Fugas - Viagens

  • Fábrica da Vista Alegre
    Fábrica da Vista Alegre Adriano Miranda
  • Museu Marítimo de Ílhavo, aquário de bacalhaus
    Museu Marítimo de Ílhavo, aquário de bacalhaus Adriano Miranda
  • Costa Nova
    Costa Nova Adriano Miranda
  • Capela da Nossa Senhora da Penha de França, Vista Alegre
    Capela da Nossa Senhora da Penha de França, Vista Alegre Adriano Miranda

Comer bacalhau num serviço Vista Alegre

Por Alexandra Prado Coelho

Um roteiro para descobrir Ílhavo passa obrigatoriamente pela história dos bacalhoeiros e pelo extraordinário espaço da Vista Alegre. Mas há muito mais para ver neste território marcado pelo mar.

Museu Marítimo de Ílhavo

Tentamos imaginar o que seria passar doze ou mais horas seguidas num pequeno bote – o dóri – no meio do mar, enregelado, longe do barco principal, envolvido pelo nevoeiro, prolongando a espera por mais uma hora e depois outra, para tentar encher o pequeno barco de bacalhaus.

E depois, com o dóri tão cheio que se arriscava a virar-se ou tão vazio que era um desespero de ver, procurar o barco grande, chamá-lo por entre o nevoeiro com a ajuda de um búzio e regressar para dormir algumas horas, poucas, apertado no meio de todos os outros pescadores, com a mesma roupa no corpo e um cansaço que não desaparecia nunca durante seis longos meses.

O grande barco de pesca do bacalhau no meio da sala da Faina Maior no Museu Marítimo de Ílhavo conta-nos essa história dos muitos homens que partiram daqui (e continuam a partir, embora em muito menor número) para pescar bacalhau à linha na Terra Nova. Andamos pelo meio do barco, tentando imaginar essa vida quotidiana de meses e meses seguidos no mar, como comiam (feijão, grão-de-bico, arroz, pão e, de vez em quando, bacalhau), como dormiam ou como escalavam o peixe antes de o lançar para o sal no meio do qual ele fazia o resto da viagem.

Passamos depois pela Sala da Ria, que mostra, em tamanho natural, as várias embarcações típicas da ria de Aveiro, a sala com a enorme colecção de conchas e algas do museu, a dos instrumentos náuticos, a do sal, para chegarmos, por fim, ao famoso aquário dos bacalhaus, onde se pode ver, ao vivo, que peixes são estes que desde há tantos séculos fizeram os portugueses viajar para tão longe em condições tão difíceis.

Alheios a essa história, cerca de 30 bacalhaus nadam no aquário (construído em 2001 quando o museu foi totalmente renovado, com um projecto de arquitectura do atelier ARX) e podemos vê-los primeiro de cima (o aquário é aberto à superfície) e depois, acompanhando a descida em círculo, de vários outros pontos de vista. Quando João Pedro Bastião, o nosso guia na visita, faz um som, eles saltam na nossa direcção, pensando que chegou a hora de comer.

Museu da Vista Alegre

Logo à entrada do Museu da Vista Alegre – o novo museu, inaugurado no ano passado – há uma fotografia antiga que mostra, entre homens, mulheres e crianças, todos os funcionários, e respectivas famílias, da fábrica da Vista Alegre, fundada em 1824 por José Ferreira Pinto Basto. Parece uma aldeia – e é precisamente essa a sensação que temos quando entramos no recinto onde, ainda hoje, continua a funcionar a fábrica. No centro de tudo, a igreja, à frente um terreiro, e à volta o bairro operário, a antiga creche, o teatro, tudo pintado de branco e amarelo. Aqui havia tudo, da companhia de teatro a um corpo de bombeiros próprio.

