Há uma imensa parede branca que parece mármore. Estica-se o dedo e ele atravessa-a. Ou atravessaria, não fosse uma barreira transparente. Acontece então uma espécie de vertigem. Ilusão? Cento e dois andares acima do chão sente-se o vazio. Da cidade, chega apenas o som, um zumbido indefinido, oco, quase nulo. Olha-se os pés. Estão assentes. À frente, depois do vidro, a parede branca continua tão densa como antes. Cento e dois andares acima do chão, há uma neblina molhada, uma nuvem que tapa toda a visibilidade. Nova Iorque a partir dali é pura imaginação. Dois dias antes, sem chuva, sem nuvens, ela desenhava-se aos pés de quem subia pela primeira vez ao deck da Torre da Liberdade, o edifício que suplantou o Empire State Building e a Willis Tower, em Chicago. Com 541 metros de altura, tornou-se simbolicamente o mais alto do hemisfério ocidental, construído junto ao local onde antes de 11 de Setembro de 2001 existiam as Torres Gémeas.
Há um cenário meio irreal. A sul, os barcos entram e saem da baía de Manhattan guiados pela estátua da Liberdade, em Liberty Island. É fácil acompanhá-los pelo Hudson, seguindo na outra margem o skyline de Jersey City, depois o de Newport, o de Hoboken até o rio se confundir com a construção cerrada da ilha de Manhattan. Castanhos e cinzentos de edifícios que se aglomeram numa imensa massa numa outra fronteira, agora de betão, onde se destacam as gruas do bairro de Hells Kitchen, em reconstrução, o Empire State, a nova torre de habitação na rua 57, o Chrysler Building, o verde dos parques de Washington Square, Union Square, Madison Square Garden. Antes, o casario baixo e de quadrícula menos definida do Village. Os olhos continuam a percorrer o ângulo. Ao longe, começa a definir-se o East River, as pontes de Queensborough, Manhattan, Brooklyn. Outra vez a baía de Manhattan a sul, Staten Island e a estátua da Liberdade.
No topo das Torres Gémeas o panorama era parecido, mas perdeu-se e há 14 anos que a cidade não era vista de cima a partir de Downtown. Tudo está feito para gerar emoção. A subida de elevador desde o piso zero ao 102 é feita em menos de um minuto e nesse tempo é projectado um vídeo que homenageia quem trabalhou na construção do World Trade Center ao mesmo tempo em que é sintetizada a história de Nova Iorque. Uma vertigem.
O tempo de cada visita é controlado e a contemplação limitada. Cada visita custa 32 dólares, cerca de 30 euros. Há três pisos para explorar — 100.º, 101.º e 102.º — e uma fila que é preciso fazer escoar, cá em baixo, entre a Fulton e a West Street, em plena baixa. Com o mapa de papel na mão, traçam-se percursos mentais perante e a partir daquela outra geometria real, cada percurso tão pessoal quanto a emoção que estar ali pode provocar, e tão alheia quanto possível às selfies, à corrida pela melhor imagem de sempre no topo do mundo. Há quem se retraia e guarde a máquina. “Não me apetece fotografar. Há qualquer coisa que me intimida e não há nada que possa captar isto”, diz Jake, um rapaz da Flórida que não planeava ir ali. “Estava a passar, vi a fila, perguntei o que era e esperei pela minha vez.”
São sete da tarde de sábado, 30 de Maio, um dia depois da abertura oficial do One World Observatory, a hora de Jake guardar a máquina. A oeste, a luz é quase dourada. Os rios reflectem o cinza do céu. O topo dos edifícios têm cores definidas. Verde, preto, ocre. E depois são duas tarde da segunda-feira seguinte, não há quase ninguém, e no mesmo sítio está a tal parede, branco cerrado em todos os pontos cardeais. Não há imagens iguais na cidade mais filmada do mundo.
