Fugas - Vinhos

Nuno Oliveira

Portugal profundo e o enoturismo

Por Rui Falcão

Conhece alguma das regiões vinícolas de Portugal? Já viajou por alguma das muitas regiões nacionais com o propósito deliberado de as visitar e aí fazer turismo? Para um país que reivindica uma ligação intensa e inata para com o vinho, não deixa de ser surpreendente o alheamento geral para com o seu universo.

A maioria dos portugueses desconhece o interior de Portugal, desaproveitando assim uma das formas mais agradáveis de fazer turismo dentro e fora de fronteiras, o turismo vínico, aquilo a que se convencionou denominar como enoturismo.

Não caia na tentação de acreditar que o enoturismo é uma proposta exótica destinada exclusivamente aos apaixonados pelo vinho, uma tentação exclusiva para aqueles que têm o vinho em tamanha consideração que até se dão ao trabalho de viajar para o provar.

O enoturismo não só está ao alcance de todos como é um pretexto ideal para passar momentos de lazer individuais ou em família, momentos de tranquilidade e serenidade que lhe permitirão descobrir um outro lado de Portugal.

Um tipo de turismo que permite conhecer pessoas interessantes e com histórias para contar, um tipo de turismo que permite debruçar-se sobre valências tão díspares como a arquitectura ou a gastronomia mergulhado em paisagens de cortar a respiração. Mais que um propósito por si próprio o enoturismo, é o pretexto perfeito para viajar por paisagens extraordinárias fora dos circuitos tradicionais que lhe permitem conhecer um outro lado de Portugal.

O enoturismo define-se como um ramo do turismo mais próximo dos valores da natureza e do prazer hedonista, atraindo um grupo de visitantes que privilegia um envolvimento mais directo e íntimo com a história, cultura, gastronomia e, como não poderia deixar de ser, com o vinho nas suas diversas vertentes.

Apesar de presente, porém, o vinho funciona mais como um expediente ou um catalisador que um motivo único para esta forma alternativa de fazer turismo, aliciando turistas exigentes e com um padrão cultural mais elevado, viajantes com exigências superiores e um espírito crítico mais desenvolvido.

O vinho e a gastronomia, temas indiscutivelmente indissociáveis entre si, potenciam a visibilidade das pequenas e das grandes diferenças regionais, acentuando a identidade de cada região.

A vontade de fazer enoturismo é conciliável com as motivações tradicionais para fazer turismo, sejam elas o simples descanso, viagens de negócios, visitas a amigos ou familiares, golfe, lazer, descoberta de paisagens, história, aventura, praia ou qualquer outro tipo de motivação.

Para os produtores associados ao fenómeno, o enoturismo é igualmente uma oportunidade única para difundir os seus atributos, promovendo e aproveitando um contacto directo com o consumidor, criando um laço afectivo que perdura para além do momento da visita.

Num passado ainda muito recente seria muito difícil falar de enoturismo em Portugal. A oferta era escassa, o número de espaços abertos era incipiente e as propostas eram tendencialmente amadoras, vivendo mais do entusiasmo e da boa vontade dos poucos proponentes que de um serviço verdadeiramente profissional e consequente.

A Herdade do Esporão foi um dos primeiros projectos a despontar para esta nova realidade e a mudar o paradigma, investindo seriamente e de forma organizada numa estrutura pensada e desenhada especificamente para o efeito, juntando a componente turística, paisagística, gastronómica e comercial à produção de vinho e azeite.

Durante alguns anos, a Herdade do Esporão foi um dos raros produtores nacionais a aperceber-se deste novo fenómeno de turismo de qualidade, oferecendo um serviço profissional e bem desenhado que sensibilizou não só os muitos turistas nacionais que rumaram a Reguengos de Monsaraz como muitos viajantes estrangeiros que nos visitavam.

Há pouco mais de uma década, um grupo mais ou menos alargado de produtores, oriundos sobretudo do Alentejo e Douro, despertaram para esta realidade do enoturismo e para o potencial desta nova forma de fazer turismo.

Embora exista hoje uma oferta suficientemente dispersa por todo o território nacional, a verdade é que Alentejo e Douro continuam a reunir a maior concentração de projectos idealizados e desenhados propositadamente para o enoturismo.

O que não deixa de ser um contra-senso, sabendo que estas duas regiões estão distantes dos dois grandes centros urbanos de Portugal, Lisboa e Porto, não só as duas maiores cidades como porta de entrada para a maioria dos turistas que nos visita. Seria expectável que, pela sua proximidade a estas duas cidades, regiões como o Vinho Verde, Bairrada, Lisboa, Tejo ou Península de Setúbal abraçassem o conceito de forma mais entusiástica e sistemática.

O enoturismo é seguramente um nicho de mercado dentro do grande universo do turismo, tal como o são o golfe, o turismo de aventura ou o turismo religioso. Poucos turistas, mesmo entre os enófilos mais apaixonados, estarão dispostos a gastar uma semana inteira de férias simplesmente para visitar vinhas e adegas.

Por isso, a oferta deverá ser diversificada e terá de ter em conta que a maioria dos visitantes tem um interesse muito relativo sobre o vinho.

Mas apesar de o enoturismo continuar a ser um mercado de nicho algumas regiões internacionais conseguiram atingir um sucesso assinalável com a sua exploração de forma sustentada. De acordo com as estatísticas, a região norte-americana de Napa Valley conseguiu durante o ano de 2012 arrecadar um pouco mais de um milhão de euros somente com a actividade enoturística.

Um valor exorbitante que revela a importância que o enoturismo pode adquirir para os produtores e para a economia local das regiões vinícolas que consigam tirar partido deste nicho de mercado.

 

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