Fugas - Viagens

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  • Goran Tomas Evic/Reuters
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De Luxor a Assuão, viagem num Egipto à espera dos turistas

Por Mariana Correia Pinto

Três anos de turbulência deixaram-no (quase) deserto de turistas. Agora, um ano depois do fim da Primavera Árabe, o Egipto está em braço-de-ferro com a imagem de insegurança e aposta tudo no turismo. Fomos de Luxor a Assuão sentir o pulso do país.

Não há tecnologia, comunicações ou GPS, não houve livros nem escola nem professores de canudo passado. E, no entanto, Qadry domina o Nilo como conhece “a palma da mão”: entende-lhe todas as manhas e todas as margens, sabe-lhe dos temperamentos variáveis ao longo do ano, guarda de cada quilómetro uma fotografia, como se na sua cabeça coubessem todos os mapas do mundo e ao ver o rio os visse também.

Qadry é o capitão do navio cruzeiro Sonesta Star Goddess — e isto é o mesmo que dizer que é “o homem mais importante do barco” e carrega pelo menos 25 anos de experiência a cruzar o mais extenso rio do mundo. É assim com todos os primeiros capitães de navios como este, liderados por homens que aprenderam a fazer fazendo. “Eu chamo-lhes génios. 95% não sabem sequer ler nem escrever e no entanto têm tudo na cabeça.”

Estas genuinidade, diferenciação e respeito pelas hierarquias de que o director do navio, Ashraf Fawzy, fala orgulhosamente são parte da magia que rapidamente se percebe nos cruzeiros no Nilo — o resto vem do espanto constante: seja a bordo, olhos postos nas margens, seja nas cidades onde o barco vai atracando.

Chegámos a Luxor ia a noite longa, ainda a refazermo-nos de 24 horas de um impacto chamado Cairo (um choque desagradável de cheiros, de poluição e de ruidosas buzinas, mas também de história e de grandeza que tornam a visita obrigatória). O Star Goddess é o terceiro e último barco atracado no porto e não há uma forma elaborada de chegar até ele: vamos andando barcos alheios adentro até chegar ao nosso, um ritual que se repetiria em todos os portos nos três dias da aventura que agora começava.

Só na manhã seguinte — e por manhã quer mesmo dizer-se manhã, porque a wake up call soava ora às seis ora às sete horas — percebemos o quão diferente era este Egipto, 700 quilómetros (cerca de uma hora de voo) a Sul da capital.

Luxor é verdadeiramente um museu a céu aberto, a cidade do Egipto onde se encontra concentrado o maior número de monumentos, e lá encontrámos finalmente o ar respirável que havia escasseado no Cairo. Passar apenas uma manhã na cidade, como determinava o programa, cedo se revelou demasiado curto para o tanto que havia para ver.

Deixámos (com pena) os templos de Karnak e Luxor, no este da cidade, para outra viagem e investimos no lado oeste, zona onde se encontram algumas das mais importantes necrópoles do antigo Egipto. A rápida passagem pelo Museu do Cairo tinha sido uma preparação para esta gigante aula de história 3D que íamos iniciar, mas só ali, onde foram feitos alguns dos mais importantes achados arqueológicos da antiga civilização, percebemos realmente do que se tratava.

Mohamed Zacaria, guia local habilitado para acompanhar visitantes falantes de língua portuguesa e nossa companhia incansável durante toda a viagem, faz uma pausa no discurso para o retomar segundos depois com a máxima atenção de quem o ouve: “Howard Carter descobriu aqui o túmulo de Tutankhamon, em 1922, 3500 anos depois de ser feito. É o faraó mais mediático do Antigo Egipto, apesar de ter morrido muito jovem.” A entrada neste túmulo do Vale dos Reis é estreita e há que esperar vez (e pagar 10 euros extra) para o fazer.

Dois homens guardam a entrada em cima, outro vigia os turistas lá em baixo (lá, como em todo o Vale dos Reis, é proibido tirar fotografias). Naquele espaço diminuto, onde entram apenas umas cinco pessoas de cada vez, é difícil imaginar toda a parafernália de objectos que tínhamos visto no museu do Cairo — e que efectivamente foi retirada dali depois da descoberta do arqueólogo britânico.

