Fugas - Viagens

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Um raid uns furos acima por paisagens de sonho e caminhos algo rupestres

Por Álvaro Vieira

A proverbial qualidade da organização do Clube Escape Livre esteve particularmente à prova neste passeio, que ficou uns furos acima da média no que diz respeito a pneus. Ninguém foi deixado para trás, privado das emoções que a condução off-road, as paisagens inacessíveis e as experiências culturais e gastronómicas proporcionam.

A descida foi um dos pontos altos. E nem se fez ao volante dos automóveis, cuja tracção integral e outros dispositivos que os agarram ao solo tinham aqui dado muito jeito, mas sim a pé.

O Mercedes-Benz 4 MATIC Experience (MB4ME) 2014 levou os 102 ocupantes dos 37 veículos da marca que participaram neste raid off-road, organizado como habitualmente pelo Clube Escape Livre, à Canada do Inferno, na margem esquerda do Côa, para verem algumas das gravuras rupestres que travaram a construção da barragem do Pocinho, em 1995.E que, três anos depois, foram classificadas como Património Mundial da Humanidade pela Unesco.

E foi também a pé que, a 19 de Outubro, o terceiro e último dia do passeio, se descobriu Salamanca, a cidade espanhola cuja universidade, fundada em 1212 – uma das mais antigas da Europa -, e demais património cultural e edificado levou a mesma Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura a conceder-lhe, logo em 1988, o selo de Património da Humanidade.

Entre um destino e outro, o Douro. Os socalcos e as vinhas que, nesta altura do ano, se apresentam mais belas do que nunca, com os seus matizes de dourado e encarnado. E que também estão classificadas pela Unesco desde 2001. O MB4ME de 2013 também andou por estas bandas, arrancou na Régua e acabou a visitar o centro histórico de Guimarães, sempre na Rota do Património da Humanidade.

Por estes itinerários, já se percebeu que o MB4ME, como outros eventos do género organizados pelo Clube Escape Livre (CEL), é um passeio no qual as componentes culturais e paisagísticas estão sempre muito presentes. Estes raids não são para quem o mundo perde o interesse da porta do carro para fora. Mas também não são a excursão ideal para quem não gosta de conduzir ou de ser conduzido, muitas horas, por caminhos alternativos, mais inóspitos e mais desafiantes, ainda que longe das exigências de uma prova de todo-o-terreno a sério.

Estes passeios não são para velhos nem para jovens. São para todos os que foram contemplados com um mínimo de espírito de aventura e que conservaram a capacidade de se deslumbrarem. E, já agora, que têm carros com soluções tecnológicas que lhes permitem fazer, em segurança, coisas muito mais interessantes do que subir passeios.

A organização do CEL, de resto, faz tudo para assegurar que o passeio não coloca em risco a integridade das viaturas nem exige mais do que elas estão preparadas para enfrentar. O reconhecimento dos caminhos é feito com o modelo mais baixo dos que participam no passeio – no caso eram os GLA, que superaram tudo sem problemas – e chega a fazer o trabalho ciclópico de, nos dias que antecedem o evento, armada de motosserra, cortar os ramos e troncos que ameaçam riscar ou barrar os veículos.

O CEL, fundado em 1986 – com origens no programa Escape Livre, o mais antigo programa radiofónico dedicado ao automóvel, emitido pela Rádio Altitude desde 1973 – e editor da Escape Livre Magazine, sempre se assumiu como motor da promoção da Guarda e viu no automóvel um veículo para essa divulgação.

Não admira, portanto, que tenha sido na Guarda, a cidade mais alta do país, que arrancou o MB4ME 2014, com uma etapa nocturna que levou a caravana até aos montes dos arredores da cidade, por caminhos de terra íngremes, submersos numa escuridão e nevoeiro bons para testar a adaptação à leitura do road-book, para quem se estreava nestas andanças, e devolveu a comitiva inteirinha ao centro histórico da cidade, onde, aos pés da Sé e da estátua de D. Sancho I, aguardava o alcaide medieval, que guiou a comitiva por uma visita pela judiaria e algumas portas da muralha da cidade, numa recriação histórica em que participaram outros actores.

Bom passeio para esmoer o jantar (come-se muito, e bem, no MB4ME) e agradável e pedagógica distracção, antes do regresso ao Hotel Lusitânia para uma boa noite de sono, terão pensado os participantes novatos que daí a pouco descobririam o lado mais pérfido e sádico da organização: alvorada às 8h! Ou melhor, aliás, pior: todos com pequeno-almoço tomado e dentro dos carros, em ordem de marcha, às 8h de sábado! Quem chegou até ali, ao fim de uma semana de trabalho, vindo do Alentejo ou de Felgueiras, deve ter-se perguntado onde estava com a cabeça ao embarcar numa aventura tão espartana.

Ao fim do dia terá concedido que, se não fosse assim, não teria tido tempo para descer pelos socalcos até à Quinta da Ervamoira, para ali visitar o respectivo espaço museológico e saborear um cálice de Porto e figos diante de um vale deslumbrante, nem para subir ao monte de S. Gabriel, a 654 metros de altitude e uma vista verdadeiramente panorâmica, que nos convida a rodar sobre nós próprios para vermos todo o vale do Côa, os concelhos de Torre de Moncorvo, Meda, Trancoso, Pinhel, Figueira de Castelo Rodrigo, Freixo de Espada à Cinta e terras já de Espanha.

