Fugas - Viagens

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A flutuar sobre o Alentejo ao sabor da brisa

Por Carla B. Ribeiro

Há coisas que deveriam ser obrigatórias fazer pelo menos uma vez na vida. E, após esta experiência, concluímos que andar de balão de ar quente pode ser uma delas. Com um misto de emoções, sobrevoámos as paisagens alentejanas entre levitações ao alto dos céus e voos rasantes.

“É assim que imagino a sensação de morrer — aquele momento, como se vê nos filmes, em que a alma se desprende do corpo e ascende aos céus.” Lourdes, uma panamense com residência em Portugal e escritório de advogados em Hong Kong, descreve num murmúrio em inglês, e entre lágrimas, o que está a sentir ao marido holandês Jan quando já deveremos estar a uns 300m do chão.

Não é apenas ela que fala assim, baixinho. Sem quase nos darmos conta, todos parecemos falar cada vez com menos volume. Como se o ruído pudesse perturbar a experiência de serenidade cuja antecipação, até há uns 15 minutos, ainda me provocava algum nervoso miudinho. O casal que nos acompanha, e que decidiu alinhar num voo de balão depois de ontem ter visto um nos céus alentejanos, também denuncia o nervoso. Sobretudo a mulher que, nota-se, por uns instantes ainda terá ponderado dar meia-volta e correr para a segurança do seu quarto na Herdade dos Grous, onde também ficámos.

A hora do encontro deveria ter sido pelas oito da manhã — é que quanto mais cedo se levanta voo maior será o tempo da experiência: assim que a temperatura exterior começa a aquecer torna-se difícil operar um balão, que depende do ar quente para se manter insuflado. Mas a neblina que cobria as paisagens levou a equipa da Up Alentejo, uma empresa que resulta da união de esforços entre o operador turístico activo Emotion e a Publibalão, a operar na área do balonismo em Portugal, a adiar a hora da largada do balão. Assim, já é perto das nove da manhã que um carro surge para nos levar ao balão: “Com a mudança da direcção do vento tivemos de alterar o lugar da partida”, informam-nos.

Passam poucos minutos das nove quando o sol começa a sorrir, neste que coincidiu ser o primeiro dia completo de Primavera, e nos acomodam, à equipa da Fugas e ao casal de turistas, num todo-o-terreno para nos levarem para um campo verdejante onde ainda só se consegue avistar um cesto que mais parece uma cesta de piquenique em ponto gigante, e uma tira comprida de pano que, em menos de nada, se transforma num pára-quedas imenso com a ajuda de uma ventoinha de tamanho industrial. Enquanto os panos, em amarelo, azul e vermelho, vão ganhando forma, Lourdes confessa o receio que sente. A equipa da Up vai sossegando por um lado e lançando farpas por outro, o que apenas provoca alguns risos nervosos e algumas dores de barriga.

Enquanto outros tratam de pôr o balão em posição para que possamos escalar para dentro do cesto, é-nos dada uma miniformação, consistindo sobretudo na posição para a aterragem e nos cuidados a ter nessa alturas — “Ninguém larga as cordas e se levanta antes de eu o dizer”, ordena Hugo, o piloto desta manhã, ainda a terminar a formação, que explica que não são poucas as vezes que a aterragem não se dá à primeira, o que pode resultar em quedas para quem sai da posição antes do tempo.

Nuvens e copas das árvores

Quando chega a hora de embarcar, com o balão ainda preso ao Land Rover Defender que nos acompanhará por terra e que fará o resgate após a queda do balão, Hugo assume os controlos numa das pontas, enquanto os sete passageiros — entretanto juntaram-se a nós a directora de um hotel em Aljustrel, um jornalista também em experiência de baptismo e o piloto da Up Aníbal, “o homem com mais horas de voo de balão no mundo”, enaltece Hugo — vão ocupando um lugar entre os dois compartimentos divididos a meio. Este é um dos maiores balões que a empresa possui neste momento. Provavelmente em Maio chegará um com capacidade para transportar até 12 passageiros. Mas Aníbal frisa que não irão investir em balões maiores do que isso. “A dada altura perde-se o contacto entre o piloto e os passageiros, e não é esse tipo de serviço turístico que queremos prestar”, explica.

Por fim, a corda que ainda nos prendia a solo firme é desamarrada e, muito lentamente, começa-se a ver o chão a afastar-se. Depressa concluo que a designação voo de balão não será mais apropriada. Até porque, como frisa Aníbal, “o balão não é um dirigível”. O que se controla não é a direcção mas a ascensão. “Posso levar alguém a tocar nas nuvens e logo a seguir a tocar na água de um lago ou a varrer as copas das árvores”, descreve Aníbal, ao mesmo tempo que se movimenta pelo balão com a segurança de poucos.

