Na avenida marginal do rio Huangpu, em Xangai, duas mulheres vociferam entre transeuntes indiferentes ou estupefactos. Zangam-se e empurram-se numa disputa sobre o território onde apanham garrafas de plástico para a reciclagem. A zaragata dificilmente perturbará os clientes do Hotel Pearl, do outro lado da rua, que pagaram diárias acima dos 8000 euros para carimbarem no currículo mais um símbolo das extravagâncias do capitalismo.
Nos arredores de Xian, a uns 500 metros do museu que alberga os guerreiros de terracota do primeiro imperador Qin, gruas elevam-se dos arvoredos e anunciam que um dos mais fantásticos patrimónios da história humana terá em breve como companhia um faraónico centro comercial. Pequim, a capital: uma série de placas que nos dizem o que foi e o que representou cada um dos intermináveis pátios interiores da Cidade Proibida é patrocinada pela American Express.
No centro financeiro de Xangai, na outra margem do Hotel Pearl, o Partido Comunista da China escolheu um dos mais feéricos arranha-céus do distrito financeiro para anunciar em néon o seu 90.º aniversário. Bem-vindos à China, o lugar da terra onde se pode ver ao vivo o mais rápido e profundo processo de transformação que a humanidade conheceu nos últimos séculos, o país do socialismo do mercado, o colosso que ameaça tornar-se a primeira potência mundial no prazo de duas ou três décadas.
É frequente ouvir-se dizer que um país, ou uma cidade, se destaca pelos seus contrastes. Mas, indo além do lugar-comum, a verdade é que essa imagem é incontornável quando se visita a China actual. De um lado, grandes urbes ultramodernas como Xangai, do outro os templos budistas onde os crentes se dobram com incenso perante as divindades; de um lado os traços vincados da história de uma civilização com cinco mil anos, do outro a ocidentalização forçada com apenas três décadas a querer varrê-la da memória; de um lado a beleza mágica do Palácio de Verão dos imperadores em Pequim, com o seu lago cheio de flores de lótus e corredores pintados com motivos bucólicos, do outro a vertigem da adrenalina do Maglev que liga o aeroporto de Xangai ao centro da cidade a mais de 400 quilómetros por hora.
Há nesta oposição um factor unificador: o dinheiro, a grana que no dizer de Caetano Veloso sobre São Paulo "ergue e destrói coisas belas". Os velhos bairros de Pequim, os hutong, foram arrasados pela onda de cimento e aço, mas também é verdade que a febre do dinheiro que as destruiu teve o mérito para pagar ao arquitecto Rem Koolhaas (o que fez a Casa da Música do Porto) para construir a enigmática, mas genial e impressionante, sede da televisão chinesa.
Viajar hoje pela China tem por isso como primeiro mérito o teste à alegação de que a história do mundo está a virar uma página, fazendo regressar ao Oriente a liderança perdida aí há uns 500 anos. Há uns anos, o pulsar do progresso sentia-se em Wall Street ou em Kwoloon, em Hong Kong, agora é em Pequim ou em Xangai que o seu nervo se sente. Na origem da profunda transformação económica do país nas últimas décadas está o programa "Quatro Modernizações", lançado em 1978. E um dos seus sinais mais expressivos deu-se pouco depois, quando a Coca-Cola anunciou o regresso ao país com a abertura de uma fábrica em Xangai. Desde então, a China registou um crescimento económico a rondar os 10 por cento ao ano (a riqueza do país duplicou a cada oito anos, em média), acomodou a maior vaga de emigração da história, com o equivalente à população dos Estados Unidos a rumar às cidades, e passou de uma sociedade rural a uma sociedade de consumo desenfreada.
Por muito que a paixão pela História nos comova na Grande Muralha ou no Pagode do Ganso Selvagem, em Xian, o que sobressai a cada passo de uma viagem entre as principais cidades da China é essa sensação de que o passado se consome na avidez do presente até se tornar um lugar longínquo. Os chineses estão demasiado entretidos com o futuro, a ganhar e a gastar dinheiro, para lhe dar excessiva importância.
Pequim, no meio do Império do Meio
Veja-se Pequim. Quando Deng chegou ao poder, em 1976, a velha "capital do Norte" (é este o significado de Pequim) tinha dois anéis rodoviários e a iconografia da época mostra-nos que essas vias eram mais do que suficientes para o enxame de bicicletas que por lá circulava; actualmente, a área de Pequim mais do que duplicou e o Governo tem em construção um quinto anel com 150 quilómetros de extensão. Apesar da intrincada rede de metro e da abundância de transportes públicos, o automóvel é quem manda na cidade.
E manda tanto que as autoridades tiveram de lhe impor regras para evitar que o ar ficasse irrespirável, primeiro, e depois para garantir que os engarrafamentos fossem, ao menos, toleráveis. Por alturas dos Jogos Olímpicos, a entrada de viaturas privadas na cidade fez-se à vez: um dia matrículas pares, no outro, ímpares. Mas nem isso foi capaz de suster a avidez de automóveis de uma população de 22 milhões de pessoas afluentes e, hoje, a venda de carros em Pequim faz-se por sorteio. No último em Maio, 530 mil interessados tiveram de disputar 17 mil licenças para aquisição de automóvel.