Tutankhamon chegou ao trono com apenas nove anos, mas ficou por lá pouco tempo, tendo morrido com 19 anos, vítima de malária, segundo as últimas investigações. Este túmulo não é definitivamente o maior nem o mais impressionante dos que vimos por ali — noutros, como o de Ramsés IV, os desenhos e as cores parecem ter sido retocados, tais são a nitidez e a riqueza. Mas a estranha capacidade que todo este espaço árido, com 63 túmulos descobertos e arqueólogos sempre presentes em busca de mais pedaços de história, tem de transportar quem por lá passa para uma espécie de viagem a um tempo que nunca se viveu já valeria a visita.

Por detrás da montanha onde se localiza o Vale dos Reis está o Templo da Rainha Hatshepsut (1473 – 1458 a.C.). Desenhado nas escarpas da montanha de calcário e com uma gigante planície deserta à frente, este é um dos mais espantosos locais do Egipto, construído por ordem da rainha faraó (o título é raro) Hatshepsut para ser o seu templo funerário.

Com a manhã a terminar, seguimos rapidamente para ver de perto os Colossos de Memnon, duas gigantescas e impressionantes estátuas do faraó Amenhotep III que, apesar de serem a nossa última paragem em Luxor, são o primeiro vislumbre de quem chega ao lado oeste da cidade, graças aos 18 metros de altura dos monumentos. Estas figuras são apenas uma pequena parte do que restou daquele que se acredita ter sido o maior templo do Egipto, o templo de Amenhotep III, que terá tido uma área maior do que o templo de Karnak mas que desapareceu devido a inundações do Nilo.

A dica número um para quem prepara uma visita a Luxor é uma espécie de prenúncio para aquilo que é esta cidade, já chamada de Thebas, capital do Antigo Egipto durante o Império Novo (1550 a 1069 a.C): não tente ver tudo num dia, não vai conseguir. Se o programa tiver menos de dois dias nesta cidade de 500 mil habitantes, o que nos parece o mínimo para ficar com uma ideia geral, faça opções (a zona este à oeste, ou vice-versa, por exemplo). Mas se puder — e se aprecia turismo cultural e histórico — guarde três dias para este lugar: acreditamos que não se vai arrepender.

Nas atracções turísticas de Luxor, tal como nas de todos os lugares por onde íamos passar, não há filas para comprar bilhetes nem amontoados de turistas — e se estava a perguntar-se por que razão deveria marcar uma viagem para o maior país do mundo árabe nesta altura este é um dos argumentos mais fortes (os preços significativamente mais baixos são outro).

O Egipto pós-Primavera Árabe e pós-Hosni Mubarak, o presidente que governou de forma autocrática por quase três décadas e que foi deposto na revolução de 2011, é ainda um país bamboleante, onde os escassos mas existentes atentados maioritariamente em regiões não turísticas induzem ainda um sentimento de insegurança a muitos turistas. Mas este é também um país em braço-de-ferro com essa imagem, a investir fortemente em recuperar o brio (e os turistas) de outros tempos.

Notámos isso no primeiro momento em que pisámos solo egípcio e fomo-lo percebendo mais claramente ao longo dos dias que por lá permanecemos: durante toda a viagem esteve presente um representante do Turismo do Egipto, houve polícia do turismo (muita, às vezes demasiada) a fazer a segurança do grupo de jornalistas com quem a Fugas viajou e um tratamento soberano, que pontualmente incluiu até presentes de comerciantes. “Eles são jornalistas, é importante passar uma boa imagem do nosso país”, segredava Mostafa Abdo Ahmad aos comerciantes. E eles pegavam num colar ou num típico escaravelho da sorte e ofereciam sorridentes.

Para Mostafa, o homem do Governo, mostrar o país aos turistas é tarefa para se levar muito a sério e o tratamento de rei que nos é dado, garante, não podia ser mais genuíno: “Os egípcios são assim, gostamos de receber bem.” Efectivamente, ainda que as diferenças culturais sejam notórias, o Sul do Egipto é um local aprazível, com um dress code que não é rígido (ainda que, para as mulheres, seja mais pacífico não usar roupas demasiado decotadas) e facilidade de comunicação garantida (quase todos arranham inglês e alguns um pouco de espanhol e francês).

