“Baden bei Wien é um lugar agradável para compras e para os amantes da música.”
Pelo pouco que me fora dado a ver, nos minutos que antecederam a minha conversa com Martina Prischmann, sabia que a cidade tinha muito mais para oferecer do que a responsável pelo turismo me fazia crer.
- Sim. Baden bei Wien tem múltiplas facetas, com a particularidade de estar localizada apenas a 26 quilómetros de Viena, no meio de um cenário idílico, numa região soalheira e rodeada de vinhas e de piscinas termais.
Perscrutava Martina Prischmann e, por momentos, acreditava estar na presença de alguém que queria guardar um segredo, revelando-se a pouco e pouco, de forma calculista, como se ela fosse o país, por vezes frio no primeiro contacto com as suas gentes, avançando e travando, nos antípodas da exuberância sulista.
Os números consultados por Martina Prischmann sugeriam ainda mais frieza.
- Entre Janeiro e Dezembro de 2016 tivemos um total de 414 940 pernoitas.
Numa cidade desconhecida de muitos viajantes, ignorada não raras vezes por quem visita Viena, destruída por incêndios e durante as invasões turcas, mais tarde reconstruída no período Biedermeier, parecia-me excessivo, o que não quer dizer que não acreditasse na veracidade da estatística. Simplesmente, queria percebê-la melhor, na sua essência, porque, afinal, não eram assim tantos os turistas que via errar pelas ruas de Baden bei Wien.
- Temos um grande número de visitantes que permanecem em Baden bei Wien durante três semanas para fazerem tratamentos nas fontes sulfurosas. Depois, recebemos também muitos homens de negócios, a maior parte deles durante a convenção no casino. Finalmente, há os turistas que visitam a cidade e as redondezas pelo prazer e outros como complemento a uns dias de férias em Viena.
Baden bei Wien esperava-me. Martina Prischmann, até agora mais informativa do que opinativa, traçava-me um retrato da cidade.
- O que mais aprecio em Baden bei Wien é o carácter e, ao mesmo tempo, a serenidade e a calma. Tem as infra-estruturas de uma grande cidade, um teatro, um casino, museus, hotéis, restaurantes e bares e tem, por outro lado, o Wienerwald, para caminhar e relaxar, e as vinhas, os banhos e os parques.
Tanto para ver.
A cultura da água
Situada no coração dos bosques de Viena, às portas do vale Helenental, rodeada de montanhas e de prados verdes, Baden bei Wien (banhos perto de Viena), com uma toponímia que pretende distingui-la de outras Baden que se plantam no mapa da Europa, é uma cidade que, beneficiando de um clima ameno (na verdade é considerada a região mais quente da Áustria), já era apreciada no tempo do romanos (a quem chamaram Aquae Pannoniae), fortemente atraídos pelas suas águas minerais sulfurosas - no total, são 14 fontes termais com um volume diário de 6,5 milhões de litros, emergindo a água a uma temperatura de 36 graus.
Baden bei Wien integra a lista de Great Spas of Europe, candidata desde o Verão de 2014 a Património da UNESCO, com um total de 11 termas divididas por sete países – as outras são Karlovy Vary, Mariánské Lázne, Františkovy Lázne, todas na República Checa, Spa, na Bélgica, Vichy, em França, Bath, em Inglaterra, Montecatini, em Itália, Baden-Baden, Bad Ems e Bad Kissingen, as três na Alemanha.
O cheiro impregna o ar muito antes de se chegar ao Kurpark – o parque da cura, com as suas termas da época de Marco Aurélio ou Tibério. Passear pelos seus jardins, com os seus passeios largos, é uma sensação agradável que nunca se dissipa, uma tranquilidade que contagia, com detalhes que absorvem a nossa atenção, ora pousando um olhar na estátua de Strauss que parece vigiar os nossos passos, ora na Arena, palco de concertos durante os meses de Verão.
No Kurpark, a história e a natureza caminham de mãos dadas: as suas origens remontam a 1792 (já nessa altura aberto ao público), quando era designado por Theresiengarten, em homenagem à imperatriz Maria Teresa, e está dotado de um conjunto de estátuas que nos recordam alguns dos visitantes célebres de Baden bei Wien ao longo dos tempos. Sem pressas, tanto se está de frente para o imperador Franz Josef, como ao lado do monumento que eterniza o dramaturgo austríaco Franz Grilparzer; tanto se observa a elegante fonte de Undine, rodeada de um mar de flores, como um relógio, também de flores, em funcionamento desde 1929.
