Fugas - Viagens

Pelo mundo fora, até onde o óleo vegetal os levar

Por Mara Gonçalves (texto), Vítor Hugo Costa (vídeo)

Rita e Leandro decidiram viajar em nome da sustentabilidade. Esperam passar por uns 50 países, com tempo para voluntariado em quintas de agricultura biológica. O detalhe do projecto Green Brick Road: a viagem é numa carrinha movida a óleo alimentar usado. 

“O bichinho das viagens está sempre connosco, não termina uma e já estás a pensar na próxima, é viciante”, defendem Rita Bragança e Leandro Fans. Por isso, a portuguesa e o uruguaio sempre viajaram muito, da Europa à América do Sul. Desta vez queriam dar algo em troca. “Queríamos continuar a viajar, mas de uma maneira que fosse auto-suficiente e que pudesse de alguma forma contribuir para a divulgação da sustentabilidade”.

A solução? Uma “estrada de tijolos verdes”, percorrida numa carrinha movida a óleo alimentar usado, com paragens de voluntariado em quintas de agricultura biológica da rede internacional WWOOF (World Wide Opportunities on Organic Farms). “Sempre viajámos, sempre tentámos ter uma visão ecológica e verde das coisas; sempre tentámos contribuir e deixar qualquer coisa de positivo. Fomos juntando as várias coisas e de repente culminámos aqui”, explica a portuguesa, de 29 anos. Depois de dois anos de planeamento, o projecto “Green Brick Road” está prestes a arrancar.

De partida para o mundo, o casal vai iniciar o périplo sustentável pelo sul da Europa, com Itália como primeira paragem numa quinta WWOOF. Depois de três a seis semanas de voluntariado, continuarão até à Grécia e Turquia, onde vão ficar noutras duas quintas, e de seguida subirão pelo Leste europeu, Rússia, até à Mongólia. “Temos planeados os primeiros quatro a seis meses”, conta Rita. “Como é um trabalho de voluntariado, não queremos apressar as coisas. Por isso escolhemos programar mais ou menos até à entrada da Ásia e depois fica em aberto”.

No entanto, o plano geral já está traçado: depois de atravessada a Europa, pretendem descer pela Ásia, possivelmente até à Índia, mergulhar na Austrália, subir pela Indonésia e “fazer algumas das ilhas”. A seguir, o objectivo é saltar para o continente americano, palmeá-lo do Canadá até à América do Sul e daí atravessar o oceano rumo a África, subir pela costa atlântica e regressar a Portugal. Mas não tem de ser necessariamente por esta ordem. “Tudo depende dos apoios dos barcos que nos podem levar aos sítios, da burocracia de cada país, dos conflitos”, enumera Leandro, de 34 anos. Tudo vai ser decidido “um mês antes, passo a passo”.


O mundo numa frigideira

“A ideia era cumprir um sonho que acho que toda a gente tem. Quem não sonha com uma volta ao mundo?”, questiona Leandro, chefe de cozinha no restaurante Sul, em Lisboa. “Então começámos a cumprir esse sonho de uma forma económica, reciclada, com uma carrinha super antiga”.

Depois de 29 anos movidos a gasóleo, a autocaravana “Amarela” foi adaptada e agora também já funciona a óleo de fritar. As frigideiras de amigos e conhecidos foram-se esvaziando e os contributos reunidos em dois grandes reservatórios azuis, arrumados no fundo da carrinha. Cada um tem capacidade para armazenar 240 litros e o depósito de óleo levará mais 70 litros. No total dá “uma autonomia de 5000 quilómetros, calculamos nós, com o óleo que temos aqui”. “Depois vai ser conforme, vai-se arranjando, vai-se pondo”, conta Leandro.

Angariar óleo durante o caminho poderá ser precisamente um dos desafios da viagem, prevê o casal, a par dos vistos de entrada em alguns países e dos problemas mecânicos. “Vamos ter de falar com as pessoas por um litro, por meio litro de óleo, ir a restaurantes pedir”.

Como o objectivo é reciclar o óleo depois de utilizado para cozinhar alimentos, todo o líquido que forem conseguindo tem de passar por um complicado processo de filtragem móvel, que segue na carrinha. “Filtramos primeiro com um passador, para tirar as partículas de comida, depois deixamos assentar durante cerca de uma ou duas semanas. O óleo bom fica todo a flutuar em cima e a água e o resto das partículas no fundo. O óleo passa depois por um sistema de filtragem com dois copos e sai limpo”, explica Rita.


Wwoofing pela sustentabilidade

No total pretendem atravessar quase 50 países e fazer voluntariado em cerca de 15 quintas orgânicas WWOOF. “Nós queríamos trabalhar em agricultura biológica e a maneira que encontrámos para contribuir foi trabalhar nessas quintas e ajudá-los a desenvolverem-se e difundir a palavra da agricultura biológica e da urgência em ser-se sustentável”.

A viagem, esperam, será “um curso intensivo de agricultura biológica e de sustentabilidade ambiental”, para que no final possam aplicar tudo o que aprenderam numa quinta própria, “pequena e auto-sustentável”, em Portugal ou “nalgum lugar do mundo”. “Vamos lá, aprendemos e ao mesmo tempo voltamos e passamos a palavra”. Não só da agricultura biológica como da sustentabilidade. “Se nós conseguimos fazer este extremo de viajar durante tantos anos com uma carrinha a óleo vegetal e a trabalhar como voluntários em agricultura biológica, então se calhar as pessoas podem fazer um bocadinho menos”, defendem.

Durante o caminho, o casal espera adquirir “muita aprendizagem, absorver cultura, conhecer pessoas diferentes, comer coisas diferentes”. No mínimo a viagem durará dois anos, mas o fim do projecto não está definido. “Temos muito para ver ainda e nunca se vê tudo numa vida só”.

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