Menos agradável é o assédio, que num país a precisar desesperadamente de turistas se torna algumas vezes infernal. A segurança leva sinal verde para quem viaja em grupos organizados, mas não é 100% garantida para quem viaja sozinho — esta, claro, é uma percepção passível de equívocos porque, como se disse, o Turismo do Egipto fez protecção policial em todos os nossos passos e não havia como sentir insegurança.

A bordo do Sonesta Star Goddess há uma saudável paz que se entranha nos viajantes, num cenário onde só o sol a cair lembra que o tempo passa. A viagem faz-se tranquila e as tardes no pátio do último piso do barco dificilmente podiam ser mais perfeitas: piscina à frente para suportar o calor, vistas assombrosas por todos os lados e pequenas embarcações que se emaranham ao navio e viajam quilómetros à boleia a tentar vender de tudo a quem vai a bordo (toalhas de mesa, pacheminas, vestidos típicos), regateando preços durante largos minutos. Ainda que não compre (se quiser fazê-lo, não se esqueça da regra fundamental em todo o comércio egípcio: regateie, o preço baixa sempre), a experiência de comunicação a 11 metros de distância é uma diversão imperdível.

A noite cai cedo e brinda os turistas com um pôr do sol avermelhado acompanhado por um chá servido diariamente e pontualmente às cinco da tarde. Mostafa, pai de três filhos, casado com “apenas uma” mulher (a religião permite que sejam quatro), põe os olhos nas margens do rio: “Sabes qual é o meu sonho? É ter uma casa aqui, junto ao Nilo.”

Diversão egípcia

O dia dois da viagem começa em Edfu, para onde havíamos navegado durante a noite, cidade a meio caminho entre Luxor e Assuão, nosso destino final. Uma charrete é uma boa opção para chegar ao mediático templo de Edfu (passagem obrigatória para quem faz este percurso pelo Nilo), aproveitando assim para sentir e cheirar esta cidade construída num vale próximo do Nilo, longe o suficiente para escapar às inundações mas perto o suficiente para não estar mergulhada no deserto.

Edfu é rica em açúcar e cerâmica e apesar de ser uma cidade muito ligada à agricultura, já é ao turismo que a maior parte dos cidadãos se dedicam. Compreende-se. O templo de Edfu — também chamado de templo de Hórus, deus egípcio adorado nesta cidade e representado sob a forma de falcão — é um dos mais bem preservados do Egipto e forneceu aos arqueólogos importantes informações sobre os rituais nestes espaços e o poder dos sacerdotes. O imponente edifício começou a ser construído em 237 a.C por Ptolomeo III e as obras só ficariam totalmente terminadas em 57 a.C.: o resultado é um templo tipicamente egípcio com 137 metros de comprimento, 79 metros de largura e 39 metros de altura.

São precisos apenas 65 quilómetros por rio para chegar a Kom Ombo e a visita ao templo com o mesmo nome da cidade e o único com dedicação dupla no Egipto — ao deus crocodilo Sobek, deus da fertilidade, e a Hórus — é feita com a noite posta, lanterna na mão. A dupla homenagem deste templo é visível pela divisão perfeitamente simétrica ao longo do eixo principal, construído há mais de dois mil anos durante a dinastia ptolomaica. E aqui podem ver-se múmias de crocodilos, animal que desapareceu do Nilo depois da construção da barragem de Assuão, edificada nos anos 1960, uma das maiores do mundo e um verdadeiro colosso da engenharia.

O navio cruzeiro Sonesta Star Goddess é um barco com capacidade para apenas 70 passageiros, o que o torna num lugar familiar em pouco tempo. E lá dentro a única coisa que se torna menos simples é escolher em que espaço permanecer: se na suite com vistas para o Nilo, a ver a vida nas margens sem sair da cama ou da varanda “privada”, se no restaurante do piso -1, onde o nível da água é o mesmo dos olhos, se no magnífico pátio da cobertura, a desfrutar dos cheiros enquanto se dormita junto à piscina e se é acordado pontualmente pelo almuadem, que em altifalantes anuncia o horário das orações, feitas cinco vezes por dia na direcção de Meca.

