Fugas - Vinhos

DR

As surpresas do Altano

Por Manuel Carvalho

Uma prova com Altano de 2004 e 2005 comprova a tese: este vinho produzido pela Symington na Quinta do Ataíde nem sempre tem o crédito que merece.

Quem por acaso tiver na garrafeira alguns exemplares dos vinhos Altano das colheitas de 2004 ou de 2005 pode dar-se por feliz. Muito provavelmente, quando esses vinhos foram adquiridos ninguém os olhava pelo seu potencial futuro. Eram (e são) vinhos razoavelmente baratos, destinados ao consumo imediato no dia-a-dia e estavam longe de poder ostentar uma marca ou um conceito que os recomendasse para outra coisa que não uma vida efémera.

Certo é que quem hoje provar os Altano desse tempo vai ter uma boa surpresa. Os vinhos, principalmente o de 2004, evoluíram muito bem e apresentam-se hoje com uma intensidade e uma complexidade admiráveis. 

Nas histórias do vinho há muitos casos assim, casos de vinhos que nascem como patinhos feios e demoram anos a ser percebidos pelo seu real valor. A verdade é que os Altano nunca foram capazes de se bater de igual para igual com muitas das ofertas das suas gamas de preços. Talvez por causa da sua marca. Talvez por um problema de comunicação. Talvez por fazer parte da gama mais baixa do portefólio da Symington Family Estates.

Estar no último lugar de um ranking de qualidade, porém, pode não significar uma qualidade duvidosa. Tudo depende da relação que se fizer entre as três gamas de vinhos DOC Douro assinados pelo grupo da família Symington. Claro que o Chriseya é um vinho superlativo, é evidente que os Quinta do Vesúvio, principalmente os que estão no mercado da vindima de 2011, são tintos com uma classe superior. Mas também é evidente que os Altano são vinhos que, noutros portefólios, estavam condenados a ter outro brilho. 

A sua história começou em 2000, quando os Symington tomaram posse da Quinta do Ataíde, na sequência da compra da Cockburn’s. Para a equipa de enologia da casa, os 86 hectares de vinhedos desta propriedade situada no vale da Vilariça, Douro Superior, tornaram-se um campo de experiência que sustentaria o projecto dos DOC Douro. A vinha de Ataíde tinha sido uma criação de Miguel Corte Real que, numa opção premonitória, plantou milhares de pés de Touriga Nacional nos finais dos anos de 1970. Hoje esta casta representa 26,5% total da vinha da quinta, toda ela gerida de acordo com os métodos de produção integrada.

Os primeiros Altano foram vinificados principalmente à base de Touriga Franca (75% do lote), com a Touriga Nacional a servir de acompanhante. Só depois de 2009, quando o Altano Reserva passa a assumir a designação da Quinta do Ataíde, é que esta trajectória se inflecte e a Touriga Nacional passa a compor o lote na íntegra. De comum aos vinhos destas duas gerações permanece a aposta em barricas de carvalho americano. “Fomos aprendendo ao longo dos anos até chegarmos aqui”, diz Charles Symington que, em conjunto com Pedro Correia, assina a enologia do Altano.

Os vinhos da primeira geração apresentam-se hoje com uma personalidade muito marcada, não só pelo tempo como pelo balanço entre as duas castas. O 2004 é disso um bom exemplo. Um portento, com taninos ainda vigorosos, vagamente secos, que se balançam com aromas vivos, com notas balsâmicas de cedro. O 2005 é mais exótico, com sensações de iodo, e mais sedoso, embora menos complexo. E o 2008 (no qual a Touriga Nacional representa já 40%) apresenta um aroma muito fino, com enorme frescura e profundidade. Face a estes atributos, as recentes edições do Altano Reserva Quinta do Ataíde podem ser um pouco mais unidimensionais, mas não se espere encontrar na sua prova apenas aquela faceta redonda e perfumada da Touriga Nacional. O Quinta do Ataíde de 2011, que está a chegar ao mercado, é, pelo contrário, um vinho com aromas muito diversos (bagos vermelhos, balsâmicos, com especiaria), taninos evoluídos, com uma notável frescura e firmeza no final. Um belo tinto a um preço (8,90 euros) muito interessante.

--%>