Fugas - Vinhos

A “Bíblia” do vinho está outra vez no mercado

Por Manuel Carvalho

É uma mistura de dicionário com um índice descritivo, uma combinação entre um prontuário e um guia de recomendações. Ao reunir todas estas facetas, o “Vinhos de Portugal” que o jornalista João Paulo Martins coloca no mercado pelo 22º ano consecutivo é uma obra imponente. E obrigatória.

Não só porque se empenha em registar a produção que lhe chega ao nariz, como aceita o risco de assinar recomendações sobre os melhores ou a notar os menos bons. É uma obra de autor, mas a subjectividade que deixa transparecer não compromete a ambição de reunir, avaliar e retratar num único volume o estado da arte do vinho em Portugal.

Ao contrário do que acontecia há duas décadas, provar e redigir notas de prova sobre a produção nacional hoje é uma tarefa ciclópica. Nos primórdios da aventura, bastava um livro de tamanho modesto para a cumprir. Nas últimas edições, foram precisas cerca de 680 páginas e este ano, para evitar um volume de maiores proporções, foram suprimidos o glossário e o capítulo das “perguntas e respostas”. Como novidade, aparece uma pequena lista de “vinhos imperdíveis”, que se situam na categoria do desejo quase impossível, e um capítulo dedicado aos vinhos até aos quatro euros – para quebrar a percepção de que este guia é um objecto para afortunados. A secção “Melhores do Ano” mantém-se no figurino tradicional.

João Paulo Martins passou dois meses e meio a provar os vinhos num roteiro por todo o país. Alguns produtores (60 do Douro, 40 do Alentejo e 14 dos Verdes) não responderam ao pedido de envio de amostras. Com o que foi possível reunir, o jornalista foi obrigado durante esse período a “manter o olfacto no nível que se exige para dezenas e dezenas de prova por dia”. O que não terá sido difícil, dadas as conhecidas aptidões olfactivas do guru (ou o Robert Parker, numa comparação mais cosmopolita) do vinho em Portugal. Foi ainda assim “um trabalho solitário, em que a atenção não se pode dispersar, e por isso acaba por ser uma conversa entre nós e o vinho”, escreve Martins na introdução ao livro.

Com este volume na mão, qualquer consumidor de vinho em Portugal pode dispor de uma espécie de âncora e de farol para as suas escolhas. Como seria de esperar, as apreciações de João Paulo Martins estão longe de ser consensuais – não há consenso sobre os vinhos como não há consenso sobre a arte. Mas, ao menos, pode encontrar-se nestas páginas uma primeira apresentação da identidade de cada um deles. E, depois, há as recomendações. Se for impossível aos leitores perder um dos dez “vinhos imperdíveis”, entre os quais estão por exemplo o magnífico Porto Ne Oublie de 1882, da Graham’s ou o José Maria da Fonseca Moscatel Superior de 1955, há muitas deleitosas oportunidades nos “Melhores do Ano”. Para ler e provar.

Vinhos de Portugal 2016
João Paulo Martins
Oficina do Livro
Preço: 16 euros

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