Nos meses de Verão, tanto se pode escutar um concerto no pavilhão da música, erguido no início do século passado, como performances de operetta – e subindo ligeiramente, percorrendo um trilho silencioso, chega-se ao Beethoventempel, um templo construído em 1927, por ocasião do centenário sobre a morte do compositor.
Ao fundo, avista-se a cidade, com os seus telhados, o campanário da igreja de Santo Estevão recortando-se no céu, algures a casa onde Beethoven viveu uns anos da sua vida.
A cultura da música
Ludwig van Beethoven gostava de se banhar nas águas de Baden bei Wien, a exemplo do imperador Franz I, que passava os verões com a sua família na cidade. Foi também no Verão, em 1821, que Beethoven alugou uma casa em Baden bei Wien, no número 10 da Rathausgasse, onde compôs partes importantes da nona sinfonia. Admite-se que ao longo da sua existência em Viena, onde passou 35 anos, terá vivido em mais de 60 lugares diferentes, uma instabilidade que se terá ficado a dever às constantes fricções com os vizinhos, provavelmente descontentes com o ruído produzido pelo compositor nascido em Bona, na Alemanha.
Talvez por essa razão, Beethoven alugou o primeiro andar de uma casa cujo rés-do-chão era ocupado por um ferreiro e não consta que alguma vez alguém o tenha importunado nesses três verões (até 1823) que passou em Rathausgasse, actualmente um museu, alvo de renovação em 2004. Há menos tempo, em 2014, as paredes originais do apartamento onde viveu também conheceram obras de restauro e nos dias de hoje o espaço atrai os olhares de quem procura conhecer um pouco mais sobre a vida do génio em Baden bei Wien e arredores.
Na verdade, Beethoven também terá vivido em diferentes lugares de Baden bei Wien desde que visitou pela primeira vez, em 1807, a cidade que continua a atrair a classe alta, agora já sem um título mas beneficiando de todas as comodidades – ou mais sofisticadas ainda do que aquelas de que gozava a elite em tempos de antanho ou homens como Mozart ou Schubert.
Em Baden bein Wien, com as suas ruas pedonais e as suas lojas exclusivas e os seus cafés, ruas que parecem desaguar todas na bonita praça Josefsplatz, Beethoven encontrou paz, procurou beneficiar das qualidades das águas e descobriu, ele que era um entusiástico amante da natureza (a Pastorale não deixa desmentir essa sua atracção), lugares que exacerbavam a sua inspiração, tantas vezes em caminhadas solitárias ao longo de Helenental, o vale onde a cada passo, caminhando por trilhos banhados de quietude, provavelmente escutando o marulhar do rio Schwechat, se vai ae encontro do rico passado da história da região.
E dramático.
Em Mayerling, próximo de Baden bei Wien, deixe-se seduzir pela história do princípe Rudolf, filho único do imperador Franz Joseph I da Áustria e da imperatriz Elisabeth, e da sua amada, a baronesa Mary Vetsera, cujos corpos foram encontrados num lodge de caça na manhã de 30 de Janeiro de 1889 – um acontecimento que provocou desestabilização nas relações entre austríacos e húngaros e conduziu, anos mais tarde, ao assassinato de Franz Ferdinand e da sua mulher, Sophie, em 1914, em Sarajevo, motivando o início da I Guerra Mundial.
A cultura do vinho
De acordo com uma velha lenda, a razão pela qual os austríacos têm vinhas deve-se a um certo comodismo dos romanos. Como carregavam o vinho desde Roma, quando chegavam, já estava azedo, impróprio para consumo – e por isso trouxeram vides para fabricar o seu próprio néctar. Outra tese defende a existência de vinhas nativas e primitivas tão pouco do agrado dos legionários romanos que estes não hesitaram em introduzir novas variedades do sul da Europa, refinando, ao mesmo tempo - e atendendo à época- , todo o processo tecnológico.
Em Baden bei Wien a cultura do vinho perde-se na história da cidade e está fortemente impregnada na vida dos seus habitantes desde tempos imemoriais. A par das águas termais, a produção de vinho sempre foi uma das maiores fontes de rendimento da população local e o primeiro documento que faz referência à existência de vinhedos remonta a 1113, um presente de Markgraf Leopold III ao mosteiro de Klosterneuburg, permitindo a posse de cinco vinhas.
