Fugas - Vinhos

Rui Soares

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Alentejo, terra plural

Podemos encontrar herdades impressionantes na extensão, vinhas colossais que se estendem até onde a vista alcança, ao mesmo tempo que avistamos pequenas hortas, vinhas de projectos pequenos que por vezes desafiam a lógica financeira. Podemos encontrar muitas vinhas jovens conduzidas de forma moderna e segundo as tendências da moda a par de vinhas muito velhas, algumas delas sem condução aparente e dispostas individualmente em taça, mantendo o aspecto de um classicismo desmesurado.

No Alentejo podemos encontrar vinhas recheadas por uma macedónia de castas regionais e provenientes de outras paragens, variedades nacionais ou estrangeiras, a par com algumas das resistentes regionais hoje quase perdidas e frequentemente desvalorizadas. Uma diversidade notável que não esconde uma preocupação natural sobre quantas variedades alentejanas terão sido perdidas durante a malfadada campanha cerealífera do Estado Novo? Mas também uma diversidade que tem vindo a ser preservada e resgatada do esquecimento graças ao empenho dedicado de um pequeno grupo de pequenos e grandes produtores da região que não poupam esforços para defender o património genético alentejano.

Falamos do Alentejo como se fosse uma só realidade, usamos a palavra no singular quando na verdade deveríamos falar do Alentejo no plural. Referimo-nos ao Alentejo como o grande sul, esquecendo-nos que geograficamente uma parte significativa do Alentejo reside no centro de Portugal. Basta pensar que Borba se situa a norte de Lisboa ou que Portalegre se situa mais a norte que a cidade de Santarém.

O Alentejo oferece muitas esquinas, muitas personalidades e muitos feitios. Algumas dessas faces, as menos tradicionais, raramente estão representadas no estereótipo do Alentejo, um Alentejo diferente que se aparta dos chavões do costume. Existe o Alentejo das searas e dos olivais, o Alentejo fresco mas seco, o Alentejo das terras do Norte mas também o Alentejo raiano de terras recentemente desbravadas que não tinham tradição na vinha. Existe o Alentejo das montanhas, as serras de solos rochosos e paupérrimos mas de clima fresco e húmido, de água pródiga e de longa tradição na vinha. E existe ainda um Alentejo da água farta e copiosa, o Alentejo da exuberância do verde e do barro onde a vinha cresce e floresce com a vista dos arrozais a pontuar o horizonte.

Um Alentejo de concepções divergentes que alarga os conceitos e fundamentos da região ilustra a diversidade da região que garante que os vinhos alentejanos estão longe de apresentar um discurso monocórdico.

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