Nem memórias. O cinema, a literatura, a televisão, a arte ajudam a fixá-las. Ali, no cimo, ocorre uma passagem de Joseph Anton (D. Quixote, 2012), o livro em que o escritor Salman Rushdie conta a sua vida e a primeira imagem que teve da cidade de Nova Iorque. A década de setenta ia a meio, Rushdie era publicitário e viajava pela América para escrever uma campanha para a U.S. Travel. Levaram-no ao bar Windows of World Trade Center, no cimo de uma das torres gémeas. Seria a sua “primeira e inesquecível imagem da cidade”, escreveu. Anos depois, a 11 de Setembro de 2001, estava outra vez na cidade, escritor famoso perseguido pelo regime de Teerão, e clandestino, assistia na televisão à destruição das torres. O que lhe ocorreu? Aquela primeira imagem.
O desafio
Fixe-se a imagem do conjunto a partir do topo daquele andar em fim de tarde. Orgânica, viva, a cidade desafia permanentemente as certezas de quem a visita e vai traçando circuitos proibidos ou sagrados, na moda ou envelhecidos. Na sua eterna mutação, ela surpreende o nova-iorquino mais conhecedor. Sair, traçar um plano de conhecimento, pressupõe essa sabedoria, a de que aquela cidade — como muitas cidades, mais do que quase todas — irá sempre escapar. E se o plano for amplo ela será capaz de gerar as emoções mais contraditórias.
Tome-se essa perspectiva de cima, abrangente, nova, como ponto de partida para uma viagem que não será nunca como outra qualquer. Estamos na maior cidade dos Estados Unidos e naquela que tem maior diversidade populacional. Com oito milhões e meio de habitantes em 2010, 33,3 % da população era branca, 28,6% hispânica e latina, 25,5% negra e 12,7% asiática. Em 1940, 60 anos antes, a percentagem de brancos era de 93% e o inglês era de longe a língua mais falada. Hoje disputa o primeiro lugar com o espanhol, a segunda língua oficial, mas há português, de Portugal e do Brasil, francês, chinês, japonês… Num cruzamento em hora de ponta de transeuntes o resultado de todos aqueles sons falados, gritados, resulta numa língua imperceptível. Mais uma vez, tudo isso está na arte, na literatura, no cinema, na arquitectura e agora, mais do que nunca, na gastronomia, mas em nenhum lugar como na rua essa diversidade é apreendida. E na rua, em nenhum lugar como no metro, não importa a linha que se tomar. “O metro de Nova Iorque é uma vasta mente desordenada”, escreveu Jonathan Lethem em Chronic City, um romance de 2009 sobre um escritor que tenta captar a essência da cidade.
Anos antes, uma personagem de um dos mais geniais escritores de Nova Iorque, o jornalista Joseph Mitchell, sintetizava, já no início do século XX, o melting pot que foi formando cada vez mais a metrópole onde nada se estranha e que todos parecem conhecer um pouco mesmo sem nunca lá ter estado. Mitchell era um jornalista que andava sobretudo pelo Village e pela Bowery, na baixa de Manhattan, então o centro de uma boémia que desapareceu. Ficou conhecido, entre outros trabalhos, por ter eternizado Joe Gould, um sem-abrigo que deambulava por bares carregando um segredo precioso. Conheceu, no entanto, Eugene Cassell em uptown. “…às vezes vou à cave de uma habitação de três pisos na rua cinquenta e cinco, um bloco a três quarteirões de Columbus Circle, e sento-me em cima de uma múmia egípcia roída pelos ratos e troco impressões com Charles Eugene Cassell, um velho yankee por cuja mente perturbada e amarga tenho muito respeito. O Sr. Cassell tem sangue negro, francês, português e inglês.” É uma das histórias reunidas em Up in the Old City (2008), um volume de crónicas e reportagens que traçam a identidade de Nova Iorque, aquela que a maioria dos nova-iorquinos não quer que se vá, a da multiplicidade, da diversidade social, cultural, económica, cultural, que muitos consideram poder estar ameaçada pelo aumento de custo de vida e consequente fosso entre ricos e pobres.