Com o vinho nasceu outra cultura, ainda hoje fortemente implantada no coração dos austríacos – a cultura Heuriger, já desenvolvida no início da Idade Média. Nessas tavernas, nesse tempo distante, cada habitante de Baden bei Wien estava autorizado a servir o vinho que o próprio produzia, «sob o seu próprio fumo», uma expressão que significa na sua própria casa.
De acordo com a tradição, um rapaz, transportando uma vara adornada com uma Föhrenbusch (um ramo de pinheiro silvestre), corria pelas ruas da cidade apregoando o nome do local onde o vinho estava a ser servido – e exibir uma Föhrenbusch é, ainda nos dias de hoje, uma das tradições das Heuriger.
Actualmente, Baden bei Wien conta com uma centena de produtores, beneficiando das condições climáticas para produzirem vinhos de grande qualidade (também da blauer portugieser, uma casta cujas origens, apesar da sugestão bem portuguesa, não estão provadas) num total de 340 hectares e cuja colheita é dividida entre a Badener Winzergenossenschaft, uma cooperativa que celebrará no próximo ano o seu centenário, e as Heuriger.
Para os apreciadores, Baden bei Wien é particularmente atraente em Maio e em Setembro, meses em que decorrem importantes festivais – em meados de Maio os produtores oferecem uma viagem culinária e uma descoberta do vinho no centro da cidade, com provas, delícias da Primavera da cozinha regional, entretenimento e um desfile de mais de uma centena de carros clássicos pela região; já em Outubro, tem lugar o Badener Traubenkur, um evento em que o vinho (neste caso a variedade Gutedel, tanto branco, como tinto) é utilizado para curar (provavelmente uma das mais antigas curas do mundo com fruta), desintoxicando, regenerando e rejuvenescendo o corpo e tornando mais forte todo o sistema imunitário.
O melhor é entrar numa Heuriger. Nem todas estão abertas ao mesmo tempo (há um calendário oficial definindo datas de abertura e encerramento), primeiro tenho de procurar a designação Ausg' steckt is'. Basta-me franquear a porta.
A cultura das rosas
São trinta mil rosas de 800 espécies diferentes – assim se podia definir em poucas palavras o Rosarium, o maior da Áustria. Mas passear por ele, numa manhã de sol, equivale a esquecer os números e a concentrar-se nos aromas, todo um cenário que inspira a poesia e o romance e estimula os nostálgicos. Também as rosas têm, em Baden bei Wien, o seu festival, durante três semanas no mês de Junho (a par de Outubro, o melhor mês para as admirar), mas com ou sem eventos, é sempre – ou pelo menos desde que tenha rosas – um lugar que nos oferece algo de mágico, tão do agrado de todos e mais ainda dos casais de namorados que, por vezes, sentados à sombra de uma árvore, se escondem entre os roseirais, provavelmente com juras eternas de amor.
Criado na década de 1960 (mas alvo de grandes obras de renovação há quatro anos), o Rosarium ocupa uma área que se estende ao longo de 90 mil metros quadrados, dentro do soberbo Doblhoff Park, com um lago por onde os patos se passeiam, um elegante café e uma esplanada, com as suas fontes, os seus trilhos ao lado dos quais corre água límpida e um parque infantil que atrai desde logo o olhar das crianças.
Em Outubro, Baden bei Wien hiberna, acompanhando o ciclo das rosas. Não deixa de ter encanto e ganha em serenidade. O cheiro a enxofre das águas impregna a atmosfera e durante meses vence o aroma do vinho e das rosas. É uma boa altura para compras e para os amantes da música deixarem os seus passos percorrer as ruas silenciosas. Até ao momento em que, imitando a realeza, nos primeiros dias de Junho e até finais de Setembro, uns 200 mil se instalam e se sentem inebriados com os odores da natureza, jogando com a beleza da paisagem.
