Quando dois anos bastam para criar uma base de sustentação a uma marca, tornando-a capaz de se impor entre as referências do Douro (e do país), é caso para se indagar qual é o segredo. A vinha, com 10 hectares, na margem esquerda do Douro, junto a Foz Côa, sem dúvida é um dos ingredientes fundamentais. O outro há-de ser o DNA, que junta na presente geração dos Nicolau de Almeida duas idades da enologia que se complementam.
Do pai, João, pouco mais há a dizer. Pioneiro no estudo de castas, nas microvinificações e autor de alguns dos vinhos que revolucionaram o Douro e lhe abriram novos horizontes para lá dos Porto, foi um dos pivots da primeira revolução nos vinhos regionais. Dos filhos, há ainda muito a esperar. Mateus é o senhor dos Muxagat, vinhos elegantes, com contorno e personalidade. João lidera o projecto da Quinta do Pessegueiro, ainda em fase embrionária. Graça e Mafalda, as mulheres da casa, não mexem na vinha nem na adega, mas entram por direito próprio nas deliberações sobre o que é ou não deve ser o Monte Xisto.
Do cruzamento destas duas gerações veio o velho saber do terroir ou das castas e as novas preocupações com a agricultura sustentável, que trava o uso de herbicidas e pesticidas na vinha. João, o patriarca, deu saberes e experiência nos primeiros domínios, mas aprendeu que quando se usam químicos “os vinhos ficam todos uns iguais aos outros”. Sem modismos nem modernidades forçadas, o que os Nicolau de Almeida procuram é exactamente o contrário: um vinho de terroir.
Dos 10 hectares de vinhas do Monte Xisto, apenas uma parte ínfima é utilizada na vinificação das 3500 garrafas do Monte Xisto. A selecção implica um trabalho de relojoaria. A escolha de cacho a cacho exige estudo, procura e saber. Para já ninguém pensa em aumentar a produção nem em criar uma segunda marca — a maioria esmagadora da produção da quinta é vendida. Os Nicolau de Almeida vêem no seu projecto uma espécie de celebração dos pergaminhos familiares, uma espécie de tributo ao pai e avô, Fernando Nicolau de Almeida, criador do Barca Velha. Não há lugar para riscos: a qualidade é que conta.
O resultado final desta atitude é fácil de prever. O Monte Xisto de 2012 tem a elegância e frescura própria do ano, mas acrescenta-lhe uma intensidade e complexidade aromáticas notáveis. O seu aroma é austero, deixando transparecer notas florais e de arbustos, como que escondendo a surpresa que o seu impacto na boca provoca.
É aí que a sua extraordinária riqueza de fruta se manifesta, bem sustentada numa estrutura de taninos densa mas já rematada. O final, longo e delicioso, é o corolário quase lógico deste vinho irresistível, complexo e cheio de personalidade, que traduz não apenas a identidade de um lugar mas também a atitude de uma família. Um vinho memorável, nas garrafeiras a cerca de 70 euros.