Não, a cor laranja não tem nada a ver com qualquer tendência política influenciada pelos resultados das recentes eleições. Na hora de escolher um vinho, independentemente das inclinações políticas pessoais, a primeira variável a ter de ser negociada é a cor do vinho, entre branco, tinto ou, para os mais afoitos, rosado, as tonalidades de vinho de sempre. Mas, e que tal se às cores tradicionais do vinho se juntasse agora uma coloração pouco habitual, os vinhos de matiz alaranjada? Os vinhos alaranjados representam um estilo muito particular dentro do capítulo dos vinhos brancos, exibindo um carácter, filosofia e pigmentação que os situam numa classe à parte. São vinhos que significam uma forma de reinterpretação da imagem de pureza do passado, desenhados segundo uma visão do vinho que se manifesta simultaneamente moderna e classicista, rejuvenescendo e adoptando algumas das técnicas empregues no passado.
Porque, convém não o esquecer, durante milhares de anos, antes que as práticas rotineiras da enologia moderna tivessem nascido, os vinhos brancos apresentavam-se num estilo substancialmente diferente da actualidade, sem a fruta e limpidez de aromas que a maioria dos brancos correntes de hoje beneficia... mas também sem o grau de artificialidade e de falta de carácter que corroem tantos dos vinhos brancos de hoje. Até há bem poucos anos os vinhos brancos estavam dispensados do actual regime férreo das fermentações a baixas temperaturas, sujeitos a ambientes oxidativos em lugar do ambiente redutor a que são constrangidos no presente, submetidos a macerações prolongadas com as películas, isentos das filtrações e restantes suavizações a que os vinhos brancos contemporâneos são subordinados.
Nos vinhos alaranjados a palavra mágica é mesmo o termo maceração, o período de tempo em que as cascas das uvas, as películas, são deixadas em contacto directo com o mosto e o vinho feito. Na larguíssima maioria dos vinhos brancos as macerações são quase inexistentes, ou, quando se proporciona tal contacto, raramente ultrapassam os períodos de poucas horas, raramente se aproximando das 24 horas de contacto. No caso dos vinhos alaranjados, a promiscuidade entre uvas e películas pode estender-se por dias, semanas, ou, nos casos mais extremos, por vários meses de amiganço.
Ora sabendo-se que são as películas das uvas a conter a pigmentação, bem como os taninos, isso implica que os vinhos elaborados com recurso a estas macerações prolongadas resultam mais escuros que os vinhos brancos "normais", com os laivos alaranjados ou apetrolados que os caracterizam. Significa igualmente que a textura do vinho será substancialmente diferente dos brancos clássicos, muito mais cheia e pungente, mais gorda e substancial, mais taninosa e austera, sem as finuras e diplomacias que a maioria dos vinhos brancos estampa.
São muitas vezes descritos como sendo vinhos oxidados, apesar de a afirmação raramente ser acertada. São, sim, elaborados num estilo oxidativo, o que, apesar das semelhanças semânticas, está longe de ser o mesmo.