Fugas - Vinhos

  • António Carrapato
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10 enólogas: Sandra Gonçalves (Dona Maria)

Por Pedro Garcias

Há pessoas que, pela sua influência, nos determinam o futuro. Mas é menos comum que seja um dicionário a ditar uma carreira. Porém, foi exactamente isso que aconteceu com Sandra Gonçalves, de 35 anos, enóloga responsável pelos vinhos Dona Maria, herdeira da antiga Quinta do Carmo, em Estremoz.

Quando chegou a hora de concorrer à universidade, Sandra Gonçalves ponderou alguns cursos da área de ciências e reparou num que não sabia muito bem o que queria dizer. Era enologia. Estávamos em 1994, Sandra vivia em Odivelas e não tinha qualquer ligação ao vinho. Foi ao dicionário e viu que "a definição era espectacular", lembra. E concorreu à Universidade de Trásos-Montes e Alto Douro, em Vila Real, a instituição de onde saiu a geração de enólogas e enólogos que tem vindo a mudar o panorama dos vinhos em Portugal.

Os dois primeiros anos confirmaram as suas melhores expectativas e no terceiro ano teve o primeiro confronto a sério com a profissão, quando foi fazer um estágio na Quinta da Romeira, em Bucelas. "Foi um teste à nossa capacidade, porque se trabalhava mais de 12 horas por dia e o engenheiro Cancela de Abreu [o enólogo responsável] era muito exigente", recorda. Quando acabou o estágio, Sandra disse para si: "Seja bom ou não, tenho a certeza que é isto que quero para a minha vida".

As certezas aumentaram no estágio de final de curso, realizado na Quinta do Vallado, no Douro - "Uma experiência extraordinária", confessa -, e durante o ano que trabalhou com Cristiano Van zeller e Sandra Tavares da Silva na Quinta do Vale D. Maria. "Gostei muito, mas tinha 26 anos e queria aprender mais e, para isso, precisava de trabalhar noutra casa maior", recorda.

Surgiu-lhe então a hipótese de ir trabalhar para Cortes de Cima, no Alentejo. "Hans Kristian Jorgensen [o proprietário] é um visionário, a casa produz vinhos mais comerciais mas em grande quantidade, e essa experiência foi muito importante para mim", conta.

Entretanto, Sandra apaixonouse por um alentejano, enólogo na Quinta do Mouro, em Estremoz, e a sua vida voltou a dar outra volta. A certa altura, o enólogo Luís Duarte - "pessoa a quem estarei eternamente grata" - sugeriu o seu nome a Júlio Bastos, que, depois de vender a marca Quinta do Carmo, estava a começar a reerguer a lendária propriedade sob o novo nome Dona Maria. Júlio Bastos vendeu a marca, hoje na posse da Bacalhôa Vinhos, mas manteve a Quinta do Carmo, uma belíssima casa apalaçada do século XVIII situada a um quilómetro de Estremoz. Plantou vinhas novas e comprou uma vinha velha, com cujas uvas eram feitos os vinhos de Alicante Bouschet antigos e que deram fama à casa e à região.

Luís Duarte era o consultor e, em 2003, Sandra Gonçalves entrou como enóloga residente. Em 2005, Luís Duarte saiu e Sandra passou a assumir a direcção da enologia da casa, que volta a estar na ribalta. Os vinhos são cada vez melhores. "Os antigos Quinta do Carmo estão agora extraordinários, mas nos primeiros cinco anos eram imbebíveis, tinham muita extracção e concentração. A ideia do Júlio é pegar no perfil dos vinhos antigos e torná-los modernos", explica, dando como exemplo o vinho Júlio Bastos Alicante Bouschet Garrafeira 2004, o seu preferido. "O vinho não envelhece na garrafa, continua com aromas fantásticos. É muito grosso e os taninos estão muito presentes, duros mas ao mesmo tempo redondos, se é que se pode dizer isto".

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