A cidade, a pé
Caminhe-se. Um passeio pela zona Oeste de Manhattan, desde deste Battery Park, no extremo sul, até ao início do Central Park, mostra uma cidade em renovação. A reconstrução do World Trade Centre deu o impulso e transformou uma das zonas mais envelhecidas da ilha numa das mais rejuvenescidas. Jovens casais com crianças em parques, homens e mulheres a fazer jogging ou a andar de bicicleta, esplanadas cheias, campos de treino de basebol, uma marina desportiva… É Primavera, estão uns 27, 28 graus centígrados, há muita humidade. Parece impossível que há pouco mais de dois meses tudo estivesse coberto de neve, um manto de gelo, capa na margem do Hudson, mesmo ali, e que parecia nunca mais derreter. Nesse percurso, de sul para norte, ainda em Maio, apareceu uma paragem obrigatória. O novo Museu Whitney. Inaugurado no dia 1, o edifício é uma das atracções da cidade. Pela arquitectura e pelo que guarda. Projectado pelo arquitecto italiano Renzo Piano, substituíu as antigas instalações na Madison Avenue daquela que é maior colecção de arte americana.
Com três grandes terraços, de forma angulosa, feito em metal e vidro, reflecte a cidade e, do interior, confunde-se com ela pela transparência. A exposição de abertura, America is Hard to Know, é mais uma vez simbólica. Representativa do que é a arte americana e do modo como ela representa a essência da América, com Nova Iorque no centro. Nova Iorque vê-se e deixa-se ver dali. Ela é retratada, por Edward Hopper, por exemplo, com o seu Early Morning Sunday, pintura de 1930, sobre uma Sétima Avenida de que resta pouco.
Dali, da West Street com a Gansevoort, o panorama é outro. Estamos no Meatpacking District, um antigo bairro de talhantes e negociantes de carne junto a Chelsea e agora transformado num dos sítios mais estimulantes de Manhattan. Galerias, restaurantes, hotéis, mercados de comida, lojas de marcas exclusivas, o lugar onde termina o Highline, o jardim que nasceu numa via férrea desactivada entre a rua 34 e, justamente, Gansevoort Street, à porta do Whitney. É um jardim suspenso, uma espécie de passeio público com bancos, esplanadas, espreguiçadeiras, arbustos e plantas de muitas espécies, água. Um parque público inaugurado em 2011, nascido da vontade e teimosia de um grupo de moradores que conseguiram fundos para que um sítio abandonado fosse transformado num dos mais interessantes lugares do West Side, inserindo-se na malha urbana complexa onde se destacam dois hotéis, pela arquitectura e pela oferta. O Americano, desenhado pelo arquitecto Enrique Norten, na rua 27, e o The Standard Highline, em pleno Highline, uma torre com vistas, um terraço com piscina, biergarten, restaurante, ponto de encontro de alguns dos happy-few nova-iorquinos. Se ainda há lugares in em Manhtattan — e há — este West Side é um deles.
Não passaram muitos quilómetros desde que a caminhada começou. Meia hora em bom passo até Meatpacking, mais uns vinte minutos sobre o Highline e deparamo-nos com um preconceito chamado Midtown. Escritórios, serviços, lojas de bric-a-brac, a Penn Station, Times Square, Bryant Parque, a biblioteca Pública, a Grand Central, as Nações Unidas e o desfazer de uma dúvida: a comida de rua veio mudar a geografia da cidade. Toma conta de praças e passeios, corta ruas, disputa clientes com os restaurantes chineses, coreanos, japoneses, dinners. Os lunch trucks anunciam a sua localização diária em sites da cidade, anunciam comida de qualidade a preços competitivos, matos são vegan, quase todos se dizem organics a reflectir a nova obsessão nova-iorquina — ou americana —, a comida saudável. Tacos, carnitas, waffles, hambúrgueres, crepes, lagosta. Uma variedade enorme de paladares do mundo e quase sempre o selo biológico.