Seja qual for o pacote que escolha para viajar no Nilo entre Luxor e Assuão — o mínimo são quatro dias, mas nos navios Sonesta podem ir até oito — vá preparado para pelo menos uma noite de animação: a noite da Galabaya Party, em que os viajantes são convidados a vestir-se com trajes típicos (que pode levar, comprar a bordo ou num dos muitos mercados das cidades por onde for passando) e a divertir-se como um egípcio (e isto inclui tentar a dança do ventre, evidentemente).

“O Nilo é a minha casa”

Último dia, o destino final: Assuão. Estamos a quase 1000 quilómetros do Cairo e envoltos numa paisagem arrebatadora, com o deserto a prolongar-se até perto do Nilo e um Nilo mais azul e transparente do que nunca, povoado por inúmeras e intrigantes ilhas. Desde o Império Antigo que esta cidade — cujo nome significa “mercado” — funcionou como um ponto de comércio, já que ali se cruzavam as rotas entre o Egipto, o resto de África e a Índia, e um ponto estratégico de incursões militares na Núbia e no Sudão.

Dica feita relativamente a Luxor repetida aqui: se puder, guarde pelo menos dois dias para esta cidade. Com apenas uma manhã fizemos riscos dolorosos em locais como Abu Simbel (onde se chega depois de três horas de viagem no deserto mas, diz quem viu, vale cada quilómetro percorrido), Amada, Wadi es-Sebua, Kalabsha, a Ilha Elefantina, o Museu de Assuão, o Museu Núbio, entre outros. A frustração é suportável porque o que vimos valeu também cada minuto.

Depois de uma viagem na carrinha chegamos à faluca (pequena embarcação) que nos levaria ao templo de Ísis, construído na ilha de Filae durante a 30.ª dinastia, mas desmontado e reconstruído na ilha vizinha de Agilkia entre 1972 e 1980, já que, com a construção da barragem de Assuão, o complexo de templos da ilha de Filae passou a ficar submerso boa parte do ano.

Duas crianças, de sete e oito anos, guiam a nossa faluca como gente grande, sob supervisão de um adulto que só auxilia no momento de atracar o barco. Este espaço foi, tal como Abu Simbel, classificado Património Mundial pela UNESCO numa área designada Monumentos Núbios de Abu Simbel e Philae. É uma visita imperdível a um templo que foi feito para homenagear Isís — símbolo da fertilidade e maternidade e deusa adorada um pouco por todo o mundo — e onde apetece permanecer.

De volta a Assuão, numa manhã feita em fast-forward, há tempo para mais duas visitas. Primeira paragem: uma loja de perfumes que é uma verdadeira experiência sensorial, feita com toda a cerimónia, incluindo um chá ou bebida típica para acompanhar a demonstração — aqui há recriações de perfumes conhecidos, aromas locais deliciosos, há soluções para asma, enxaquecas e toda e qualquer maleita que possa imaginar. Segunda e inesquecível pausa: mercado de Assuão.

Para quem aprecia o espírito de um bom mercado — e isto significa para quem gosta de explosões de cores, de opções, de gente —, este é o lugar. Prefira a visita diurna à nocturna, que além de mais segura é a melhor para apreciar verdadeiramente o movimento.

Os mercados existem em quase todas as paragens e qualquer uma delas é interessante para recordações, mas o exotismo deste lugar não se compara a nada do que tínhamos visto. Perder-se nas especiarias, investir na shisha, sentir os aromas (e prová-los, para os aventureiros que ignorarem os conselhos de não comer fora de hotéis e lugares absolutamente recomendados), conhecer o artesanato, dialogar com os comerciantes. A experiência é quase cinematográfica e o assédio (para onde quer que olhe vai ter alguém a querer vender-lhe alguma coisa) torna-se até suportável.

