Fugas - Vinhos

Carlos Lopes

Blandy, dois séculos na ilha a vender vinho Madeira

Por Pedro Garcias

Os Blandy chegaram à Madeira em 1808 e, três anos depois, começaram a exportar vinho. Duzentos anos depois, a família inglesa é, de todos os fundadores do comércio de vinho, a única que se mantém no negócio e que continua a viver na ilha. Uma odisseia celebrada com uma monumental prova de vinhos de dois séculos que Pedro Garcias garante que não esquecerá tão cedo.

Em Março de 2008, Alberto João Jardim fez uma pausa na velha “guerra” com os Blandy, a única família britânica que conseguiu resistir à “nacionalização” da ilha imposta por Alberto João Jardim desde que chegou ao poder, e participou na reinauguração das caves da Madeira Wine Company, no Funchal. Depois de baptizar um tonel de vinho, o governante deixou a promessa: “Em 2011, haverá duas celebrações importantes: comemoram-se os 200 anos da chegada da família Blandy à Madeira e celebra-se a minha saída do Governo. E garanto-vos que me vou divertir muito mais do que os Blandy.”

Alberto João Jardim não cumpriu a promessa. Voltou a candidatar-se e anda a fazer tudo para se manter no Governo e continuar a sua cruzada contra os “cubanos” e “bastardos” do continente e os ingleses “colonialistas” da Madeira, precisamente os Blandy, com quem está hoje em confronto total, por causa do jornal Diário de Notícias da Madeira, propriedade daquela família e muito crítico da gestão jardinista. E mesmo que seja reeleito não terá motivos para se divertir, porque lhe vai faltar dinheiro.

Em contrapartida, os Blandy atravessam um bom momento financeiro, com activos importantes na hotelaria (cadeia Porto Bay, entre outros), viagens e navegação e imobiliário. Neste Verão, compraram parte da posição da Madeira Wine Company que, em 1989, tinham vendido ao grupo Symington, reassumindo o controlo da empresa (os Symington reduziram a sua participação de 50 para 10%, mas continuam a distribuir os vinhos).

E, no último fim-de-semana Setembro, com o negócio do vinho de novo nas suas mãos, celebraram em grande o bicentenário da chegada da família à ilha. Na sexta-feira, reuniram dezenas de jornalistas e compradores nacionais e estrangeiros no Funchal para uma extraordinária prova de 12 vinhos Madeira dos últimos dois séculos. No dia seguinte, juntaram a família e alguns convidados e foram até São Jorge vindimar e pisar uvas. Até um bebé de fraldas, o mais novo dos Blandy, entrou no lagar, num momento de festa e de iniciação: é assim que se começa a envolver as novas gerações no negócio do vinho.

A produção e comercialização de vinho Madeira já não é o principal activo da família Blandy, mas continua a ser o mais emblemático. Foi como exportador de vinho e comerciante que, em 1811, John Blandy começou o negócio da família na ilha, três anos depois de ter chegado à Madeira, atraído pelo clima da ilha, que acreditava ser bom para os seus problemas de saúde. O negócio seria depois continuado pelo seu filho Charles Ridpath Blandy, que, na sequência da praga de oídio de 1852, tomou a decisão de comprar uma grande quantidade de vinhos velhos da ilha, a qual se viria a revelar vital para a sobrevivência da empresa.

Em 1840, Charles já tinha comprado as Adegas de São Francisco, no Funchal, onde hoje funcionam as Blandy Wine Lodges, que são visitadas anualmente por 200 mil pessoas e onde continuam a ser envelhecidos os melhores vinhos da empresa. Em 1925, os Blandy voltaram a tomar uma decisão crucial, ao juntarem-se à Madeira Wine Association. Formado por várias empresas exportadoras, este grupo conseguiu resistir às quebras acentuadas de vinho Madeira registadas após a I Guerra Mundial e agravadas com a Grande Depressão de 1929. No último quartel do século passado, a família Blandy já era, de todos os fundadores do comércio do vinho Madeira, a única que continuava a gerir a sua própria empresa e a viver na ilha.

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