Com toda esta pressão, não admira que, como outras grandes cidades, Pequim seja hoje um paraíso da circulação rápida. Andar de carro é indispensável para se perceber a dimensão gigante do centro da cidade, para se ficar na retina com a imagem da modernidade do seu centro financeiro. Caminhar é possível, claro, até porque só assim se há-de reparar na limpeza dos passeios, no cuidado com os mais ínfimos canteiros de jardim ou na largueza razoável do espaço para os peões. Mas ao contrário de Xangai, de Nova Iorque ou de Hong-Kong, a largueza das avenidas acentua a noção da distância e Pequim não convida àquelas travessias que só nos revelam a distância percorrida quando se pára e se cai exausto na cama do hotel.
Na zona próxima de Tiananmen, as quadrículas são menores, a diversidade de lojas aumenta, há pequenos mercados sazonais de rua que devem ser percorridos. Aí, vale a pena conhecer os hutong que sobram. Hoje, já não há porcos de criação nos telhados planos das casas e o que resta dessa cultura popular que germinou em volta do palácio imperial ao longo de séculos resiste apenas porque os turistas gostam e se os turistas gostam há negócio a fazer. Nas ruelas em torno da Yanday Byway, nas imediações do lago Houhai, mantêm-se velhos hábitos de cozinhar na rua, mas ao lado do padeiro pode encontrar-se um bar cosmopolita que vende café expresso, uma loja de roupas que escapa aos padrões de flores, lacinhos e folhos da indumentária para exportação, ou até um antiquário onde se podem comprar peças quotidianas da era de Mao (chaleiras, canecas, cinzeiros ou, com sorte, até uma edição original do célebre Livro Vermelho). Neste resíduo da memória poupado à febre imobiliária, recupera-se a adrenalina para enfrentar o pulsar vibrante da Pequim moderna logo ao fim do bairro. A menos que se distraia e se confronte com um dos biliões de ciclistas que encontram nestas ruas pedestres o seu próprio paraíso terrestre.
Desenganem-se, porém, os que acreditam que Pequim se contacta (não se diz conhece porque há dúvidas sobre se a capital da China é susceptível de entendimento racional) em meia dúzia de viagens de autocarro, mais um passeio ou outro a pé, algures entre o vidro, o aço e o alumínio da arquitectura moderna. O que é mais facilmente apreensível é a mudança na arquitectura, porque é aqui que o sistema político e económico triunfante melhor projecta a sua ostentação, seja no distrito financeiro, seja no coração da Pequim Olímpica, onde brilha o insinuante Ninho de Pássaro que reuniu o talento do artista chinês Ai Weiwei com o dos arquitectos suíços Jacques Herzog e Pierre de Meuron. Essa Pequim é a que revela o lado imperial do regime, o mesmo lado que levou os imperadores de outrora a fazer obras descomunais para glorificar o seu poder e para mostrar a sua crença ilimitada no futuro - os aeroportos de Pudong, em Xangai, ou de Pequim, este projectado pelo arquitecto Norman Foster, são a este propósito esclarecedores.
Os chineses impressionam-se com estas imagens glorificadoras do seu próprio sucesso - "Isto é muito bonito não é? Há outras cidades assim, lá fora? Esta é a maior praça do mundo, aquela é a maior avenida do mundo, aqueloutra é a maior muralha do mundo", repetia-nos Ana, uma guia chinesa. Mas não deixam de tecer críticas à ocidentalização da capital, dizendo que o Centro Nacional de Artes Performativas, do arquitecto francês Paul Andreu, é "um ovo" ou que a fascinante torre de Rem Koolhaas é nada mais do que umas cuecas gigantescas. Mas Ana, que viveu num apartamento de um bloco estilo soviético e ganhou rios de dinheiro com a valorização do imobiliário, não entra nestas conjecturas; para ela, a sua cidade e o seu país nunca estiveram tão bem e arrancar-lhe um desdém à poluição ou aos engarrafamentos são tarefas condenadas ao insucesso (para não falar da ocupação do Tibete).
A verdade é que, além de umas lanternas tradicionais à porta de lojas ou um ou outro remate bicudo e em arco no telhado, Pequim não tem na face urbana grandes sinais da sua cultura milenar. Tem, isso sim, conservados em lugares bem definidos, alguns dos monumentos que a cristalizam. Em Pequim, na Cidade Proibida, no Templo do Céu (ou do Paraíso) e no Palácio de Verão; no raio de uma jornada de um dia na vasta área que acolheu os restos mortais dos imperadores da dinastia Ming e, obviamente, o troço mundialmente mais famoso da Grande Muralha - há muitos outros troços facilmente detectáveis para os que viajarem pelo Norte da China, em direcção à Mongólia Interior.
