Fugas - Vinhos

  • Enric Vives-Rubio
  • Adriano Miranda

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O vinho português anda à procura de um perfil mais elegante

Anselmo Mendes, um dos mais conceituados enólogos do país, lamenta que em Portugal “está a ficar tudo muito redondo”. Explica: “Um destes dias um americano lembrava-me que em Portugal quando falamos de vinho só falamos de fruta e de vinhos redondos. Ora os nossos vinhos sempre tiveram uma aresta”. Onde procurá-la? Nos taninos mais rugosos, na acidez?

Cada enólogo de cada região terá a sua resposta, mas o simples facto de as perguntas sobre o que deve suceder a uma geração de vinhos mais ou menos homogeneizados em torno da doçura das frutas, da madeira e do álcool elevado é por si só uma reacção que suscita simpatia: “Sabemos o que se quer e isso é o mais importante”, diz Anselmo Mendes. “Estamos a mudar a agulha e, na minha opinião, para um melhor sentido”, complementa João Paulo Martins.

Há, ainda assim, um risco nestas mudanças. O de os vinhos portugueses passarem de um padrão internacional para outro padrão internacional. Jorge Monteiro, que se tem batido pelo carácter único dos vinhos nacionais, admite-o, mas relativiza o problema ao considerar que “há uma diferenciação à partida, que são as castas portuguesas. As mudanças em curso não põem em causa a nossa identidade”, afirma. Uma visão lógica para quem vê o país do exterior, mas, à partida mais complicada quando se analisam as diversidades do vinho português dentro de fronteiras.

João Paulo Martins alerta a propósito para os perigos causados pelas enormes plantações de Touriga Nacional, principalmente, mas também de Alvarinho e, moda mais recente, de Touriga Franca por todo o país. “Arriscamos a fazer vinhos iguais de Norte a Sul”, alerta. “Há o risco de haver uma perda de identidade das regiões portuguesas. Tenho medo que isso aconteça. O Dão, por exemplo, quer fazer vinhos como o Douro. O caminho não é esse”, nota Anselmo Mendes (ler mais sobre esta polémica nas páginas 28 a 30).

Com todos os desafios e todas as ansiedades próprias de um sector que, há 40 anos, “só produzia granel para as colónias”, como recorda Anselmo Mendes, o vinho português vai-se consolidando nos mercados externos. “Nos últimos três anos houve um crescimento acentuado e continuado nos Estados Unidos”, congratula-se Jorge Monteiro.

“Estamos a chegar à crista da montanha de um país que não é apenas o maior importador em valor do mundo, mas também uma montra mundial. É lá que estão revistas cuja pontuação influencia todo o mundo”, nota o presidente da Viniportugal. O terreno conquistado, porém, torna o desafio das próximas etapas muito mais exigente. Deixar de concorrer com a gama média do Chile, por exemplo, e entrar na disputa com as grandes regiões de Itália ou da França é outra.

Apesar de todos os prémios conquistados, “falta finesse aos vinhos portugueses, principalmente aos tintos”, diz Anselmo Mendes. “Os vinhos franceses, por exemplo, têm classe à mesa”, acrescenta. Por outro lado, “falta definição para o carácter de cada região, ao contrário do que acontece em França”, o país-referência quando se fala da alta cultura do vinho.

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