Especial: 10 Viagens em Família
"Podemos ir à ilha?" Começámos a visita pelo corredor exterior da estufa, com vista para o grande lago do Parque Eduardo VII. As treze crianças dirigiram-se imediatamente para a varanda de pedra sobre a água, onde diferentes espécies de patos nadavam indiferentes. No centro, existe uma pequena ilha e o primeiro impulso dos rapazes foi tentar lá ir, mas não é permitido. Fernando Antunes, um dos educadores, tenta antes mostrar-lhes o pavão, que exibe as suas penas coloridas na outra margem do lago.
Um pequeno desvio inicial, pelo buraco lateral da rede, junto à entrada. Mas o objectivo era conhecer a Estufa Fria e por isso não demorámos a continuar o percurso. A manhã foi destinada a uma visita de estudo informal, sem guia ou panfletos, e para ser feita ao ritmo do interesse das crianças, de cinco e seis anos, e através da orientação dos dois professores que as acompanhavam. Era um passeio habitual do Jardim Infantil Pestalozzi, situado na zona do Campo Grande, em Lisboa, e todos os anos um grupo de meninos vinha conhecer o local. Agora podem retomar as visitas e são dos primeiros a redescobrir a Estufa Fria, reaberta ao público no final do mês de Abril, depois de estar encerrada para obras desde 2009.
É um espaço grande e é preciso ter a cabeça quase completamente virada para cima para ir descobrindo o tecto de ripinhas de madeira. Por baixo dele, uma pequena selva luxuriante de plantas altas, arbustos verdejantes e pequenos lagos interiores. Parece que estamos numa minifloresta e a imaginação não demora muito a levantar voo: há quem tenha avistado papagaios (que afinal eram as calças cor-de-laranja dos jardineiros que cortavam plantas do outro lado da estufa) ou mesmo um tigre (na verdade um pequeno gato).
Para tristeza de muitos, a estufa não alberga nenhum animal de grande porte ou exótico, mas é habitual ver um pato a passear à nossa frente ou a nadar num dos lagos, de cabeça para baixo e rabinho para o ar, como na música infantil. Existem ainda diversas espécies de peixes e algumas tartarugas, mas a particularidade deste cantinho perdido de Lisboa não são os animais. São as plantas que, neste espaço "encaixado na encosta do Parque Eduardo VII e virado a sul", encontram condições favoráveis ao seu desenvolvimento. Aqui, podemos apreciar o feto arbóreo-da-tasmânia (Dicksonia antárctica), camélias japonesas (Camellia japonica), estrelícias de cor esbranquiçada vindas da África do Sul (Strelitzia nicolai) ou diferentes espécies de azáleas, para nomear só algumas. No total, são mais de 300 espécies, divididas pelos microclimas das três estufas.
A maior é a Estufa Fria, que dá nome a este espaço particular de Lisboa, mas, tal como explica Fernando Antunes: "Lá em cima, aquela parte toda em vidro, é uma estufa dentro da estufa." Na verdade são duas - a Quente e a Doce - que mais tarde fizeram sucesso entre as crianças. A Estufa Fria não utiliza qualquer sistema de aquecimento e é por isso que é fria, ao contrário das outras duas, de cobertura de vidro, onde a temperatura é muito mais elevada. Na fria não. A temperatura é amena, proporcionada pelo seu tecto de ripas de madeira, que deixa passar a água da chuva, protege as plantas do frio no Inverno e do calor no Verão e condiciona a intensidade da luz, proporcionando o seu prezado ar sombrio. Este perdeu-se um pouco com as obras, que tornaram o local um pouco mais iluminado. Mas será sol de pouca dura: "com a colocação do ripado lateral, a entrada da luz será diminuída", esclarece João Camolas, assessor de imprensa do vereador responsável pelos espaços verdes de Lisboa, Sá Fernandes.