Antes, porém, passemos pela Praça de Tiananmen (lá está, "a maior praça do mundo", com a sua área de 44 hectares). Numa daquelas manhãs de névoa tão frequentes em Pequim, é quase impossível estar numa das suas pontas e distinguir o que se passa na outra. Até porque naquela algazarra é difícil, muito difícil, prestar atenção ao que seja. Megafone em punho, jovens de óculos escuros, boné enterrado e pose à 007 gritam palavras impronunciáveis - são voluntários que dão informações aos turistas. Bandeirinhas sinalizam grupos que, pela feição ou pelo traje, denunciam proveniências dos quatro cantos da China. Num topo, uma fila enorme sinaliza a veneração dos chineses por Mao Zedong, que ali tem o seu mausoléu; à esquerda, a enorme assembleia nacional popular, de traça soviética; à direita, o museu da China, com o mesmo perfil; a meio, um mastro interminável onde ondula a bandeira vermelha do PC chinês com as cinco estrelas que simbolizam o partido (a maior) e as classes sociais; ao fundo, separada pela avenida da Paz Eterna, que se prolongará por mais 50 quilómetros em ambos os sentidos, fica a Cidade Proibida.
A Praça de Tiananmen vale apenas pelo seu lado simbólico, por nos levar a imaginar em que ponto concreto terá ocorrido a célebre cena do manifestante fazendo frente ao tanque de guerra, e por ser ponto de passagem obrigatório para a Cidade Proibida. Já o que fica para lá da porta assinalada por um gigantesco retrato de Mao, é obrigatório e difícil descrever. Tomem-se alguns factos e alguns números: uma área equivalente a 72 campos de futebol contínuos; 9900 quartos, capazes de albergar 6000 funcionários, a família imperial e as centenas ou milhares de concubinas do imperador; sede do poder das dinastias Ming e Qing entre 1420 e 1912, quando o último imperador, Puyi, foi deposto e a China entrou na convulsão das guerras civis e das guerras mundiais. Despojada de muitos dos seus tesouros (estão em museus ou em Taiwan, para onde foram quando as tropas de Chiang Kai-Shek se refugiaram na ilha após a derrota frente ao Exército de Libertação Popular de Mao, em 1949), a Cidade Proibida vale tanto pelo que mostra como o que deixa supor.
Com a ajuda dos filmes (O Último Imperador, de Bernardo Bertolucci funciona na perfeição), podemos imaginar o que seria aquele lugar fechado ao mundo, com rampas de acesso onde só o monarca podia passar, onde só eunucos podiam circular na área das concubinas, podemos imaginar o ambiente de intrigas, de ostentação e de claustrofobia que serviram de matriz à política e condenaram a China ao isolamento que durou até à queda do império. Infelizmente, porém, é difícil fazer esse exercício na própria Cidade Proibida.
Aí, podemos maravilhar-nos com o requinte das construções, com a beleza das praças interiores, com a expressividade das esculturas espalhadas pelo recinto, com a beleza das árvores e das flores na área das concubinas - só aqui há vegetação, pois de resto o chão da Cidade tem várias camadas de pedras para evitar a construção de túneis de acesso. Mas além da beleza evidente, as multidões de chineses da Manchúria, do Tibete ou das estepes de Xinjiang e, ainda mais, os seus guias de megafone contaminam o lugar com uma névoa de feira popular que nos afasta da aura mística, quase irreal, que a Cidade contém.
Esta é, aliás, uma característica de todos os lugares monumentais na China de hoje - só na Via Sagrada que conduz aos mausoléus dos imperadores Ming se pôde ouvir, por instantes, o silêncio. Os nomes das ruas, dos lugares ou dos monumentos são apelativos à reflexão: templo da Longevidade Celestial, Porta da Harmonia Suprema, Porta da Pureza Celestial, Salão da Harmonia Central, Salão da União entre o Céu e a Terra, Palácio da Longevidade Tranquila... Mas essas designações são anteriores ao turismo de massas. E ao uso das tecnologias que os chineses lhe emprestam. Eles (e elas) falam alto e sempre, e ainda assim precisam de megafones, com colunas roufenhas coladas às costas, para poderem ouvir dos guias os milagres dos imperadores ou a superioridade do regime.
No Palácio de Verão, por exemplo, a atenção ao lado Kunming, à bela ponte que o atravessa (a ponte Marco Pólo) ou ao maravilhoso corredor exterior coberto de frescos com motivos rurais ou com cenas da natureza tem de ser compartilhada com os apelos dos vendedores de bugigangas (uma novidade, que há apenas três anos não existia). Ainda assim, é impossível não reparar na beleza dos palácios nas encostas ou junto ao lago, na exuberância das flores de lótus que se encostam às margens, no pormenor idílico de homens em cima de botes a retirar moliço, no horizonte das águas que turistas cruzam em pequenos barcos. É impossível também não recordar a pilhagem e a destruição provocada pelas tropas anglo-francesas aos seus palácios, em 1860, na segunda guerra do ópio, ou naquela imagem de uma China orgulhosamente só que se constata no Barco de Mármore. Construído em 1755 pelo imperador Qianlong, foi alvo de obras de restauro na era da odiada imperatriz Cixi, em 1893, com verbas que estavam destinadas à construção de uma armada moderna. Nessa altura, como nos séculos anteriores, a China via-se como uma potência eterna, insusceptível de ser abalada pelo exterior. O Barco de Mármore simboliza essa insensatez.
