Fugas - Viagens

Um hotel entre os hotéis, numa Maiorca dentro de Maiorca

Por Mariana Correia Pinto

Assentámos no Belmond La Residencia e vivemos uns dias como se fôssemos reis. Montanha, mar, sol, praia, piscina, comida, arte — no noroeste da ilha espanhola, há um local onde os sonhos se concretizam.

Uma montanha soberba de um lado, um mar infinito do outro, socalcos amiúde que nos fazem lembrar a Toscana e um cenário que parece pintado à mão. Deixámos o aeroporto de Son Sant Joan, em Palma de Maiorca, e rumámos a Norte: 40 minutos sempre a subir, curva, contracurva, espanto crescente. Benvinguts a Maiorca — à outra Maiorca. Benvinguts ao Belmond La Residencia, um hotel na aldeia de Deià, bem pertinho do céu.


Foi este hotel-boutique que nos trouxe até aqui — ao lado menos popular da capital das ilhas Baleares, um segredo partilhado entre o jet-set internacional (das gentes de Hollywood aos mais variados nomes do mundo artístico) e relativamente bem guardado para o resto dos mortais. Vamos desvendá-lo? A poucas horas de distância de Portugal (do Porto e de Faro há voos directos, de Lisboa a melhor hipótese é fazer escala em Madrid), Maiorca é um destino a acrescentar naquela lista “sítios-paradisíacos-que-são-mais-do-que-imaginávamos”. Noite, festa, praia? Sim, há disso tudo pela ilha. Mas aqui fazemos desse o lado B.


Chegámos ao Belmond La Residencia com o cair do dia e fomos recebidos por um pôr do sol majestoso. Estava decidido: os fins de tarde dos próximos dias haveriam de ser passados ali, no café Miró, ao som de um piano branco afinado, a tirar fotografias às cores do céu (vermelho, alaranjado, amarelo) e sem wi-fi que nos puxasse à Terra (este recanto é o único de todo o hotel onde a rede não chega e não podíamos achar mais apropriado). Este hotel é um mundo de outro mundo, não acessível a todos (o preço por noite pode ir de 350 a 4000 euros, consoante o quarto e a época do ano), mas com uma carteira de clientes que o mantém aberto há 30 anos e que regra geral o deixa bem composto (nos dias em que a Fugas esteve por lá, a taxa de ocupação estava nos 70% — e isso é considerado pouco).


Formado por vários edifícios de diferentes séculos, este hotel é uma espécie de tour histórico: a torre mais antiga remonta ao século XIV e as duas casas principais são dos séculos XVI e XVII. O que foi sendo acrescentado nos últimos anos respeitou sempre a linha arquitectónica que é, de resto, a mesma que se vê em toda a aldeia de Deià e que camufla o La Residencia na paisagem. Não poderia ser diferente: a serra Tramuntana, onde o hotel surge, foi declarada em 2011 Património Mundial da UNESCO e as restrições à construção são apertadas. “Só podemos construir com determinado tipo de pedra e com uma certa dimensão”, explica Ulisses Marreiros, o português de Faro que chegou a Maiorca há um ano e meio para dirigir este hotel que funciona num regime sazonal, de Março a Novembro.


Entre os 67 quartos existentes não há dois iguais, realidade que se deve a esta construção prolongada no tempo e que acaba por ser parte da magia do espaço. Pode optar por um quarto relativamente simples (que é como quem diz: enorme, com zona para a cama — que conforto! — e outra para sofá) ou por algo mais exclusivo (há quatro suites que contam com piscina privativa “de dimensão generosa”). Mas por onde quer que vá, o luxo não descola e se não tem piscina privativa no quarto não é caso de preocupação, há mais três partilhadas à disposição: uma de grandes dimensões, para todos (o hotel é completamente baby friendly, com actividades pensadas para os mais novos, sem pôr em causa o descanso dos outros), uma um pouco mais pequena, só para adultos, e uma interior junto ao spa. Outra boa notícia: mesmo que a temperatura exterior não seja a melhor (o que é raro também), a água mantém-se acima dos 25 graus.

