Para um país que reclama para si uma história rica e longa, que reivindica uma tradição vinícola forte e duradoura, não deixa de ser impressionante a apatia que evidencia e o distanciamento que manifesta face ao mundo rural, deleitando-se face à perspectiva de beber uma boa garrafa de vinho mas continuando a estranhar e a esquecer a origem, quem fez o vinho e porque o fez assim, quais as vinhas onde nasceu, a filosofia do produtor, os condicionantes e as características que guiaram o vinho para exibir este perfil.
Por outras palavras, desconhecemos ou raramente revelamos interesse pela origem do vinho, desaproveitando uma das formas mais interessantes de fazer turismo dentro e fora de fronteiras, o turismo vínico, aquilo a que se convencionou designar como enoturismo.
Não caia no erro de acreditar que o enoturismo é uma coisa fechada e de interesse restrito para aqueles que estão apaixonados pelo vinho ou que com ele mantêm uma relação muito próxima, de quem sabe muito e se interessa intimamente pelo tema.
Não, o enoturismo representa um tipo de turismo que não só está ao alcance de todos como poderá servir de pretexto para excelentes momentos de lazer, momentos de tranquilidade e serenidade que lhe permitirão descobrir gentes, arquitectura, gastronomia e paisagens impressionantes, mesmo para aqueles a quem o vinho os deixa indiferentes.
Não pretende ser uma forma de catequização ou de conquista de simpatizantes para a causa do vinho mas sim uma forma educada e alternativa para conhecer um Portugal mais profundo, por vezes rural, por vezes mais erudito, por vezes simples, por vezes mais sofisticado.
Porque são tão poucos os portugueses a deixar-se embalar nos encantos do enoturismo é um dos grandes mistérios nacionais. Se em países como a África do Sul, Austrália ou Argentina a ideia de uma escapadela para visitar adegas é trivial, em Portugal continuamos visceralmente arredados desse hábito.
Se em regiões tão famosas como Napa Valley, na Califórnia, Toscana, Rioja ou Catalunha o enoturismo constitui hoje uma das fontes mais relevantes de receitas para o turismo da região e para os produtores envolvidos, em Portugal esta é uma realidade que continua irremediavelmente afastada do horizonte.
O que poderá afastar os portugueses de visitar as regiões portuguesas, sobretudo quando a maioria delas se situa tão próximo dos principais centros urbanos nacionais, como o Douro e o Vinho Verde do Porto, a Bairrada e o Dão de Coimbra, Lisboa, Tejo, Setúbal e o Alentejo de Lisboa?
O que poderá afastar os portugueses de visitar as regiões nacionais do continente e ilhas, quando a maioria se situa em paisagens de incrível beleza e a oferta é tão diversificada? Muito provavelmente desconhecimento de como estas visitas poderão ser tão motivadoras e interessantes. A escolha é tão diversificada que o único obstáculo passa pela dificuldade na selecção e perfil dos produtores e locais a visitar.
Prefere explorar um produtor maior e mais organizado, com um percurso definido, uma abordagem profissional, horários programados e visitas guiadas, provavelmente adaptáveis a várias línguas, ou prefere aventurar-se na visita a um produtor sem estrutura montada, onde possivelmente será recebido pelo proprietário de forma genuína mas sem roteiro planeado, deixando-o um pouco à mercê da disponibilidade desse dia? Qualquer uma das opções é válida e tem valia, dependendo a resposta do perfil de cada visitante.
Seja qual for o destino e o estilo que privilegie, deverá ter o cuidado de seguir algumas regras elementares no contacto e visita aos produtores. A mais importante, e a não descurar, é a obrigatoriedade de marcar as visitas previamente.
A maioria dos produtores, sobretudo dos pequenos, não dispõe de uma estrutura humana permanente que lhes permita atender visitas imprevistas, o que poderá resultar no embaraço de encontrar portas fechadas, sobretudo ao fim-de-semana, ou, no caso dos produtores mais solicitados e com visitas organizadas, na impossibilidade de receber visitantes por se encontrarem com marcações completas. Não custa nada entrar em contacto com antecedência para combinar e agendar uma visita, podendo por regra contar com o apoio das comissões vitícolas locais nesta tarefa.
Se está a pensar na visita como um mero expediente para comprar vinho mais barato, beneficiando de preços mais agradáveis que os praticados em grandes superfícies ou garrafeiras, vai ficar desapontado.
Poderá e deverá beneficiar de uma pequena atenção no preço, poderá descobrir algumas colheitas que não conseguiu encontrar no mercado, poderá mesmo desencantar alguns vinhos do passado, mas por regras contratuais a maioria dos produtores está obrigada a vender os vinhos à porta da adega aos mesmos preços a que são vendidos nas prateleiras, de modo a não furar e desvirtuar o papel dos distribuidores. Não encare as visitas como um negócio mas sim como uma forma de conhecer por dentro as histórias e segredos do vinho.
E finalmente a questão inevitável, que muitos consideram mas que poucos se atrevem a formular, a eventual obrigatoriedade de comprar vinho no final de uma visita, lançando dúvidas sobre qual a etiqueta correcta nas visitas a produtores, admitindo uma eventual imposição moral de ter de comprar pelo menos uma garrafa no final da visita. Não, não há qualquer obrigatoriedade de compra nem nenhum constrangimento caso ela não se proporcione, embora a maioria, como é natural, aprecie o gesto.
Aproveite o vinho para viajar e provar.