Outra vez no bulício da cidade nova, passa-se pela avenida que orla o distrito financeiro, avança-se pela rede intrincada de auto-estradas urbanas, deixa-se ao lado a aldeia olímpica e demora-se aí uma hora até que Pequim se extinga nos campos. Antes de a cidade ter assumido o rosto do crescimento explosivo do país, as encostas do Monte Tianshou (Longevidade Celestial) eram um lugar distante, o sítio ideal para os imperadores poderem aspirar a uma vida depois da morte pacífica e iluminada. Hoje, só a protecção oficial a uma área de 40 quilómetros quadrados impede que o lugar do seu repouso seja perturbado pela expansão urbana.
É aí que se encontram os mausoléus de 13 imperadores da Dinastia Ming (1368-1644), construídos na montanha de acordo com a filosofia do feng shui, que determina a localização dos edifícios em função das correntes de ar e do movimento do sol. A avenida de cerca de um quilómetro (Via do Espírito ou, noutras traduções, Via Sagrada), na qual os cortejos fúnebres tinham de passar antes do funeral propriamente dito, mostra-nos um desfile de estátuas de animais e de figuras da corte de grande beleza. No lugar ouve-se o vento e uma música instrumental distante. É bom estar ali, com pouca gente. Melhor até do que no mausoléu do imperador Yongle, o Ming que trouxe a capital de Nanquim para Pequim, que fez uma armada para conhecer o mundo (logo destruída pelo seu sucessor), que mandou construir a Cidade Proibida.
Nas cidades ou nas zonas mais afastadas há compassos de espera que custam a acreditar. Do monte Tianshou até à passagem de Juyongguan, o lugar mais emblemático da Grande Muralha, são aí 50 quilómetros, mas não se admirem se os vossos guias ou a vossa excursão tiver de passar por uma fábrica de closonet, uma loja de jade ou um supermercado de seda: faz parte das regras oficiais do turismo. Num desvio entre a tumba de Yongle e uma loja de closonet (que mostra bem as condições de trabalho médias dos operários chineses), surge uma auto-estrada cheia de camiões e, pouco mais à frente, Badaling.
É impossível, um erro, um absurdo ir a Pequim e não visitar este troço da Grande Muralha, na passagem de Juyongguan. Porque só estando lá se pode perceber que é mesmo grande; porque é uma fabulosa obra de engenharia militar; porque nos leva a entender o sacrifício dos milhões de pessoas que morreram na sua construção; e também porque ali se pode encontrar, uma vez mais, um bom retrato social da China de hoje: de jovens agitadas de calções, penteados ocidentais e máquinas de filmar na mão a uma mulher quase imóvel, vítima do terrível hábito de tolher os pés das mulheres, de velhos pequenos e secos a rapazes da era McDonald"s a deitar fora os bofes na subida mais íngreme, do parvenu rico, Nike nos pés e Channel nas têmporas, das zonas económicas exclusivas a camponeses dos arrozais angariados para excursões oficiais, há lá de tudo. Até um rapaz de uns 12 ou 13 anos com a camisola da selecção nacional que não nos entende quando dizemos "Portugal?", mas lá condescende após arriscarmos a fonética chinesa para o nome do país.
- "Putoáiá?"
- Sim, sim, "Ronaldo, putoáiá".
Uma expedição à Grande Muralha acaba no limiar da exaustão para todos os que se aventuram até aos pontos mais altos, mas quando se regressa a Pequim é impossível não se proceder a um flashback das nossas próprias experiências e incluir a muralha como uma das coisas mais impressionantes que qualquer memória humana pode registar. Nada melhor, pois, do que regressar ao presente, assistir a um feérico espectáculo sobre a história do kung-fu no Teatro Vermelho, beber um copo de cerveja Tsing-Tao junto às folhas de lótus que marcam a orla do lago Houha e preparar os sentidos para outra viagem. Pequim, e o que representa, serão sempre o ponto de partida para quem ousar meter-se à descoberta da China. Não é tão moderna, subtil e enérgica como Xangai, não é tão antiga e "chinesa" como Xian, mas é ali que o poder emergente da China mais se constata e melhor se cola à pele. Da Cidade Proibida de Yongle ao World Summit Centre do presidente Hu Jintao passaram 600 anos de uma história na qual a China foi um colosso, mergulhou na miséria, e volta agora a ser o que foi outrora. Em Pequim respira-se essa narrativa.