O museu conta várias histórias, começando pela do visionário que foi José Ferreira Pinto Basto, porque quis apostar no fabrico de cerâmica (Portugal foi dos últimos países da Europa a fazê-lo) mas também pelo projecto social que aqui criou, marcando profundamente a economia local – tudo isto “sem depender do patrocínio e da vontade política da coroa, como sucedera às fábricas portuguesas do século anterior”. Nascido no Porto, tinha sido construtor naval e detivera o monopólio dos tabacos e sabões antes de fundar a Vista Alegre.

Aqui conta-se também a história do fabrico da porcelana, das muitas experiências que foi necessário fazer até se conseguir chegar à fórmula certa – um dos pontos altos é o forno antigo, onde se pode entrar, destinado à cozedura das peças de argila (que pela acção da temperatura se transforma em cerâmica), atingindo os 1350º C (hoje os fornos funcionam a gás natural). Há também toda a história do trabalho de pintura da cerâmica, as modas ao longo dos tempos, o trabalho dos artistas locais e a colaboração com grandes nomes nacionais e internacionais. A visita inclui, aliás, uma passagem pela oficina de pintura, onde podemos ver os pintores a trabalhar em peças que estão agora a ser produzidas.

Mas para ser conhecer toda a história da Vista Alegre é indispensável a passagem pela Capela da Nossa Senhora da Penha de França, que foi o início de tudo. Classificada em 1910 como Monumento Nacional, foi mandada edificar nos finais do seculo XVII pelo bispo D. Manuel de Moura Manuel e comprada por Pinto Basto em 1816, sendo à sua volta que nasceu a fábrica e o bairro operário.

No interior vê-se o impressionante túmulo do bispo, esculpido por Claude Laprade, além dos azulejos do século XVII pintados pelo espanhol Gabriel del Barco. Um dos pontos de vista mais interessantes da capela não está ao alcance de todos mas tem, sem dúvida, um charme muito especial: trata-se do varandim, à altura do altar, ligado a um dos quartos da ala antiga do Montebelo Vista Alegre Ílhavo Hotel.

Quando o Grupo Visabeira adquiriu a Vista Alegre e quis relançar o local como atracção turística, decidiu construir um novo edifício para um hotel de cinco estrelas, virado para a ria de Aveiro. Assim, a parte moderna, com restaurante e uma decoração que conta, também ela, a história da fábrica de porcelana (cada andar corresponde a uma fase do fabrico e cada quarto tem uma decoração personalizada a partir das peças Vista Alegre) está hoje ligada à parte mais antiga, a casa da família Pinto Basto. É no hotel que encontramos a Fonte do Carapichel, mandada construir pelo bispo para ter água junto à capela. E é nela que lemos os versos que explicam o nome deste lugar: “Bebe, pois, bebe à vontade, acharás que é (muitas vezes) tão útil para a saúde quão para a vista alegre”.  

Farol

É o mais alto farol português – são 62 metros de altura – e o 26.º maior do mundo. E deve ser difícil encontrar faroleiros mais orgulhosos do seu local de trabalho. Somos recebidos à entrada pelo faroleiro chefe Nogueira da Silva, que nos explica a história do farol inaugurado em 1893 na sequência do alvará do Marquês de Pombal no final do século XVIII (a barra tinha sido aberta em 1810), que quis garantir a segurança dos navios ao longo de toda a costa portuguesa com a construção de uma série de faróis. Sabe-se até quanto custou, na altura, ao Estado português: 51 contos, o que equivale hoje a 255 euros.

Antes de subirmos ao topo – são exactamente 271 degraus em pedra e em forma de caracol – Nogueira da Silva ainda nos deixa uma explicação útil: os 13 segundos que a luz do farol demora a dar uma volta são uma espécie de assinatura deste farol. Cada um dos existentes em Portugal tem um tempo diferente, o que permite a quem está perdido no mar identificar o local onde se encontra apenas pela contagem dos segundos da rotação do farol.

E com esta informação iniciamos a subida até onde nos espera Nuno Silva, para nos mostrar o funcionamento deste farol, electrificado desde 1936 e que recebeu na altura da entrada em funcionamento, no século XIX, um aparelho lenticular de Fresnel, utilizando-se na época o vapor de petróleo.

