Fugas - Vinhos

Francisco Ferreira (Vallado), Dirk Niepoort (Niepoort), Tomás Roquette (Crasto), Cristiano Van Zeller (Vale D. Maria) e Francisco Olazabal (Vale Meão)

Francisco Ferreira (Vallado), Dirk Niepoort (Niepoort), Tomás Roquette (Crasto), Cristiano Van Zeller (Vale D. Maria) e Francisco Olazabal (Vale Meão) Paulo Ricca

Do sucesso dos Douro Boys

Por Rui Falcão

Por que estará na moda desvalorizar o trabalho notável e pioneiro que os Douro Boys edificaram no Douro? Por que será que continuamos enquanto sociedade a repudiar o sucesso alheio?

Como é impertinente e arrevesada a mentalidade clássica portuguesa, sempre predisposta a denegrir e a desdenhar sobre tudo o que aparente ser sucesso alheio, sempre pronta a detrair o sucesso dos outros! Continuamos, infelizmente, a conviver numa sociedade que prefere valorizar a inveja inconsequente e leviana, aqui e ali entremeada pela intriga, preferindo a crítica fácil ao trabalho, desconfiando e desvalorizando de qualquer possível êxito e de quem se predispôs a fazer diferente, de quem se propôs inovar e trabalhar.

Gostamos de acarinhar os diferentes projectos aquando da sua nascença, enquanto estes são pequenos, frágeis e inseguros, para logo passar a uma fase de reprovação activa, sempre que os mesmos projectos prosperem e comecem a apresentar sinais de sucesso. O sentimento está tão profundamente enraizado na sociedade portuguesa que, por diversas ocasiões, quase parece que o desejo de insucesso alheio se sobrepõe à ambição de conquistar um sucesso próprio!

O mundo do vinho não consegue fugir a esta sorte da cultura portuguesa. Aqui, como em tantos outros campos da sociedade, o sucesso é recebido com frieza e sem alegria, atiçando sinais de desconforto. Basta olhar para uma das tendências mais recentes do meio enófilo nacional, perceptível tanto entre produtores como em líderes de opinião e nos meios enófilos mais entusiastas, a propensão para uma crítica crescente e absolutamente irracional sobre o grupo intitulado Douro Boys, uma associação informal que reúne cinco dos mais conceituados produtores do Douro sob o propósito de promover em conjunto os vinhos das cinco quintas. Uma associação que tem feito mais pelo Douro e pelos vinhos portugueses que muitas campanhas oficiais pagas com o erário público.

É que, num país tão habituado a subsídios e privilégios, numa sociedade tão habituada a mendigar por benesses, subvenções e auxílios do estado, os Douro Boys são uma saudável e salutar excepção, não reclamando por qualquer ajuda ou patrocínio dos dinheiros públicos, vivendo de um esforço financeiro individual, sem desbaratar um cêntimo do dinheiro dos contribuintes. Porém, e apesar do tremendo esforço financeiro pessoal a que são obrigados, os Douro Boys não se entretêm somente a promover os vinhos dos cinco associados, dos que pagam as contas, convidando regularmente outros produtores para as suas provas. É todo o Douro que é promovido, é toda uma região que ganha em reconhecimento, é todo um país que ganha em imagem. Directa e indirectamente, todo o sector do vinho beneficia da acção conjunta dos Douro Boys.

Tudo começou por mero acaso. Antes de serem uma associação, antes de serem uma sociedade com objectivos comuns, os Douro Boys já constituíam um grupo de velhos amigos, em alguns casos ligados por diferentes graus familiares. Ao invés de concorrer entre si de forma irracional, os Douro Boys optaram por coordenar esforços, por trocar experiências e práticas, por partilhar segredos e amizades, cooperando de forma leal num empenho comum de promoção dos seus vinhos e da sua região, o Douro. Quinta do Vallado, Niepoort, Quinta do Crasto, Quinta Vale D. Maria e Quinta do Vale Meão uniram esforços nesta aventura dos Douro Boys.

Visão e convicção é coisa que não falta aos cinco membros dos Douro Boys. A visão de repartir custos e a convicção de potenciar a visibilidade... mas também a visão liberal de promover uma região para além dos vinhos de cada membro. A visão de saber que juntos conseguem apresentar uma enorme variedade e diversidade, alargando a oferta e reforçando o poder de atracção. A convicção de persuadir os jornalistas nacionais e internacionais a visitar o Douro, a conhecer a região, a perceber a monumentalidade e as condicionantes do Douro. A visão de não ficar parado à espera do reconhecimento alheio, na expectativa vã que seja o mundo a vir até nós. A capacidade para entender que é imprescindível conhecer e aparecer em cada mercado, avaliar a realidade local, perceber os gostos e ambições de cada mercado, conhecer as pessoas e dar a conhecer os vinhos. A convicção de promover, promover, e continuar a promover sem interrupções e sem cansaço os vinhos portugueses. A visão de saber que não há mercados irrelevantes. A visão de colocar os seus vinhos em prova cega em contraponto aos melhores vinhos do mundo, sem receio de comparações, alertando para a qualidade dos vinhos durienses.

Pensem no nome de qualquer grande jornalista nacional e internacional, directamente ou por interposta pessoa, pensem no nome de qualquer crítico, comprador, importador ou simples entusiasta, e sabem que ele esteve, está ou vai estar brevemente no Douro! Muito provavelmente percorrendo uma ou várias das quintas dos Douro Boys. O Douro hoje entrou na rota de peregrinação do jornalismo internacional. Goste-se ou não, faça comichão a algumas pessoas ou não, a razão para tamanha visibilidade deve-se às casas de Vinho do Porto... e aos Douro Boys.

Acima de tudo, não se pense que nos Douro Boys tudo é fácil e que caiu de mão beijada, que os cinco produtores são um grupo de amigos ociosos e abastados, abençoados desde a nascença e a quem o destino estava traçado. Não se assuma que o sucesso caiu do céu, sem trabalho, sem risco e sem mérito! O esforço de promoção constante realizado pelos Douro Boys implica muito trabalho e sacrifícios pesados, implica custos financeiros elevadíssimos, implica reinvestir tudo no vinho, implica abdicar de uma grande parte da vida familiar. Muito mais que uma vida de glamour ou de passeios hedonistas, implica viajar em trabalho incansavelmente por todo o mundo, implica conduzir centenas de apresentações anuais de vinhos, em casa e todos os lugares imagináveis do mundo. Implica ter de acompanhar diariamente jornalistas, compradores ou simples visitantes de todo o mundo, implica ter convidados diários ao almoço e jantar, sem tempo para a família, implica um esforço de tempo, vontade e capital que obrigam a uma dedicação integral e quase obsessiva.

O sucesso raramente nasce do acaso!

--%>