Xian, o que resta da paranóia do primeiro Qin
No aeroporto de Pequim há uma pequena caixa antes da passagem pelos detectores de metais onde todos devem deixar os seus isqueiros. No aeroporto do destino, à saída haverá outra caixinha cheia de isqueiros que poderão ser levantados à vontade. Quem sai da capital e tem uma viagem de 1200 quilómetros em direcção ao interior sudoeste, poderá pensar como quem parte de Lisboa em direcção a, digamos, Bragança. Mal se aterra no aeroporto de Xian, repara-se que não é bem assim. Pela enormidade das pistas; pela grandiosidade dos terminais (um deles, gigantesco, ainda em construção); pela quantidade de aviões aterrados; pelo movimento; pela qualidade dos acabamentos. Esquecêramo-nos de um pormenor: Xian (Paz do Oeste) tem quase oito milhões de habitantes; e de outro: foi capital de 13 dinastias; e ainda de outro: é sede de algumas das mais conceituadas universidades chinesas ligadas às indústrias aeronáutica e das telecomunicações; e, talvez, do pormenor principal: é nos arredores de Xian que se encontra o exército de guerreiros de terracota que imortalizaram a paranóia do imperador Qin Shi Huang.
No átrio do hotel, um vidro separa-nos de grandes estátuas de guerreiros que se hão-de ver um pouco por todo o lado. A presença de brancos, negros, de europeus e indianos, de jovens norte-americanos em visita escolar, sublinha a expectativa que recai sobre a visita à oitava maravilha do Mundo. Há poucos anos, alguns guerreiros foram transportados até ao British Museum, de Londres, e o interesse do público excedeu de tal forma o expectável que as portas do museu ficaram dias abertas até à meia-noite - acabaria por ser a exposição mais concorrida da história do museu. Qualquer livro sobre a China ou sobre a História da Civilização tem o dever de mostrar o rosto de um guerreiro ou uma fila deles. As figuras são impressionantes, uma inacreditável expressão da arte chinesa de há 2200 anos. Mas, além do seu valor estético e histórico, os contornos misteriosos que as envolvem ajudaram a torná-las num valor icónico de importância mundial.
A 35 quilómetros de Xian, há um monte que poderia muito bem ser confundido com o de Tianshou, que acolheu as tumbas dos imperadores Ming. Também aqui há boas condições para o feng shui e não admira que o imperador Qin (lê-se "chin", daí o nome China) o tenha escolhido para construir o seu mausoléu. Qin, que reinou entre 221 e 210 antes de Cristo, foi ao mesmo tempo um déspota brutal e um estadista genial. Reunificou o país, harmonizou a administração e criou condições para a preservação da unidade civilizacional da China sob a égide de um mesmo estado. Além disso, tinha a obsessão da morte e de ser assassinado. Por isso, tratou de prevenir a sua paz eterna com um exército de guerreiros em terracota (uma espécie de barro cozido entre os 800 e os 1200 graus) e com a construção de um mausoléu inalcançável até pelo mais ousado Indiana Jones.
Após a sua morte, o exército de 8000 soldados em posição de combate foi destruído pela ira popular e caiu no esquecimento; o seu mausoléu sabe-se onde está, mas ninguém teve até hoje a coragem de o violar. As armadilhas mortais que esperam os que o tentarem incluem o uso de mercúrio, cuja existência no local está confirmada cientificamente. Documentos coevos falam do mausoléu e das armadilhas, mas dali ninguém saiu vivo para as revelar - após os trabalhos forçados, os operários que o construíram foram condenados à morte e o mesmo destino tiveram as concubinas do imperador.
Em 1974, um grupo de agricultores procurava água no local e deparou-se com uma colecção de objectos cerâmicos enterrados. A descoberta, e posterior reconstrução, do exército estava iniciada. Para o efeito, as autoridades chinesas construíram um complexo museológico que tem tanto de feio como de útil. Num pavilhão, expõem-se a história do lugar e dos Qin; num outro, gigantesco, visitam-se os guerreiros na sua pose original. O lugar impressiona e emociona. Ali se conjugam tão bem a brutalidade de um imperador que empregou o trabalho forçado de 750 mil pessoas, ao longo de anos, para cumprir o seu capricho, com a mais pura beleza da arte humana. O belo e o odioso num mesmo conjunto de estátuas com 1,80 metros de altura. Cada um com a sua própria expressão, o seu próprio lugar no corpo de combate, a sua hierarquia e a sua particularidade indumentária.
O exército tinha de ser realista para Qin descansar em paz, ao ponto de as solas das sandálias terem relevo, e ali aconteceu um daqueles milagres em que a arte acaba por superar a realidade. O lugar é feio, o avanço da construção de um centro comercial nas imediações é um acto hediondo, o ruído das multidões exaspera: mas nada consegue retirar a magia daquele cenário.
Séculos depois de Qin ter caído no esquecimento, Xian deixaria de ser a capital da China. Nanquim e Pequim sucederam-lhe, mas a cidade continuaria a prosperar com a criação da Rota da Seda, essa longa e imaginária auto-estrada das estepes que, segundo alguns historiadores (ver Ian Morris Why The West Rules, For Now, Profile, 2010), promoveu as primeiras trocas de tecnologias, saberes e vírus entre o Ocidente e o Oriente. A importância de Xian no século XIV (quando o nosso rei D. Fernando combatia os espanhóis e D. João I fundou a dinastia de Avis) atesta-se pela muralha de 14 quilómetros que cerca o velho núcleo urbano - qualquer comparação com uma muralha europeia dessa época é exercício sem sentido. Ou através das suas torres sineiras e do Pagode do Ganso Selvagem, que guarda sutras budistas desde o século VII.