A baía das laranjas


Dia 2: ao contrário do que a noite fresca do dia anterior fazia prever, o sol espreita na janela do quarto, vista para a montanha à esquerda e para a piscina à direita. O pequeno-almoço é como se imagina: mesa de queijos, zona de produtos regionais maiorquinos (destaque para a sobrasada, um enchido típico, da qual visitamos a fábrica em Sóller), zona internacional e pedidos à carta: ovos com bacon, tortilha, omeletes... Depois é só desfrutar o momento: a comida, a paisagem e a leitura de jornais que chegam diariamente. Não fosse a passagem pelo spa que tínhamos marcada para pouco depois e deixar esta mesa para trás teria sido complicado. “Desligue o telefone e relaxe...”, dizem-nos à entrada deste spa premiado. E o pensamento imediato: “Mais?!”. Sim, era possível mais. Meia hora depois, com uma massagem ao pescoço e à face achamos que o mundo é um lugar bonito. Este spa foi um dos apenas dois espanhóis que em 2012 foi reconhecido pela Leading Hotels of the World como um spa líder e, em 2010, ficou em quarto lugar no top 10 dos melhores hotéis-spa da Europa na lista da Condé Nast Traveller. Há uma infinidade de tratamentos disponíveis, desde terapias de relaxamento a massagens faciais e corporais, passando por tratamentos de autor. O jacuzzi  exterior com vista para a montanha é imperdível e, para quem aprecia, há sauna e sala de vapor e um ginásio completo para não perder a forma.


O sol vai alto quando nos servem o almoço na piscina: um “pequeno” buffett e pizzas com vinho rosé a acompanhar. Por esta altura já percebemos que as três noites (e menos de quatro dias) que por lá vamos ficar são, afinal, coisa pouca para o tanto que há para ver e fazer. Sem tempo a perder, e ainda que a vontade de deixar o hotel seja pouca, rumamos ao Puerto de Sóller — um bom sítio para recuerdos, almoços e jantares, gelados e bebidas. Há por aqui duas pequenas praias, mas o que mais nos encanta é o ambiente e os barcos que por lá atracam, tanto os vistosos iates como os típicos llaud. Valeu a pena sobretudo pelo passeio que se seguiu: num eléctrico centenário em madeira fizemos a viagem por cinco euros até Sóller, uma pequena cidade com pouco mais de 12 mil habitantes. Por aqui, quase todos têm família em França e se falam connosco no maiorquino local (não confundir maiorquino com catalão, sob pena de algo correr mal com os habitantes) a coisa pode não funcionar. A este local chama-se frequentemente “baía das laranjas, fruto que era muito exportado para França”, conta Louise Davis, relações públicas e assistente da direcção do La Residencia que nos acompanhou na excursão. Em toda a cidade há apenas um supermercado — tudo o resto é comércio tradicional na rua. Confirma-se a tendência na Calle Luna, a rua principal cheia de lojas encantadoras: padaria, livraria, drogaria, talho, há de tudo.


A cinco minutos dali encontra-se a Fábrica La Luna, a única que continua a funcionar depois do pico da Revolução Industrial de Sóller, no final do século XIX, e a mais antiga na confecção de sobrasada maiorquina. Aberta desde 1900, a fábrica equipou-se com tecnologia moderna nos anos 80 e tem agora um pequeno museu onde se pode ver como eram feitos os produtos noutros tempos, vão explicando Tomeu e Maria, o simpático casal que gere o espaço e nos faz uma rápida visita guiada.
Não tarda o sol põe-se e por isso apressamo-nos a descer até Deià (lembram-se da promessa do pôr do sol?). Depois do jantar no Café Miro do dia anterior (e que jantar! Aqui há sempre uma carta com 20 tapas requintadas, cinco delas sempre novas; provámos um delicioso presunto de pato com melão, uns espargos verdes, almôndegas... e acompanhámos com um vinho branco local), espera-nos um jantar no restaurante El Olivo — algo que se repetiria na noite seguinte, a da despedida. O chef executivo Guillermo Mendéz, que gere os três restaurantes do La Residencia, fez deste espaço o mais requintado dos três. O aviso “telefone proibido” afixado à entrada e repetido no menu é apenas um dos pormenores deste local-refúgio. Luzes baixas, velas acesas e decoração refinada. O melhor vem depois: no robal

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