Depois de duas obras de ficção publicadas através de uma editora, Pedro Moreira decidiu tomar rédeas à edição dos próprios livros de viagem, onde relata as experiências vividas em cada périplo com o mesmo despudor com que as conta no blogue e agora, entre garfadas de almoço num restaurante em Lisboa. Em Angola, por exemplo, trataram-no com tanta hospitalidade que dos 60€ que gastou, apenas 10€ lhe saíram do orçamento. No Gabão, um ronco inesperado no denso da floresta deixou-o petrificado. “Sentia o coração na ponta dos dedos.” Só pensava que ia ser “aquele ‘tuga’ que morreu comido por uma pantera negra”, ri-se. Descobriu depois que o mais provável é ter sido um gorila. Na viagem anterior, acabou detido duas noites no Laos, acusado de crimes que não teria cometido para lhe extorquirem dinheiro. Foi mandado parar 23 vezes pela polícia na Nigéria, acusado de ser terrorista. Na Serra Leoa, teve de fazer jogo de cintura para passar a fronteira sem pagar pelo “favor”. “Não te podes mostrar intimidado mas também não podes ser demasiado cool senão pensam que não os estás a levar a sério. É um equilíbrio desgastante.”
Os encontros, as experiências e as reflexões vividas durante as viagens dão corpo aos livros e ao plano de vida: fazer do ciclo deambulante um emprego a tempo inteiro. Viajar, escrever no regresso, partilhar, partir novamente. “A vantagem de ser um autor independente é que posso fazer exactamente o livro que quero e no final escolher o preço para o público.” Como não partilha o lucro, recebe uma percentagem maior em cada exemplar, conseguindo pedir um valor mais baixo ao leitor. Ganha quem escreve, ganha quem lê. “É a única razão pela qual tenho uma réstia de esperança de viver disto.”
Com o último livro, fez 40 apresentações pelo país. Desta vez gostava de chegar às 100. E ir a mais escolas. “Não vou vender praticamente nada mas sempre pagam a deslocação e falo com miúdos que às vezes precisam de um bocado de inspiração.” Quer mostrar-lhes que não têm de fazer todos as mesmas coisas e que não há problema em cada um seguir o seu caminho. “Às vezes somos um bocado encaixotados e é fixe perceber que podes fazer a tua própria caixa, não precisas de viver na dos outros.”
Resposta rápida
O que leva sempre em viagem?
O computador portátil para escrever. Até para ir ali ao Porto. Nunca se sabe quando é que a vontade ataca.
O que se ganha a viajar sozinho?
A companhia das pessoas que ainda não conhecemos.
O que é preciso ter para se viajar sozinho?
Vontade. Primeiro e acima de tudo. Depois ajuda provavelmente ter alguma inteligência social e emocional, mas são atributos que qualquer pessoa pode ter se se esforçar e prestar atenção.
Se nada fosse impossível, onde gostava de ir?
À criação do universo. É onde vivo e gostava de vê-lo a nascer.