Indo além da sua história, Xian tem, como todas as grandes cidades da China, feéricos centros comerciais, onde tudo se vende, desde Aston Martins a t-shirts feitas em Guangdong, no sul. Lojas da Kentucky Fried Chicken ou da McDonald"s dão um ar normal à sua agitação. Nos bares das ruas perpendiculares à avenida central canta-se karaoke, come-se fruta fresca e bebe-se whisky escandalosamente falsificado. De manhã cedo, porém, há-de constatar-se que o elo com o passado desta Xian pretensiosa, vagamente feia, nervosa e ostentatória não se partiu. No bairro muçulmano da cidade, onde habita há séculos uma comunidade que migrou no vaivém da Rota da Seda, a China que conservamos ainda como estereótipo persiste. Na carne exposta ao ar, nas quinquilharias que imitam o jade ou metais preciosos, na infindável e colorida exposição de produtos alimentares, nas cozinhas improvisadas nos passeios, nos rostos, nas poses, nos gestos e nos cheiros experimenta-se esse lado do país que vai a reboque de uma vanguarda de modernização que tanto está em Xangai como na avenida ao lado.
Há quem goste de Xian, há quem deteste. Sem a extraordinária aparição do exército de terracota, talvez a "Paz do Oeste" permanecesse uma anódina capital provincial, orgulhosa da sua história mas incapaz de lhe encontrar um emblema para atrair terceiros. A descoberta dos agricultores, na Primavera de 1974, mudou tudo. Tudo ou quase, porque ao contrário do que acontece nas metrópoles ainda há um pequeno vestígio que resiste. Contaminado pelo turismo, sim, contagiado já pelo artificialismo próprio do parvenu, sem dúvida: mas, ao menos, ali ainda se pode cheirar um nadinha daquela China ancestral que resiste longe, nos campos, mas que quase se extinguiu nas cidades
Xangai, o novo miocárdio da finança
Quem leu A Condição Humana de Malraux e se lembra da sensação estranha registada por Shen no momento em que a carne do nacionalista que estava assassinar opôs resistência ao seu punhal, deve recordar-se também da descrição de Xangai dos anos 30 que lhe serviu de cenário. Uma cidade dominada por estrangeiros baseados nas suas colónias onde viviam a negociar protegidos das leis ordinárias da China, húmida, dissoluta, cindida entre comunistas e nacionalistas, tensa, cosmopolita, ambiciosa e brutalmente injusta. Ao contrário de Xian ou de Pequim, a memória de Xangai não vai além dos dois séculos - nasceu para albergar concessões britânicas e francesas como pagamento pelas humilhantes derrotas da China nas Guerras do Ópio do século XIX. Se na China soberana os rituais dos imperadores e dos seus mandarins, os preconceitos sobre os diabos estrangeiros, peludos e de narizes grandes, ou o mundo estável da Cidade Proibida foram vegetando até à morte do Império, em Xangai a tensão dos negócios e dos interesses, o fluxo de ideias novas que viajavam com os vapores de Londres ou São Francisco, a aquisição de hábitos mais liberais ou libertinos mudou tudo. Não é difícil perceber que, sendo profundamente chinesa no espírito, Xangai é uma cidade diferente de Pequim nas suas manifestações. Quem gosta de cidades, quem prefere São Paulo ao Rio ou Nova Iorque a Paris, tem aqui uma pérola a descobrir.
Cumprindo a natureza da sua condição comercial, Xangai é o que é por causa do dinheiro. Quando os pais de António, um guia turístico, namoravam nas margens do rio Huangpu, há uns 20 anos, a outra margem, em Pudong, era um lugar distante, habitado por camponeses ou operários da construção naval. Para se chegar lá, era necessário apanhar um barco. Hoje, o cenário que se vê da cidade velha mostra um dos retratos mais futuristas do planeta. Torres gigantescas de vidro e aço erguem-se numa competição desenfreada pela glória de chegar mais alto, umas de feições mais clássicas, outras deliberadamente contemporâneas, circulares ou quadradas ou rectangulares, de cor cinza ou douradas. A Jin Mao Tower (Torre da Prosperidade Dourada), com os seus 421 metros de altura, dominou até 2007 o skyline de Pudong; então, em Setembro desse ano, o Xangai World Finantial Centre, uma obra do "expressionismo estrutural" superou-a com os seus 491 metros; mas também este reinado está para acabar, quando, lá para 2014, a Torre Xangai se estrear com os seus 632 metros (a Torre Eifel tem 324 metros de altura...).
Mas se estes emblemas do poder financeiro da China e da praça de Xangai (a quinta bolsa que mais dinheiro mais movimenta no mundo) se destacam pelo seu fulgor e pela sua ambição, a revolução urbana que está a transformar a cidade a um ritmo impressionante só se vê das alturas. Do cimo da Jin Mao Tower, onde se chega em segundos de elevador (a subida custa cerca de oito euros) para depois se avistar o gigantismo desta cidade de 23 milhões de habitantes.
