Os vinhos brancos do Dão estão na moda e a culpa é do Encruzado
Carlos Lucas | Quinta de Cabriz
Formou, juntamente com Casimiro Gomes o núcleo duro que ajudou a fundar a Dão Sul, o embrião daquele que é hoje um dos grandes grupos do sector vitícola nacional, a Global Wines, detido maioritariamente pelo empresário Joaquim Coimbra. Com a saída de Casimiro Gomes, Carlos Lucas passou a ser o rosto principal do projecto, acumulando a condição de administrador e enólogo principal do grupo.
Lucas é o que se pode chamar um homem do mundo. Natural de Carregal do Sal, onde vive, formou-se no Instituto Politécnico de Bragança e faz vinhos no Brasil, Priorato (Catalunha) e em quase todas as regiões portuguesas. Mas é ao Dão que se sente mais ligado. E é também aqui que produz, como enólogo principal da Global Wines, vinhos brancos e tintos de excelência.
Se tivermos que elaborar uma lista com os melhores vinhos brancos do Dão, é obrigatório incluir uns quantos a que Carlos Lucas está ligado. E em todos, a casta predominante é o Encruzado. À cabeça, surgem os fantásticos Paços dos Cunhas de Santar Vinha do Contador e o Condessa de Santar, dois vinhos de produção limitada que merecem passar uns bons anos na garrafeira antes de serem bebidos. Logo a seguir vêm o Quinta de Cabriz Four C e o Quinta de Cabriz Encruzado, dois brancos que passam também pela madeira e que, sobretudo o primeiro, precisam igualmente de tempo para mostrar todo o seu potencial.
Álvaro de Castro | Quinta da Pellada
De estilo desprendido, tipo "soixante-huitard " urbanocampesino, mas com costela aristocrática, Álvaro de Castro foi e é uma bênção que aconteceu ao Dão. Formado em Engenharia Civil, este produtor herdou a Quinta da Pellada em 1980 e passou a dedicar-se a ela a tempo inteiro, retomando a tradição vitivinícola familiar. O seu primeiro vinho saiu em 1989 e, desde então, tem vindo a construir um portefólio de marcas que o situam no galarim dos melhores produtores da região e até do país.
A sua afirmação e ascensão no sector foi meteórica, ao ponto de ser hoje um dos produtores portugueses mais reconhecidos e aclamados internacionalmente. Com várias quintas, começou por se distinguir na elaboração de tintos. Hoje, alguns desses vinhos, como o Pape, o Quinta da Pellada ou o Carrocel, são do melhor que se produz no Dão.
Mas é nos brancos que, nos últimos anos, Álvaro de Castro mais se tem distinguido. O topo de gama é o Quinta da Pellada Primus, um vinho onde onde o Encruzado emparceira com várias castas de vinhas velhas. Coisa séria, um dos grandes brancos portugueses. Mais recentemente, criou para a Lusovini o Quinta de Pinhanços Altitude, feito só de Encruzado e com intervenção mínima de madeira. E tem ainda o Quinta de Saes Reserva, lote de Encruzado (80 por cento) e Cercial e que é o espelho do classicismo virtuoso dos vinhos brancos do Dão feitos por Alberto Vilhena no Centro de Estudos de Nelas. Vinhos com grande acidez e volume alcoólico adequado, requisitos essenciais para poderem durar muitos anos, e que Álvaro de Castro, criado com essas referências, tem procurado emular. E com sucesso, diga-se.
João Paulo Gouveia | Casa de Mouraz
Professor no Instituto Politécnico de Viseu, João Paulo Gouveia é um dos mais profundos conhecedores das castas, solos e especificidades regionais das vinhas e dos vinhos do Dão. Acumula o conhecimento científico com o saber tradicional e a experiência de produtor.
Tem o seu próprio vinho, o Pedra Cancela, e está ligado como consultor, através da empresa Vines & Wines, a vários projectos da região, alguns dos quais relativamente novos. Alguns dos mais excitantes vinhos brancos do Dão da actualidade têm a sua chancela, a começar pelo seu Pedra Cancela, feito com Encruzado e Malvasia.
Mas os mais aclamados, e justamente, a que também está ligado como consultor são os brancos Julia Kemper e Casa de Mouraz. O primeiro repete a mesma combinação do Pedra Cancela, clássica no Dão, fermenta parcialmente em madeira e distingue-se pelo seu carácter seco e mineral e aroma floral delicado. É um dos vinhos do portefólio da Niepoort Projectos. O segundo é 100 por cento Encruzado e é proveniente de vinhas de agricultura biológica, o que ajuda a explicar a incrível sensação de pureza que se sente na prova de boca.
Manuel Vieira | Quinta dos Carvalhais
Responsável máximo pela Quinta dos Carvalhais, da Sogrape, Manuel Vieira é um dos grandes enólogos do Dão. É também um dos que mais têm feito pelo ressurgimento dos seus vinhos brancos (e dos tintos também), depois de uma fase de definhamento que se seguiu às experiências levadas a cabo nas décadas de 60 e 70 do século passado por Alberto Vilhena, no Centro de Estudos de Nelas. A grande longevidade desses vinhos tornou-os lendários e tem servido de inspiração a muitos produtores e enólogos.
Adquirida pela Sogrape em 1990, a Quinta dos Carvalhais manteve-se fiel às castas e ao estilo dos vinhos do Dão. Desde o início que, em relação aos brancos, a aposta nas novas plantações incidiu sobre a casta Encruzado e, em menos escala, na Bical, na Malvasia Fina, no Cerceal e no Verdelho. O Encruzado é, de resto, a variedade que predomina em todos os vinhos brancos produzidos na quinta. Desde os Quinta dos Carvalhais Colheita Tardia aos brancos tranquilos Duque de Viseu e Quinta dos Carvalhais Colheita Seleccionada. E é também de Encruzado o único branco monovarietal da Quintas dos Carvalhais.
Tanto no Colheita Seleccionada como no Quinta dos Carvalhais Encruzado, Manuel Vieira privilegia o perfil clássico da casta, respeitando a sua austeridade aromática e fugindo de um estilo a que chama "sauvignonzesco", que tem sido seguido por alguns produtores, para, tropicalizando o aroma dos vinhos, os tornar mais apetecíveis em novos. Tirando partido do equilíbrio enológico do Encruzado, da sua mineralidade e acidez e da sua fantástica empatia natural com a madeira, Manuel Vieira tem conseguido fazer vinhos muito harmoniosos e elegantes que podem ser bebidos com grande prazer em novos e que dão garantias de envelhecer muito bem.