Regressámos ao barco já com o fim da viagem a fazer mossa. Terminar em Assuão é uma dicotomia de sentimentos: o bom de se sair com o melhor na memória e o desejo de que tudo estivesse apenas a começar. A própria tripulação parece pressentir isso. “Está quase a terminar. É uma pena”, diz Mohamed, trabalhador do restaurante, o único da tripulação que fala um pouco de português — português do Brasil, que aprendeu com família que por lá vive. “Eu estou a esquecer a língua já, têm de vir mais portugueses cá para eu praticar. Têm de voltar vocês”, sorri.

É o mesmo desejo do capitão Qadry, a quem o coração aperta ao ver o Nilo quase vazio. “Está a melhorar aos poucos. Mas o que eu já vivi aqui...”, recorda numa conversa em árabe que Mohamed Zacarias vai traduzindo. São 63 anos de vida e quase os mesmos passados ali, no rio onde os pais já navegavam e onde Qadry anda desde miúdo, quando conduzia uma faluca. Noutros tempos chegou a fazer a viagem entre Assuão e o Cairo, separados por quase mil quilómetros. Mas depois os atentados assombraram o negócio e os turistas foram desaparecendo. “São terroristas, não são a nossa gente”, refere entristecido.

Acidentes teve apenas um na vida, quando ficou cinco dias com o barco parado no meio do rio depois de chocar com outro navio que seguiu como se nada fosse. Recorda-o já com um sorriso: “Ele é que teve culpa mas não quis saber. Mas agora é outra coisa, não há acidentes, é tranquilo”, diz Qadry, olhos colados no rio. O caminho faz-se assim: sem ajuda tecnológica, como contou antes o director Ashraf Fawzy e o capitão gosta de reforçar: “Não há nada aqui para nos guiar. Eu não sei ler nem escrever, só o meu nome. Mas olho e sei. O caminho eu sei. O Nilo é a minha casa.”

Povoado núbio, um outro Egipto

Estamos ainda a recuperar do coração acelerado que a subida ao camelo provoca quando Abdul, divertidíssimo com a nossa cara, inicia a conversa: “É de Portugal? Manuel José? Cristiano Ronaldo?”, sorri.

A popularidade do treinador de futebol por estas bandas e de Ronaldo (por todo o lado) é sempre uma boa forma de criar empatia. Acenamos que sim, somos de Portugal. “Boa gente”, diz Abdul, “é como aqui”. No Egipto?, perguntamos em jeito de provocação. “Isto não é o Egipto, eu não egípcio, sou núbio.” Uma reacção que se repetiria com todos os núbios com quem se falasse sobre o assunto: este povoado mágico, junto à ilha Elefantina, é uma África diferente. “Temos a nossa cultura, a nossa cor, o nosso dialecto, as nossas tradições”, continua Abdul.

Chegamos ao povoado depois de uma magnífica viagem de 30 minutos numa faluca: vemos Assuão a fugir da vista, a ilha Elefantina ali pertinho, pássaros e peixes, somos brindados por uma Macarena afinadamente cantada por duas crianças que encostam a sua pequena embarcação que mais parece uma prancha ao nosso barco e viajam à boleia enquanto esperam, sorridentes, uma gorjeta. A Núbia é actualmente uma região partilhada pelo Egipto e pelo Sudão, onde na antiguidade se desenvolveu o que se pensa ser a mais antiga civilização negra de África, que deu origem ao reino de Kush.

O camelo deixa-nos numa casa tipicamente núbia, aberta aos turistas para que conheçam mais sobre a história e o povoado. Por ali, passa-se uma tarde a beber chá de menta ou o típico carcadé (infusão de flores de hibisco), a fumar shisha, a fazer tatuagens de henna, a ver crocodilos (e, quem quiser, pode até pegar num crocodilo bebé).

Mas este mergulho na cultura local não fica completo sem as conversas com quem por lá vive e trabalha e perder a noção da hora, entre as crianças de traços perfeitos e diferentes dos que tínhamos visto e os muitos gatos que por ali circulam, torna-se muito fácil. É como nos tentou explicar Abdul: os núbios não são árabes, nem são africanos. São simplesmente núbios.