As plantas são a atracção principal da estufa, mas o espaço tem vários recantos peculiares que contribuem para a sua atmosfera única e que fazem as delícias das crianças. O lago junto à nave tem um caminho de pedras que permite atravessá-lo, o outro tem uma pequena ponte de pedra. Existem também várias reentrâncias nas paredes - pequenas grutas, com estalactites, cascatas e pequenos lagos ou fontes. A estufa está localizada numa antiga pedreira de basalto - que deixou de funcionar quando foi encontrada uma nascente de água que comprometia a extracção da pedra. Estes pequenos nichos, os caminhos e a escadaria de pedra cinzento-escura são um legado desses tempos.
Estufa Quente e Cactos doces
"O ar parece que está molhado, não é?", pergunta Fernando Antunes. A Estufa Quente tem um clima totalmente diferente da primeira e, ao entrar, apanha-nos desprevenidos no seu torpor. A mudança é radical e repentina: apenas um passo nos separa entre o fresco da Estufa Fria e o calor e humidade (quase insuportáveis no início) da Estufa Quente. É mais pequena, apesar de mais espaçosa, parte dela ocupada por uma subida em ziguezague, sem destino, no lado oposto à entrada. Nela, estão instaladas plantas de clima tropical, como o cafeeiro (Coffea arábica), a mangueira (Mangifera indica), a bananeira (Musa spp.) ou a cana-de-açúcar. Existem também alguns lagos, pequenas grutas e cascatas. E numa sala lateral muito pequena fica a Estufa Doce: a casa dos cactos e de muitos espinhos.
"Todos em fila de um." "Ninguém toca em nada." "Não se empurrem." À entrada, os avisos foram tantos que até houve quem ficasse com arrepios, mas aquele acabou por ser o espaço preferido de todos. Tem uma colecção vasta de espécies, tendo em conta o tamanho do espaço, com cactos de todas as formas e feitios: com espinhos afiados, outros que parecem revestidos de "pêlo macio" (Cleistocactus straussii), outros quase sem picos ou com formas engraçadas. "Este é a cadeira da sogra. Alguém se quer sentar?", brinca Fernando Antunes, enquanto aponta para um Echinocactus grusonii, mais conhecido por cadeira-de-sogra devido ao seu formato semelhante a um banco, mas coberto por espinhos afiados.
No final da visita todos gostaram "de tudo" mas, curiosamente, depois de cerca de duas horas envoltos em plantas, as únicas nomeadas preferidas, e quase por todas as crianças, foram os cactos. Mas Sofia, de seis anos, fez o resumo mais completo: "Eu gostei mais da parte em que havia flores, e da parte em que havia os cactos e também gostei da parte em que havia água e muitos sítios para sentar." Alguns estavam cansados, outros com fome. Mas quando viram o parque infantil ali tão perto, nenhum resistiu a mais uns minutos de brincadeira.
Estufa renovada
Em 2009 foi detectado o colapso eminente da estrutura da Estufa Fria. O local foi encerrado e as obras começaram, tendo sido "substituídos os pilares de sustentação da cobertura e restaurado o ripado de madeira", explica João Camolas, assessor de imprensa do vereador Sá Fernandes, tutelar dos Espaços Verdes de Lisboa. Já sem perigo para a segurança dos utentes, a Estufa reabre agora ao público, mas as obras ainda não estão terminadas.
"Entretanto foram identificadas outras necessidades", como a colocação de vedações laterais, a conservação do edifício da bilheteira; a intervenção nas estufas Quente e Doce e ainda a criação de um percurso pedonal adaptado a necessidades especiais. A nave, localizada no fundo da Estufa Fria e usada durante vários anos como teatro municipal, também vai sofrer intervenções, estando "a ser preparado um concurso para a sua concessão, como espaço para restauração e eventos, tendo como contrapartida a construção de um Centro de Interpretação". Nesta acção de renovação do espaço lisboeta, está ainda pensada a "identificação de espécies, com destaque de alguns exemplares, o desenvolvimento de um projecto educativo para o público escolar e a produção de suportes informativos".
Estufa Fria
Parque Eduardo VII, Lisboa
Tel.: 213882278
Horário: diariamente das 9h00 às 18h00 (última entrada: 17h30). Encerra a 1 de Janeiro, 1 de Maio e 25 de Dezembro
Preço: de momento a entrada é gratuita (o pagamento de bilhete, no valor de 3€ está previsto para breve, mas ainda sem data definida)