Com o rio a vincar-lhe a identidade entre o que já foi e o que aspira a ser, Xangai é uma planície de arranha-céus que se estende no horizonte visual até onde a neblina e a poluição toleram. Auto-estradas em viaduto torneiam-se entre os edifícios, perdendo-se de vista ao longe, ou acabando em pontes ou túneis que ligam a velha Xangai a Pudong. Não se vê, mas no subsolo existe uma rede de 480 quilómetros de metro que cresce à razão de três quilómetros por mês. Ao lado, a silhueta elegante que acaba numa forma que lembra uma pega de mala, o Xangai World Finantial Centre continua a sua trajectória para as alturas. Mesmo abaixo, podem procurar-se as zonas residenciais dos milionários chineses, que para viverem ali têm de pagar dez milhões de euros por imponentes apartamentos de 500 metros quadrados. Além, por uma nesga, vê-se o que resta da Exposição Mundial de Xangai, no ano passado.
De regresso a terra firme, há muitas outras Xangai que vale a pena procurar. No bairro tradicional de Chenghuangmiao, além da arquitectura tradicional entra-se no frenético interface do compra-e-vende chinês. Um bairro, dizem os guias, um mercado, deve corrigir-se. Há uma miríade de lojas para todos os gostos, como também há uma multidão de vendedores de rua que proclamam malas Vuitton ou relógios Rolex a preços escandalosamente baixos, conforme a qualidade da falsificação. Numa esquina, um teatro de rua a que se assiste de binóculos chama as atenções para uma tradição que, no meio de tantos panos, tantos gadgets e tantas lojas, até parece artificial. Como o recanto do jardim Yuyuan, outrora a residência de um alto funcionário imperial, com as suas plantas adestradas, as águas correndo na direcção do esteticamente correcto, as salas do funcionário despidas e escuras, convidando para a amenidade que o calor húmido do exterior não tolera.
De ponto em ponto, de rua em rua, Xangai ferve com o dinheiro, com a construção, com as obras públicas. Até no Templo de Buda de Jade, bem no coração da cidade, é possível encontrar lojas ao lado do altar onde os ícones religiosos se detêm nas suas poses sisudas. As pessoas da rua entram e são capazes de ignorar as hordas de turistas que as fotografam em genuflexão ou quando baixam três vezes a cabeça com as mãos entrelaçadas em paus fumegantes de incenso. O ritual, percebe-se, ajustou-se ao negócio, como todos os rituais da China.
É possível encontrar bailes improvisados na rua de Nanquim, a artéria pedonal que alberga o comércio mais exclusivo da cidade, um riquexó mais exótico ou uma cartomante de idade que nos interpela com promessas de revelação incompreensíveis. Mas não são estes sinais que os sentidos captam em primeiro lugar. Ali, uma loja com o símbolo da Lacoste mas que, ao perto, pode ser da Lancoste ou da Laoste, além centros comerciais com galerias de moda para todos os preços, aqui uma loja Gucci autêntica ou uma Apple Store cheia de chineses de todas as idades que experimentam furiosamente as máquinas da companhia de Steve Jobs. Senhoras ou jovens carregadas de sacos com marcas da moda (ou falsificações, pouco importa) são o ponto focal incontornável da rua de Nanquim. Os chineses adoram compras e vê-los ali, naquela rua enorme cheia de lojas, é como ver crianças num parque infantil. Todos os anos, os chineses gastam em produtos de luxo cerca de mil milhões de euros.
Quando se regressa ao interminável aeroporto de Xangai, pode-se, naqueles 40 quilómetros que o separam do centro, fazer uma síntese do que é a China nestes tempos em que a mudança prodigiosa do último século e meio parece estar a acelerar (talvez a crise do euro ou do orçamento dos Estados Unidos acentuem esta sensação...). Nos prédios que se erguem a cada passo, na imponente piscina olímpica acabada de construir para receber os Mundiais de Natação deste ano, nas auto-estradas que se continuam a rasgar entre o casario, na velocidade silenciosa com que o comboio magnético (Meglev) passa nos seus carris, ligando Xangai ao aeroporto em apenas sete minutos a mais de 400 km/h. Já na gare, ultramoderna, milhares de chineses preparam-se para viajar para os cinco cantos do país, para a América em negócios ou para a Alemanha por prazer, prenunciado o inferno aos que terão de conviver com o seu ruído durante 12 horas de voo.
Procura-se pela China que se consolidou num período de cinco mil anos e entrou em erosão há apenas um século, e nas cidades pouco há por onde a ver. O socialismo de mercado não tem condescendência com o passado recente do país, feito de guerras civis, de uma tirania execrável que hoje só se venera por inércia (a de Mao), de pobreza extrema e de isolamento internacional. O passado simboliza o poder eterno no qual os Ming e os Qing erradamente acreditaram, até o socialismo de Sun Yat Sen, o nacionalismo de Chiang Kai Schek e, pouco mais tarde, o comunismo de Mao desfizeram os mitos e destaparam a História. Em Xangai. Há um século apenas.