Por tudo isso, será talvez mais correcto falar em flutuação. Porque é exactamente isso que se sente. É como se estivéssemos a flutuar, no caso entre cegonhas que durante os primeiros metros ainda nos acompanham numa espécie de bailado. Depois, à medida que continuamos a subir, deixamos as aves cada vez mais para trás. Como tudo o resto. E, a esta distância, nada se parece mover. Nem nós. Tal como se estivéssemos a assistir a um filme, o silêncio parece impor-se. E mesmo quando se fala, parece que se fala cada vez mais num murmúrio. “Já fiz muita coisa, mas nunca tive experiência igual”, desabafa Lourdes, num tom de voz que denuncia a completa e perfeita serenidade que sentirá. “É tudo tão bonito!”, diz, carregando no “tão”.

Hoje, não há lugar a tocar nas nuvens, embora uma massa cinzenta ao longe sirva de prenúncio a um fim de dia invernoso. “Sem equipamento de apoio, pode-se subir até aos dois mil metros; depois disso depende das condições físicas dos passageiros.” Mas sob as nossas cabeças as poucas nuvens que avistamos não só estão bem altas como desfeitas em farrapos. No entanto, ainda se pode varrer as copas das árvores ou quase tocar na água da barragem. Hugo trata de corrigir a altura do balão de forma a encontrar um corredor de vento que o leve ao seu destino. Num dia como aquele em que vivemos a experiência, parece mais ser uma brisa que nos leva, tal é a placidez da viagem que quase nos leva a suster a respiração.

Sem quase se dar por isso, vamos caindo e caindo. Cada vez mais. Até que, por fim, estamos a poucos centímetros da recortada barragem que presta serviço à Herdade dos Grous, em cuja propriedade acabaremos por cair. Por uns parcos segundos, não se percebe se estará tudo bem ou se ainda iremos a banhos. Mas o balão parece suster-se magicamente imóvel sobre a barragem, reflectindo as suas vivas cores no espelho de água. E quando já nos havíamos habituado a esta posição, volta a subir para um pouco mais à frente fazer outro voo rasante, desta vez às flores que por esta altura já salpicam todo o Alentejo. Espera-se que a qualquer instante Hugo diga para nos prepararmos para a queda, desejando por outro lado que o piloto volte a insuflar o balão de ar quente e que esta experiência dure ainda mais um pouco. Mas o carro de resgate já vem a caminho.

Hugo tem duas possibilidades: poisar agora, em terreno plano, ou sobrevoar as árvores que temos pela frente sem saber se a seguir encontrará as mesmas condições para a queda. “Prefiro jogar pelo seguro”, adianta. “Não vale a pena estragar um voo tão bom por apenas mais um ou dois minutos.” Assim, dizem-nos por fim para assumirmos a posição: agachados de costas para o solo onde se irá embater dentro de segundos e agarrados às cordas que temos à frente. Tal como Hugo previra, não foi ao primeiro embate – toquezinho será o termo mais apropriado ao que se sente – que o cesto poisou. Tocou uma vez no solo. E outra, mais outra vez. Por fim, de volta a terra firme. E depois da logística da saída — que tem de ser feita por uma determinada ordem para evitar que a cesta, ainda sujeita à força do balão insuflado, se vire.

“De certeza que vou voltar”, diz Lourdes, de sorriso rasgado. E, num murmúrio, confessa ao marido Jan: “Quando morrer, quero que seja assim: sereno.”

Informações

A Up Alentejo é uma empresa recém-criada que une os esforços do operador de turismo activo Emotions e a Publibalão, apostando nos voos de balão de ar quente pelo Alentejo. O preço da experiência por pessoa é de 140€ e inclui brinde com espumante no final. Não é aconselhado o voo a crianças com idade inferior a sete anos ou com uma altura de menos de 1,20m, sendo que estas pagam 120€.

Num só pacote podem ainda ser incluídas distintas experiências, entre actividades para fazer em família, em ambiente romântico (“temos vários pedidos de casamento feitos no ar”) ou gourmet. A Fugas alinhou no pacote gourmet, que incluiu a estada na Herdade dos Grous, com mimos variados, prova de vinhos, visita à adega da herdade e almoço gourmet. O valor total do pacote, dependendo do quarto escolhido, começa nos 250€ por pessoa.

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A Fugas esteve no Alentejo a convite da Up Alentejo

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