A comida de rua reflecte a oferta dos restaurantes mais sofisticados. Nova Iorque é paragem obrigatória no roteiro dos foodies. Fazer uma escolha é sempre arriscado. A variedade da cozinha do mundo está representada ao mais alto nível. De Brooklyn ao Hell’s Kitchen — o bairro para onde se anunciam novos espaços de fine dining depois da renovação, passando pela multiplicação de sabores de Queens, onde os preços são mais competitivos e as estrelas ainda não chegaram. É preciso respirar. O caminhante ainda não teve tempo de sair da ilha. Estamos nos bairros de Manhattan. De sul para norte. Tribeca, Soho, Village — East e West — Chelsea, Midtown, Upper East e Upper West. A parte alta a perder pontos para uma baixa a renovar-se, em fuga da especulação de preços para ser já alvo dessa mesma especulação. O Narcissa, restaurante do chef Andre Balzac inaugurado em 2014, dá cartas no Standard de East Village. O Atera, o duas estrelas Michelin de Mathew Lightner, na rua 77. O Alder, com a cozinha molecular de Wyie Dufresne, na rua 157. O Momofuku, talvez o mais sonante, um restaurante coreano-americano de David Chang — também dono do Má Pêche, um trio de restaurantes que inclui um oyster bar, um noodle bar e o Ko, a estrela, na Bowery, em East Village.
Todos os anos os guias de restaurares sofrem actualizações. Levar para Nova Iorque um guia com mais de um ano é arriscado. O abre e fecha, a mudança de chefs, a competição pela qualidade e atenção de clientes e crítica faz deste circuito um dos mais vivos da cidade e uma das provas mais sentidas de que nesta cidade algo está sempre a escapar ao habitante e ao visitante. Tanto mais que a cidade se alargou. Não cresceu em tamanho, mas os pontos de interesse dispersaram-se. Manhattan já não é o centro do mundo nova-iorquino e o caminhante tem se render ao metro, ao ferry, ao táxi para estar nos cinco grandes bairros — boroughs — que a compõem: Manhattan, Staten Island, Brooklyn, Bronx e Queens.
Brooklyn e Queens
Num domingo de Maio, de manhã, um grupo de ciclistas prepara-se para um roteiro diferente. O ponto de partida é junto à Biblioteca Pública de Brooklyn e podem escolher entre várias paragens num percurso que passa por Williamsburg, Dumbo — o antigo bairro industrial reabilitado junto à ponte de Brooklyn e que se tornou num verdadeiro hot spot, com livrarias, bares e uma marginal — Park Slope, Carol Garden e Red Hook. É o circuito do brunch. Cada participante pagou 20 dólares por um passe que lhe dá acesso a 60 locais em Brooklyn onde acontecem eventos especiais entre as dez e as cinco da tarde. O consumo não está incluído. A festa termina ao fim da tarde na Grand Army Plaz. Há música e comida de rua.
Elena é italiana e veio com um amiga. Não sabe bem ao que vai. “Quero experimentar.” Estudante em Columbia, quer aproveitar a Primavera na rua, depois de sentir que “o Inverno foi mesmo para hibernar”. É das mais novas num grupo ecléctico de amantes de gastronomia onde não há bem um pelotão. Eles entram e saem de cafetarias e restaurantes com o passe carimbado até à paragem seguinte. No Buttermilk Chanel, em Court Street, no Brooklyn Roasting Company. A Time Out publicou o circuito completo para que ninguém se perdesse. Mas houve quem tivesse desistido, parado para uma sesta no cemitério que é um dos maiores jardins da cidade, um dos pontos mais altos da cidade: Green-wood.
O brunch é a instituição de fim-de-semana e Williamsburg, o velho bairro de uma decadência boémia dos anos 1940, 50 e 60 a capital deste “vício”. Na última década a classe média tomou conta do bairro e basta uma breve caminhada pelas ruas para perceber porque é que se diz que Manhattan já foi e Brooklyn é que é na nova movida nova-iorquina. Há bares e restaurantes capazes de satisfazer todo o tipo de clientela e, ao contrário de Manhattan, uma maior sensação de proximidade. Muito maior do que a ilha, Brooklyn tem uma densidade de construção e população muito menores. Ali, num fim de tarde ou à noite, parece haver sempre espaço e, mais uma vez, a caminhar, percebe-se a atmosfera que tem alimentado o cinema e, sobretudo, a literatura.