O CEL estipula horários espartanos mas oferece aos participantes mimos de epicurista. É graças à organização que no alto deste monte longe de tudo está uma roulote que oferece farturas acabadas de fazer, café e outras bebidas.

A etapa seguinte acabou com a descida à Canada do Inferno e com a visita, já com a comitiva repartida por grupos mais pequenos, às gravuras neolíticas, de cavalos, auroques e outras figuras, que o homem começou a fazer nestas rochas há 25 mil anos. Muito mais gravuras havia para ver a seguir, originais ou réplicas, no Museu do Côa, cuja arquitectura, só por si, já merece a visita. E, nutrido o espírito, alimentou-se o corpo, no restaurante do museu.

O granito da Guarda já dera há muito lugar ao xisto, cujos afloramentos mais pontiagudos nos caminhos começaram a atacar os pneus. A descida fez-se por estradas estreitas, com precipícios de lado, e a caravana acabou imobilizada quando um dos primeiros carros sofreu um furo, numa zona de ultrapassagem impossível. Foi o primeiro de quatro, que o dia ainda estava a meio: um recorde para o CEL.

Atravessados riachos e vencidas algumas curvas em cotovelo apertado, para fazer a dois tempos, a caravana visitou a Quinta da Leda, onde se produz o mítico Barca Velha. Tempo só para espreitar a vista do miradouro da adega moderna, que havia mais caminhos e obstáculos para vencer, por terrenos onde a vinha já dava lugar às oliveiras.

Já outros dois participantes tinham sofrido furos quando chegou a vez do CLK em que seguia a Fugas sofrer um rasgão no pneu da frente do lado esquerdo. O CEL e a Bridgestone, que patrocinou o MB4ME, tinham tido o cuidado de registar as medidas dos pneus utilizados por todos os modelos presentes e de transportar pelo menos um pneu sobresselente. Sucede que o CLK da Fugas não tinha roda sobresselente, mas apenas kit de espuma anti-furo.

Uma solução para pregos espetados no piso do pneu, mas não para rasgões onde cabem dois dedos na parede lateral do pneumático. O CEL tem sempre um jipe a fechar a comitiva pilotado por um dedicado e engenhoso mecânico e este, à custa de tacos, lá conseguiu estancar a fuga de ar.

Com as malas fora do carro a equipa do CLK viu um barco-hotel a passar no Douro a poucos metros, como se estivesse prestes a mudar de tipo de transporte. Mas continuou sobre rodas. A partir de Barca D’Alva, já próxima, foi recolhida por uma pick-up da organização que a levou além-fronteira, até Ciudad Rodrigo, a pouco mais de cem quilómetros dali.

Outros elementos da organização — que conta com dez pessoas, sobretudo voluntários, mas que parecem muitas mais, tal é a forma como parecem sair de debaixo das pedras para estarem em todo o lado — trataram de levar, com várias paragens de caminho para repor a pressão do pneu furado, o CLK até Ciudad Rodrigo.

Aqui, apesar de ser sábado à noite, já havia uma oficina de prevenção, previamente contratada pelo CEL para acudir a qualquer emergência. À hora do jantar, no castelo-Parador de Ciudad Rodrigo, um monumento do séc. XIV, a Fugas, que só perdeu a visita a San Felices de los Gallegos, já estava a recuperar a sua CLK com um pneu novo. E a partida, no domingo de manhã, foi marcada para umas preguiçosas 10h. Olé!

Os últimos quilómetros fora do asfalto em Espanha já não tiveram montes por companhia, mas planura a perder de vista e muita lama argilosa. Foi com o desmazelo que se imagina que os carros se perfilaram junto ao Convento de San Esteban para a fotografia de grupo da praxe, com a fachada rendilhada do templo, de estilo plateresco, em fundo.

E foi daí que o grupo se encaminhou a pé para a Plaza Mayor, uma das mais bonitas de Espanha, para ser recebido pela vice-alcalde e assomar à varanda, onde o presidente dos Estados Unidos é alvejado no filme Ponto de Mira, de 2008. Na verdade, o filme não foi rodado aqui. A praça é um conjunto classificado e foi recriada como cenário no México.

Após uma visita à cidade e a alguns dos seus principais monumentos, com passagens óbvias pela universidade, pelas catedrais nova e velha e pela Casa das Conchas, o grupo almoçou numa sala imponente do Colégio de Fonseca, do séc. XVI, e visitou o Museo de História de La Automoción de Salamanca, cujo acervo inclui desde reproduções de máquinas do século XV através das quais o homem começou a ensaiar formas de se deslocar com menos esforço até alguns dos bólides que, não há muitos anos, disputavam vitórias em grandes prémios de Fórmula 1 ou em provas do Campeonato do Mundo de Rali. Cumpriu-se o MB4ME 2014. Para 2015, se tudo correr bem, há mais.

A Fugas participou no Mercedes-Benz 4MATIC Experience 2014 num GLK 250 BlueTEC cedido pela marca e a convite do Clube Escape Livre

 

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