Douro Palace
Hotel Rural Casa dos Viscondes da Várzea
Hóteis TRYP
Hotel B&B
Aquapura Douro Valley
Hotel Tiara Park
Hotel Porto Palácio
Meliã Ria Hotel & SPA

--%>