Actualmente, Booklyn — e muito em particular Williamsburg — substitui o Village dos anos 1950, 60 e 70. Incapaz de suportar os custos de Manhattan, uma população de artistas plásticos, escritores, jornalistas mudou-se para ali e alterou a dinâmica local. O efeito dessa alteração está a ser perverso. Brooklyn está na moda e isso tem um preço. O efeito é outra vez a dispersão. Bronx, Queens, e Jersey City, do outro lado do Hudson, já no estado de New Jersey, são alternativas a uma classe média que com ela leva hábitos. É o caso de Alice. Filha de pais argentinos, já viveu em Manhattan, em Caroll Gardens — bairro no centro de Brooklyn — e agora pensa ir para Hoboken, cidade junto a Jersey City, com uma grande comunidade de artistas, oferta cultural, proximidade. Tudo a preços mais suportáveis por uma artesã que vive das peças que faz em cerâmica e vende para lojas e galerias locais.
Alice está sentada numa esplanada no Dumbo, com uma cerveja. Na livraria em frente, a Powerhouse Arena — um armazém com um enorme pé direito transformado em espaço de livros, mais um a revelar a criatividade de livreiros independentes —, está a chegar Karl Ove Knaausgard, o escritor norueguês autor de A Minha Luta. É uma das estrelas actuais da literatura a que os americanos se renderam. Há fila à porta. Na semana anterior, à mesma hora, o crítico James Wood, o homem mais amado e temido pelos escritores — lançava ali o seu livro em mais uma sessão cheia. “É um privilégio poder ter isto à porta”, continua Alice que, como boa americana, encolhe os ombros à pergunta “lamenta deixar este sítio?”. “Quem sabe o que vou encontrar?! Estou sempre à distância de uma breve viagem de metro. E os lugares fazem-se.” O encolher de ombros de Alice não é o de resignação, mas o da capacidade de adaptação e de transformação que caracteriza os nova-iorquinos.
Os que enchem os parques nos festivais de música, nas sessões de cinema ao ar livre, nos terraços de festas privadas, nos bares de cocktails, nos museus, na rua. “Não há cidade mais fácil de conhecer”, escreveu um dia Paul Auster. Ou achar que se conhece ou por estar muita coisa sempre tão visível. “Só em Nova Iorque se pode ignorar um rato que se atravessa no caminho”, escreveu Edmund White no seu livro biográfico de juventude, City Boy. Como falar de uma cidade de que todos falam, de que todos os que passaram por ela escreveram, que está sempre em mudança e que faz dela a sua essência? Como não se deixa de ser redundante a falar das novidades?
Numa quinta-feira, ainda não são onze da manhã, e uma banda toca as últimas canções de um concerto para bebés no Madison Square Park, o mesmo sítio onde Teresita Fernandez inaugura Fata Morgana, um espelho suspenso, escultura horizontal que reflecte os passos e se reflecte em sombras, confundindo-se com as árvores, criando uma dimensão intermédia, espécie de miragem. Primavera e Verão são nos parques e nos terraços. As piscinas e o lado privado dos segundos rivalizam com a miscelânea dos primeiros, que apresentam uma programação específica para esta altura do ano. Festivais de música, espectáculos de teatro, feiras do livro complementam as propostas das salas de espectáculos. Aqui, atenção ao BAM. A Brooklyn Academy of Music é a sala mais concorrida actualmente. Música, teatro, dança, cinema, performance, conversas acontecem naquela sala de Brooklyn. Destaque para a mostra de cinema independente que acontece este mês de Junho, de 17 a 28.
Num jardim distante, na cidade de Long Island, em Queens, quatro artistas, entre eles a portuguesa Gabriela Albergaria — há três a anos a viver em Brooklyn — inauguram quatro esculturas no Socrates Park, à beira do East River. Two Trees in Balance, o nome da escultura de Albergaria, coloca duas árvores separadas por um muro de betão e pretende falar do momento em que natureza e construção se interceptam. The Living Piramide, de Agnes Denes, destaca-se. Uma imensa pirâmide de canteiros plantados no verde a contrastar com os edifícios do outro lado do rio.