A Fugas viajou a convite da Across e do Turismo do Egipto

 

Como ir

A Across organiza viagens ao Egipto e cruzeiros no Nilo, com programas adaptados às vontades e necessidades do viajante. A Egyptair não faz voos a partir de Portugal, mas com escala noutras cidades europeias é uma boa opção. Internamente, é também a que oferece mais opções a melhores preços. Para mais informações, contacte a Across através do telefone 217 817 470 ou pelo email travel@across.pt.

Quando ir

O período entre Outubro e Maio é provavelmente o mais interessante para visitar o Egipto: as temperaturas são altas mas não incapacitantemente altas. Entre Luxor e Assuão, no Sul, os termómetros andam à volta dos 30 graus durante o dia, o que permite uns belos banhos de sol para quem apreciar mas não impossibilita a visita às cidades onde o barco vai atracando. Entre Maio e Outubro as temperaturas ultrapassam os 40 graus e torna-se mais difícil fazer as visitas no Sul do país. Por norma, este período teria a vantagem de ser mais calmo, mas no actual momento turístico do país essa questão não se põe: a calmaria prolonga-se por todo o ano.

Manual de sobrevivência em 15 itens

Assédio: muito, constante, às vezes incómodo. Há que ter paciência.

Alimentação: o mais seguro é comer no barco ou em restaurantes recomendados pelo guia com quem viajar, se viajar com guia. Mas este é um jogo de ganhos e perdas: se estiver disposto a arriscar comer na rua, terá efectivamente uma noção mais real da gastronomia.

Água: leve sempre consigo uma garrafa porque nas visitas aos templos as temperaturas são altas e é obrigatório manter-se hidratado. Beber água não engarrafada? Nunca! E lembre-se que o gelo pode ser feito com água das torneiras.

Compras: é fácil perder a cabeça nos muitos mercados por onde se passa. Se quiser reservar-se para apenas um, a nossa aposta é o de Assuão.

Regatear: sempre! Se lhe disserem que custa 100 libras, ofereça logo menos de metade.

Especiarias: se é apreciador, reserve um espaço na mala. São irresistíveis.

Moeda: as libras egípcias são a moeda local, mas em todo o lado aceitam euros e dólares. 10 libras são arredondadas para um euro. As gorjetas não são obrigatórias mas são quase obrigatórias. As libras dão jeito sobretudo para esta parte.

Visto: pode levar o visto tratado daqui ou comprar facilmente no aeroporto à chegada. Custa 20 euros.

Passaporte: é obrigatório para viajar para o Egipto e deve andar sempre consigo — se preferir deixar o original no hotel, ande sempre com uma cópia. Medicamentos: faça um pequeno kit, que inclua medicamento para possíveis diarreias. Leve protector solar e um creme para queimaduras — não vá a coisa correr menos bem.

Segurança: há muita polícia turística e vêem-se até soldados de metralhadora em punho. Nunca nos sentimos inseguros, porque além desta polícia que havia nas ruas, tínhamos sempre protecção providenciada pelo Turismo do Egipto. Em visitas com grupos e guia não há perigos visíveis. Viajar sozinho pode ser menos aconselhável.

Horários: acorde cedo, muito cedo. Mesmo no Inverno egípcio, se não fizer as visitas até às 11 da manhã vai sofrer depois.

Dress code: não é rígido. As mulheres podem sentir-se menos observadas e mais à vontade se usarem roupas que não sejam muito decotadas, mas o ambiente é amigável.

Trânsito: depois da passagem rápida pelo Cairo, onde de uma estrada com três faixas é sempre possível fazer uma de cinco e ninguém conhece o significado de sinais de luzes ou de cedência de passagem (é cada um por si e a buzina por todos), o Sul do Egipto é uma calmaria. Se andar de táxi, negoceie o preço antes de entrar e leve sempre a quantia que vai pagar certa — caso contrário, conseguir troco pode transformar-se numa missão impossível.

Comunicações: fazer e receber chamadas no Egipto fica caro. Se não quiser entrar em grandes despesas, use wi-fi sempre que encontrar. No Sonesta Star Goddess o wi-fi é pago — e isto é algo a corrigir!

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