Quais as razões que o levam a escolher um vinho em detrimento de outro? As respostas serão seguramente múltiplas e divergentes dependendo do estado de espírito, da época do ano, das diferentes influências culturais, do poder aquisitivo, do conhecimento e sensibilidade pessoal ou de muitas outras variáveis que nem sempre conseguimos conter de forma objectiva.
O produtor, o preço, a notoriedade da marca, a curiosidade, o prestígio da região, o impacto das operações de marketing da empresa e de eventuais promoções comerciais ajudam e influenciam a decisão. Mas o rótulo, a qualidade da vestimenta, o uso de diferentes cores e tonalidades, o tipo de letra e formato influenciam e destacam a imagem transmitida. O impacto visual provocado pelo rótulo faz parte dos factores de decisão mais importantes, verdadeiros detonadores do impulso da compra.
Poucos produtores se podem dar ao luxo de desprezar a imagem ou a qualidade dos rótulos, sentindo-se obrigados a investir somas e recursos avultados na criação de rótulos apelativos, imagens atraentes que ajudem a determinar o posicionamento do vinho no mercado. Ou, talvez de forma mais honesta, todos os produtores deveriam expressar essa preocupação estética e criativa... embora, a ajuizar pelo larguíssimo conjunto de extravagâncias visíveis nas prateleiras de qualquer supermercado ou garrafeira, nem todos expressem esta preocupação.
Goste-se ou não, o rótulo representa o rosto visível do vinho, o primeiro e decisivo impacto junto do consumidor. Um impacto que surge ainda antes do momento da prova, antes de aferir a qualidade do vinho. O rótulo compõe a primeira impressão, a primeira razão de ser para que a garrafa saia da prateleira… ou lá permaneça para sempre. Para um produtor representa a primeira oportunidade de venda, a possibilidade de criar um conceito de branding, a ocasião de idealizar uma ferramenta que permita estabelecer uma imagem de marca de reconhecimento intuitivo.
Os rótulos vivem sob uma realidade singular que exige uma linguagem própria, um discurso original e uma preocupação estética que consiga cumprir e integrar os objectivos comerciais com os requisitos legais castradores mas obrigatórios. Uma linguagem que é ao mesmo tempo complexa e sintética, capaz de harmonizar os expedientes do texto e da imagem, da grafia e da cor, dos argumentos promocionais e do estético, do que é afirmado taxativamente… e do que fica insinuado.
Um bom rótulo funciona simultaneamente como retrato do quotidiano, espelho da sociedade, reflexo de tendências e estilos, mostruário activo de cada época e cultura. Os rótulos podem fazer-nos partilhar da sua alegria contagiosa, considerar a sua elegância, apreciar o seu lirismo, admirar a sua subtileza, maravilhar com a sua astúcia ou rir com a sua ingenuidade. Tudo dependerá do engenho e competência de quem o desenhou e da capacidade de transmitir a mensagem que o produtor idealizou.
Os rótulos proporcionam uma leitura privilegiada da história do vinho, das modas, costumes, preconceitos, estéticas, trejeitos, doutrinas, quando não dos ideários políticos de cada época, como o atestam de forma tão eloquente alguns dos rótulos revolucionários do período pós 25 de Abril. É um mundo de serventia estética, um universo de lembranças estéticas ou mensagens enternecedoras, de recordações de pessoas, lugares e datas, como se se tratasse de uma teatralização do vinho.
Talvez por isso, os rótulos constituam uma das colecções mais reconfortantes para o enófilo apaixonado, ultrapassada apenas pela colecção de garrafas… cheias! Para o esteta, o historiador e o sociólogo a colecção poderá ser igualmente motivante. Basta pensar no maravilhoso acervo de rótulos de Vinho do Porto e Vinho da Madeira, na genialidade de criações como os famosos rótulos da Ramos Pinto, para perceber o milagre destas colecções. Acima de tudo, coleccionar rótulos é uma forma de compreender e exaltar o vocabulário estético do vinho.
Para dar início à sua colecção basta aprender alguns dos truques mais simples que o ajudem a destacar os rótulos das garrafas. No passado, quando as colas solúveis em água ainda eram habituais, bastava mergulhar a garrafa em água quente para que o rótulo se soltasse. Os rótulos modernos, na sua maioria em papel autocolante, tornaram esta operação mais delicada.
Pode no entanto continuar a tentar o método da água quente. Para tal basta encher um recipiente com água bem quente e atestar a garrafa com água igualmente quente. Os rótulos mais antigos adaptam-se particularmente bem a esta metodologia. Prepare-se para secar rapidamente o rótulo guardando-o em seguida sob pressão para retomar a sua forma. Se a metodologia não funcionar acrescente um pouco de sabão em pó ou detergente à água quente. Por vezes é o suficiente para acelerar o processo. Experimente como alternativa o secador de cabelo na potência máxima directamente sobre o rótulo para dissolver a cola existente. É um processo moroso mas válido em desespero de causa.
A velha lâmina de barbear do passado poderá ser uma opção frutuosa nos casos mais extremados. Porém, para além cansativa e pouco prática, consegue ser igualmente eficaz na destruição de muitos rótulos. Uma palavra de precaução, o coleccionismo de rótulos pode ser viciante! A sua colecção terá tendência para crescer de forma desmesurada, dando origem a um monstro que lhe consome tempo… e espaço.