Costa Nova

Do cimo do farol avistámos ao longe a Costa Nova, pedaço de terra entre a ria e o mar que foi sempre da preferência dos veraneantes, que ali começaram a construir as suas casas de praia ainda nos finais do século XIX.

Se no início ali viviam apenas pescadores, nos seus palheiros, casas de madeira que se tornaram tradicionais (as célebres riscas coloridas só surgiram na segunda metade do século XX), rapidamente os veraneantes começaram a surgir e nos finais do século XIX existia já uma sala de teatro. Na apresentação desta, “toda a high life da praia compareceu”, lê-se no livro Costa-Nova-do-Prado 200 Anos de História e Tradição, de Senos da Fonseca.

Hoje a Costa Nova cresceu muito, mas continua a encher-se de visitantes a cada Verão e mantém algumas das memórias desses tempos antigos. Fiquemos com esta descrição do livro que a celebra, assim como à presença de “figuras de topo do panorama social, político e cultural do país”: “A Costa-Nova assumir-se-ia como local privilegiado, preferido pelas elites, locais e distritais, para encontro anual com os espíritos letrados da época, numa espécie de vernissage cosmopolita.” Eram os tempos em que, nas palavras de Eça de Queirós, ela era “um dos mais deliciosos pontos do Globo”.

 

O que ver

Farol de Aveiro
Largo do Farol, Praia da Barra, Gafanha da Nazaré
Às quartas-feiras, à tarde, as visitas (gratuitas) realizam-se em três subidas (aproximadamente de hora a hora), no período das 13h30 e as 16h30 (Inverno) ou no período das 14h às 17h (Verão), não sendo possível agendar.

 

Museu Marítimo de Ílhavo
Av. Dr. Rocha Madahil, Ílhavo
Tel.: 234 329 990
Email: museuilhavo@cm-ilhavo.pt
Horário: de terça a sábado, das 10h às 18h, domingo das 14h às 18h
Preço: 5 euros (o bilhete integrado para o Museu Vista Alegre e o Museu Marítimo de Ílhavo custa 9 euros)

 

Museu da Vista Alegre
Vista Alegre, Ílhavo
Tel.: 234 320 600
Email: museu@vistaalegre.com
Horário: todos os dias, de Maio a Setembro, das 10h às 19h30; de Outubro a Abril, das 10h às 19h.
Preço: 6 euros (o bilhete integrado para o Museu Vista Alegre e o Museu Marítimo de Ílhavo custa 9 euros)

 

Onde ficar

 

Cestaria
Av. José Estevão, 226 – Costa Nova do Prado
Tel.: 966 330 474
Email: reservas@cestaria.pt
www.cestaria.pt

São dois apartamentos – Ria e Canastra – recentemente recuperados numa casa que foi durante muitos anos a Cestaria Brioso – tema que é recordado em algumas das peças de decoração.

Muito confortáveis, situados em frente da ria, têm dois quartos, uma sala grande com cozinha e duas casas de banho. O projecto de recuperação segue os princípios da Passive House, um conceito de construção eficiente do ponto de vista energético e sustentável.

Durante a época alta (Julho - Setembro) o preço é de  140€/noite (mínimo de estadia de seis noites), durante a época baixa (Outubro - Junho) o preço é de 110€/noite (mínimo de estadia de duas noites).

 

Montebelo Vista Alegre Ílhavo Hotel
Lugar da Vista Alegre
3830-292 Ílhavo
Tel.: 234 241 630; reservas: 232 420 000
montebelovistaalegre@montebelohotels.com reservasmontebelo@montebelohotels.com   

 

Onde comer

Por toda praia da Costa Nova há óptimos restaurantes de peixe. A Fugas jantou na Canastra do Fidalgo, conhecida não só pelas suas especialidades de peixe como pela receita de bolo de bolacha.

Canastra do Fidalgo
Av. José Estevão, 240, Praia da Costa Nova
Tel.: 234 394 859
Preço médio: 25 euros

 

--%>