Até lá chegar foi uma hora de metro desde o World Trade Center, a mudar de linha uma vez num domingo tranquilo. O resto do percurso fez-se a pé. Por oficinas abandonadas. Lojas de conveniência, restaurantes baratos, mais prédios novos de habitação para classe média, livrarias, mais restaurantes para servir quem chega. Há poucos turistas. Entre os locais, há brasileiros, gregos, turcos, haitianos, italianos, japoneses, coreanos, mexicanos, uma imensa massa de culturas que se reflecte na oferta de restaurantes e nas mercearias de bairro, prontas a servir todos os paladares. Queens tornou-se obrigatória no roteiro artístico — com a abertura do PS1, uma extensão do MoMA — e pela oferta gastronómica. Num fim de tarde de sábado, a escritora americana de origem haitiana, Roxane Gay, faz uma leitura do seu romance na Livraria Astoria. Há muito público a reflectir a diversidade cultural. Combinam-se jantares diante de uma oferta capaz de representar o mundo. E para ter o mundo a partir de Manhattan ou Brooklyn basta apanhar o 7, a linha de metro que leva até Jackson Heights, Sunnyside, Corona Plaza. Depois é escolher. Taquerias, kebab, tascas romenas, tailandês, parrillada argentina, indiano e o New World Food Court, com pratos de todo o sudeste asiático.
Faz-se um recuo. Deixa-se a proximidade para voltar a olhar a cidade à distância, outra vez desde o topo do One World Observatory, apresentada como a última grande novidade, ou atracção, em Nova Iorque. Não é possível abarcar tudo. Nunca é. Em Nova Iorque é menos ainda.
GUIA PRÁTICO
Como ir
A TAP (www.flytap.pt) tem voos directos diários para Newark, um dos aeroportos internacionais que servem Nova Iorque. As tarifas diferem de acordo com os períodos do ano. Nesta altura é possível encontrar preços entre os 700 e os 850 dólares. Uma pesquisa na área de low cost pode significar boas surpresas. A Iberia é actualmente a companhia aérea a apresentar tarifas mais baixas, com escalas em Madrid, para o JFK. Os preços mais baixos variam entre os 450 e os 600 euros. A Finair e a Lufthansa também costumam ter preços competitivos.
Quando ir
Os meses de Maio e Junho são os que melhor permitem tirar partido de tudo o que a cidade tem para oferecer. Temperaturas médias de 20 a 25 graus e humidade baixa possibilitam longas caminhadas ao longo do dia, o que se torna quase impraticável no pino do Verão, em Julho e Agosto, com a humidade a convidar a sair apenas no fim do dia. No Inverno, as temperaturas descem bastante, tendo com frequência valores negativos e fortes nevões. A paisagem muda completamente, no entanto, e essa diversidade de ambientes que a cidade cria ao longo do ano é um dos seus atractivos. Nesta altura, a vida nos parques e nas esplanadas junto aos rios Hudson e East é muito estimulante.
Onde comer
Em Nova Iorque é possível conhecer o melhor da gastronomia mundial. A oferta é tão vasta em qualidade quanto em preços. Além dos food trucks, aconselha-se uma ida a Queens. Preços simpáticos e restaurantes de muitos cantos do mundo num ambiente descontraído. Se a bolsa permitir, experimente o NoMad. Aberto recentemente, é um dos lugares de culto, graças à cozinha do Daniel Humm e William Guidara. O menu de degustação custa 178 dólares. Vale a pena consultar o site para perceber a originalidade do menu. Fica no número 1170 da Broadway, na esquina com a rua 28.
Onde dormir
A diversidade de oferta é tremenda. A Time Out costuma ter boas sugestões, dependendo da localização, do que pretende gastar e do ambiente que procura. O Nolitan, no bairro de Nolita, entre o SoHo, Little Italy e a Bowery é uma boa escolha para quem não tem restrições. Desenhado pelo atelier de arquitectos Grzywinski + Pons, é um dos edifícios mais interessantes do ponto de vista arquitectónico projectados actualmente na cidade. Os preços oscilam bastante: para este período, um quarto duplo tanto pode custar 400 dólares como 3 mil.
INFORMAÇÕES
Os cidadãos portugueses necessitam de preencher um documento ESTA, que lhes dá autorização de permanência nos Estados Unidos durante três meses.