Visitar a China de hoje há-de ser um pouco como ler a história do futuro próximo. Não se espere glamour, charme europeu ou o vanguardismo estético ou comportamental norte-americano. Não se conte com os risos abertos da América Latina ou o exotismo autêntico dos africanos. Nos bairros de Xangai onde a cultura europeia deixou marcas e onde os novos imigrantes (150 mil, actualmente) se juntam em esplanadas para ouvirem jazz, beber Sauvignon Blanc ou Chardonnay, comer tapas espanholas com cerveja alemã, emerge uma China que quer ser elegante e distinta, mas o que ali se encontra é um epifenómeno. A China que se vê na ostentação da arquitectura moderna ou no consumismo desenfreado pressente-se também nas oficinas porta sim, porta sim que ladeiam a rua até ao centro de Xian, na corrida pelos bilhetes da viagem inaugural do TGV que já liga Pequim a Xangai (1200km) em quatro horas, no orgulho patriótico de todos os que enaltecem as realizações do PC e dizem, em jeito de advertência aos ingleses ou, principalmente, aos japoneses, que "esquecer é trair".
Num país que não tolera a dissidência e silencia a CNN ou a BBC sempre que aparece uma notícia sobre um contestatário, que proíbe o Facebook e o YouTube, o que conta são as obras de betão, aço e tecnologia. A corrupção pouco conta, o ambiente começa a contar, mas a liberdade também não. O ritmo da mudança é brutal, mesmo para quem lá esteve em vésperas dos Jogos Olímpicos e é essa mudança que vale a pena testemunhar para memória futura. O que impressiona numa visita à China de hoje é uma tensão como a das competições desportivas, uma tensão que prognostica uma mudança, de tal forma intensa que mudará o mundo das próximas gerações.
Palavras-chave
Viajar
Não há voos directos de Portugal para a China, mas as principais companhias chinesas e europeias oferecem múltiplas ligações a partir dos grandes hubs do continente. No país, há inúmeras ligações aéreas a preços razoáveis. As conexões com os centros urbanos são fáceis e baratas - em Xangai, uma viagem no Meglev custa cerca de cinco euros. De Pequim para Xangai pode agora viajar-se em comboios de alta velocidade, por cerca de 60 euros. A Nortravel organiza viagens com paragem em Pequim, Xian, Xangai, uma área rural e em Hong Kong/Macau. Nas cidades maiores, o nome das ruas está traduzido em inglês. O que, dada a dificuldade de as memorizar, pouco ajuda. Os táxis têm taxímetro e os preços são muito em conta.
Chineses
Nos hotéis espere alguns sorrisos, mas não acredite que nas cidades haja abundância de simpatia para com os ocidentais. Nos principais pontos turísticos, encontrará chineses de diferentes etnias e proveniências, a lembrar-nos que a China é o terceiro país do mundo em superfície. As gerações mais jovens vestem-se de forma completamente ocidentalizada, enquanto os anciãos ainda usam trajes tradicionais e a indumentária cinzenta e espartana dos tempos de Mao. Os chineses falam muito, alto e ao mesmo tempo. Uma pequena multidão é garantia de barulho ensurdecedor. Não espere que respeitem filas ou que sejam delicados para idosos ou senhoras. Encontrar quem fale inglês é tarefa impossível, pelo que sempre que sair do hotel peça um cartão com as suas coordenadas em chinês. As crianças são de uma beleza enternecedora.
Dinheiro
Nos hotéis ou nos aeroportos abundam casas de câmbio, mas a melhor solução para ter dinheiro vivo é recorrer às caixas ATM que existem um pouco por todo o lado. O custo de vida nas grandes cidades é aproximado ao de Portugal, talvez até um pouco mais barato. Nos monumentos ou nas ruas comerciais mais tradicionais é obrigatório negociar. Sempre que lhe pedirem 100 yuans por uma t-shirt (ou qualquer outra coisa), responda com metade ou menos.
Comida
A cozinha tradicional chinesa é deliciosa. Nem sempre os restaurantes vocacionados para o turismo são de boa qualidade - a maioria são até muito industrializados. Mas para o nosso padrão de gosto não implica grande esforço de adaptação. Os legumes abundam e se os molhos incomodam há sempre alternativas vegetarianas ou massas para substituição. A cerveja chinesa é muito razoável, principalmente as garrafas mais pequenas e de amarelo fosco da marca Tsing-Tao. Os vinhos chineses são uma perfeita desgraça, mas em boa parte dos restaurantes pode encontrar brancos ou tintos internacionais a preços bastante caros.
Livros
Vale a pena tentar perceber o que é e o que foi a China para nos enquadrarmos melhor no cenário de hoje. Sobre a atitude dos chineses perante si próprios e o mundo, deve ler-se O Dragão e os Diabos Estrangeiros, de Harry g. Gelber (Bertrand, 2008). Em espanhol há uma boa história do país desde o final da Dinastia Ming até à actualidade: En Busca de La China Moderna, de Jonathan D. Spence (Busquets Editora, 2011). Em inglês, e apesar de nos retratar um país que em cinco anos mudou radicalmente, deve ler-se o interessantíssimo China Inc. de Ted C. Fishman (Simon and Schuster, 2005).
A Fugas viajou a convite da TAP e da Air China