Guia Prático
Como ir
A TAP tem voos directos entre Lisboa e Viena com uma tarifa a rondar os 400 euros (ida e volta). Há alternativas, todas elas sujeitas a uma escala, com a Lufthansa, a Swiss, entre outras. Desde a capital austríaca, é possível utilizar o eléctrico (Badner Bahn) para chegar a Baden, um trajecto que se cumpre em 60 minutos. O serviço entre a Ópera de Viena e a Josefsplatz, no centro de Baden, é frequente de segunda a sábado (de 15 em 15 minutos entre as 05.00 e as 22.00 horas) e o preço do bilhete é de 5.50 euros. Por apenas mais 20 céntimos, também pode recorrer ao Casino Bus (nº 360), que sai igualmente da Ópera e tem a sua última paragem, ao fim de 40 minutos, em Rosarium (Station Petzgasse). Dispõe igualmente de comboios locais e regionais e, caso alugue carro, deve seguir a A2 até encontrar a indicação de Baden e Zentrum.
Quando ir
A Primavera e o Outono são as melhores estações do ano para visitar Baden bei Wien. No Verão, a despeito do aumento do número de turistas, não deixará de viver dias tranquilos nesta cidade austríaca que também produz grande encanto junto do visitante nos meses de Inverno (especialmente entre meados de Novembro e finais de Dezembro, com actividades ligadas ao período natalício, como concertos, fogo-de-artifício e procissões), também muito por culpa da habitual queda de neve nesta época.
Onde dormir
Hotel Pension Rauch
Pelzgasse, 3
00 43 2252 44561
Localização central, atmosfera tranquila e dispondo de um jardim, o Hotel Pension Rauch é uma das opções mais económicas em Baden bei Wien, com duplos a partir dos 37 euros.
Gasthof Pension Gustav Martinek
Jägerhausegasse, 7
00 43 664 1316 040
www.gasthofmartinek.at
anfrage@gasthofmartinek.at
Quartos simples mas limpos (tarifa para um duplo a partir dos 46.50 euros) e uma atmosfera familiar, com a vantagem de dispor também de um restaurante no rés-do-chão que serve refeições generosas e bem confeccionadas a preços em conta.
At the Park Hotel
Kaiser Franz-Ring, 5
00 43 2252 44386
www.atthepark.at
office@thepark.at
Para um pouco mais de luxo, este hotel de quatro estrelas é um dos mais recomendáveis em Baden bei Wien, com preços para um duplo entre os 142 e os 162 euros (o pequeno-almoço não está incluído e custa 17 euros mediante reserva).
Onde comer
Restaurant Akropolis
Helenenstrasse, 40
00 43 2252 909594
www.akropolis-baden.at
akropolis-baden@aon.at
Restaurante grego mas com um toque das cozinhas turca, árabe e italiana, bem como uma extensa lista de vinhos de qualidade. Quer opte por peixe, carne de porco ou de borrego, algumas das especialidades do Akropolis, certamente que não ficará desiludido.
Amterl
Hauptplatz, 2
00 43 2252 45953
www.amterl.at
anfrage@amterl.at
Para quem deseja provar um pouco da gastronomia austríaca, o Amterl é uma das melhores alternativas, com hambúrgueres e bifes (Angus) mas também com um menu do dia, entre segunda e sexta, por menos de dez euros (não inclui bebidas).
El Gaucho
Josefsplatz, 2
00 43 2252 80399
www.elgaucho.at
steakhouse@elgaucho.at
Ainda melhor, para os apreciadores de carne, este restaurante (há outros da mesma cadeia em Viena, Graz e Munique) destaca-se pela excelência dos grelhados, entre eles um bife de chorizo ou mesmo (para quem for capaz) um bife Tomahawk (750 gramas), com preços entre os 17 e os 47 euros.
A visitar
Há alguns museus interessantes em Baden bei Wien, desde logo o Arnulf Reiner, uma mistura do esplendor arquitectónico das termas para mulheres (frauenbad) e a obra do artista mundialmente famoso. Não deixe também de visitar a Kaiserhaus Baden, na Hauptplatz, 17, o museu das bonecas e dos brinquedos (especialmente do agrado das crianças), bem como o Rolletmuseuem, o mais antigo da Baixa Áustria, que abriga a única autêntica máscara mortuária de Napoleão, a colecção de crânios do anatomista Franz Joseph Gall e uma múmia egípcia.
Informações
Os cidadãos portugueses apenas necessitam de um documento de identificação (passaporte, bilhete de identidade ou cartão de cidadão) para visitar o país.
A moeda é o euro.
A língua oficial é o alemão mas não terá problemas, em Baden bei Wien e um pouco por todo o país, em encontrar quem domine o inglês.