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O desafio de dar o corpo ao manifesto

Por Carla B. Ribeiro e Luís J. Santos

Prometem-nos obstáculos, quilómetros de suor, lama, lodo. Que mais poderiam desejar os nossos enviados especiais à anteprova do Amphibia Challenge na Escola de Fuzileiros de Vale do Zebro?

“Ninguém fica para trás.” A garantia é dada pelo 1.º sargento fuzileiro Alcides Brito, profissional que já palmilhou meio mundo, entre o Afeganistão e os PALOP. Por esta altura, já nós estamos de corpo, calções, t-shirt e ténis prontos para a desgraça e debaixo do olhar (muito) céptico dos combatentes que nos recebem.

O sol começa a arder no Vale do Zebro: “Isto é um microclima”, avisa Brito. A verdade é que neste recanto banhado pelo rio Coina, perto do Barreiro, e emoldurado pela Mata da Machada, onde se anicha esta quase-cidade que é a Escola dos Fuzileiros, a beleza natural quase nos trapaceia em imaginar um lugar idílico. Mas, por aqui, quando está calor, “é um inferno”. E as condições do terreno são tão desafiantes que não foi à toa o lugar escolhido para a preparação de militares para combates de outros tempos na inóspita Guiné.

Agora, a escola aceitou pela primeira vez na sua longa história abrir-se a civis e ser parceira num desafio de obstáculos aberto a todos, numa prova que utiliza logística e meios similares aos usados para formar os marines portugueses. A 1 de Junho, é cenário do Amphibia Challenge 2013, para o qual são esperadas centenas de pessoas — o evento tem capacidade para receber até à volta de duas mil inscrições — prontas a pôr à prova o espírito de equipa e, claro, cada músculo do corpo.

Já nós estamos por cá uns bons dias antes, para uma antecipação do repto. O nosso grupo é composto apenas por jornalistas e, avançamos já, nenhum parece ter um pingo de preparação para desafio de tal envergadura. Muito menos estes que vos escrevem. Razão, decerto, para que tenhamos sido os escolhidos para a mais do que certa humilhação, mapeada em claustrofóbicos túneis e derrapantes labirintos de pneus, pontes suspensas, redes de abordagem e, evidentemente, a parte mais esperada, o “mar” de lodo. Mas, claro, a nossa odisseia em terra de fuzileiros não passa de um aperitivo, um pequeno resumo do que os verdadeiros competidores enfrentarão. Logo, faremos isto com uma perna às costas, certo? Errado.

Ainda assim, quando nos dizem que “não é preciso ir a um ritmo muito elevado”, avançamos confiantes e sorridentes. Falam-nos em espírito de equipa (“Se o grupo não funcionar, o obstáculo não será transposto”, alerta Brito) e no verdadeiro desafio que é a coragem de tentar. “Se não consegue em três, conseguirá em seis horas; se não vai a correr, irá a gatinhar, a rastejar. Mas chega lá.”

Sempre com segurança, claro. E, “no limite, se alguém não se sentir confortável em transpor um obstáculo, pode sempre contorná-lo”, conforta-nos Júlio Barreiros, bombeiro sapador e o mentor de toda esta iniciativa, juntamente com o 1.º sargento Brito.

Amigos de longa data, Júlio e Brito delinearam e organizaram este Amphibia que agora testamos. O primeiro obstáculo: convencer a Escola de Fuzileiros a recebê-lo. Prova superada, avançam agora para concretização prática de transformar civis em anfíbios, isto é, em “seres que se adaptam”, “que se levantam depois de cair” e que “continuam o percurso de cabeça erguida”.

Na lama rastejar, rastejar

É assim mesmo, de cabeça erguida, e apesar dos pesares, que mostramos que não estamos aqui para contornos. Há uma parede de madeira que parece impossível saltar? Pois saltemo-la. O primeiro faz a subida sem jeito mas passa. Os outros observam e aprendem logo dicas. Será assim ao longo de toda a manhã, muito graças ao auxílio de Brito e Júlio, mas também de alguns bombeiros sapadores, como João Paulo, Nelson e Tiago, e de guardas da GNR, como Nuno, que ajudam estes jornalistas da triste figura a superarem-se.

A prova real, que pode ter 3km (regular) ou 6,5km (de elite), reparte-se por três ou seis zonas. Quem optar por fazer o circuito regular, arranca na pista de todo-o-terreno (uma espécie de aquecimento, dizem-nos), segue para o pentatlo militar para pôr à prova a destreza e a agilidade e termina na pista de lodo, onde a equipa será essencial para que ninguém fique para trás. Depois há os anfíbios de elite que, saídos da lama, correrão para a linha de água — onde cordas, bóias-guias, mergulhadores e nadadores-salvadores se certificarão que toda a gente passa em segurança —, entrarão numa pista de combate, que simula a verdadeira dos fuzileiros, e, por fim, serão testados psicologicamente na pista de liderança, em que “os conflitos poderão ser inevitáveis”.

Já no nosso circuito de apresentação, vamos em aquecimento na pista de combate, passagem pela pista de liderança e tentativas de revelar agilidade pelo pentatlo, de onde já saímos a hiperventilar. “É melhor guardarem forças para o lodo”, avisa-nos Nuno com toda a sua sapiência. Quem nos dera ter-lhe dado ouvidos.

Diziam-nos que era uma anteprova; que era “facílimo”. Digam isso, agora, aos nossos músculos ou à perna que não sai nem à lei da bala do buraco de lama em que se enfiou. Fora as vezes em que sai, mas já sem calçado. Anfíbios? Pois anfíbios seremos. Damos o corpo ao manifesto e num golpe de asa deslizamos, com uma lentidão de tartaruga, por entre água, lodo e lama. “Vens desovar?”, perguntará depois um colega de equipa, já despachado na margem e com o sorriso de campeão. Humor de caserna...

Certo é que, afinal, sobrevivemos. Melhor, vivemos uma manhã inesquecível. Para mostrar a colegas e amigos mais cépticos, até levamos histórias de tropa, além de uma boa colecção, inevitável, de nódoas negras e arranhões. Mas, claro, depois de um desafio como este, arranhões são medalhas. E, confessamos, é com um orgulho quase infantil e um sorriso no rosto que pomos o ponto final nesta história.

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Amphibia Challenge
Realiza-se a 1 de Junho, com as primeiras partidas às 10h. Há prova mini para crianças (+6). O custo é de 20€/adulto (18€ se em grupo de mais cinco) e de 6€/criança. As inscrições foram prolongadas até às 10h de 29 de Maio aqui, passando a custar mais 5€ por adulto e mais 2€ por criança) . Podem ir acompanhantes não participantes (grátis, só não podem entrar nas pistas - podem distrair-se a fotografar). Parte da receita reverte a favor da Acreditar - Associação de Pais e Amigos de Crianças com Cancro (durante o dia será ainda feita recolha de alimentos não perecíveis). No final da prova há balneários e comida para venda. O Museu do Fuzileiro (Tel.: 212151026), onde se vê e ouve a história desta força, a mais antiga em Portugal, estará aberto a visitas e a entrada é livre. Informações: Amphibia ChallengeTel. 210438667 | Site | Facebook

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