Fugas - Vinhos

Adriano Miranda

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Os vinhos estão a ficar menos alcoólicos, mas a crítica continua a querer embebedar-nos

Para que o teor de álcool real de um vinho aumentasse em média 1%, seria necessário, argumentam os autores do estudo, que a temperatura média na altura da maturação das uvas tivesse subido cerca de 11 graus Celsius. Ora, as temperaturas médias têm subido nas principais regiões vinícolas do mundo entre 1 e 2 graus Celsius.

Ainda de acordo com o mesmo estudo, os vinhos portugueses são os que apresentam as menores discrepâncias: apenas 0,05%, um valor que pode ser considerado um arredondamento. O país mais desonesto é o Chile, logo seguido da Argentina, Estados Unidos e Espanha. O estudo foi baseado nas análises feitas nos últimos 18 anos pelo organismo público que testa os vinhos vendidos na província de Ontário, no Canadá. Foram avaliados 91 mil vinhos de todo o mundo).

Mas por que razão os produtores inflaccionam o teor alcoólico dos vinhos? Porque nas últimas décadas os principais críticos de vinhos têm pontuado melhor os vinhos mais robustos, potentes e concentrados. E esta preferência foi incutindo no consumidor a ideia de que álcool elevado é sinal de qualidade. Perante a opinião da crítica e o gosto dos consumidores, os produtores sentem-se como o tolo no meio da ponte. A necessidade de realizar dinheiro também não ajuda. Os vinhos são vendidos cada vez mais cedo e é mais fácil beber um vinho novo mais alcoólico do que beber um vinho novo com menos álcool mas mais ácido e um pouco mais tânico.  

Em Portugal, este dilemas e paradoxos nunca foram tão evidentes como hoje. Basta ver as classificações atribuídas nos últimos anos pelas principais revistas de vinhos nacionais e internacionais para se constatar que os vinhos tintos mais pontuados estão todos acima dos 14% de álcool e que os brancos não têm menos de 13%. O mais curioso, ou caricato, é que não há um crítico de vinho que não perore sobre o excesso de álcool nos vinhos. Queixam-se, criticam, mas na hora de pontuar acabam sempre por dar melhores notas aos vinhos mais potentes e alcoólicos.

O caso mais notório envolve os chamados Douro Boys, um grupo que inclui a Niepoort e as Quintas do Vallado, Crasto, Vale Meão e Vale D.Maria. De todos, o que está a fazer os vinhos mais em linha com as tendências de consumo actual é a Niepoort, com reflexos nas vendas, que não têm parado de aumentar, mas os seus vinhos mais abertos e com menos álcool, como o Charme ou o mais novo Turris, por exemplo, são os piores pontuados. Em contrapartida, os vinhos da Quinta do Vale D. Maria - o  elemento mais pequeno do grupo- é a que produz os vinhos com mais álcool e, no entanto, é o produtor mais pontuado pela revista Wine Advocate, fundada por Robert Parker.

Dirk Niepoort, um dos produtores que mais tem ajudado a melhor a imagem dos vinhos portugueses na cena mundial, tem uma explicação para o desfasamento entre a crítica e o mercado. “Os críticos não levam as provas a sério e vão pelo caminho mais fácil, que é pontuar melhor o que é mais óbvio e impressionante. A fineza e a elegância passam-lhes mais ao lado do que a ´brutaleza`”, diz. E acrescenta: “O consumidor está farto de pesadelos. A moda do vinho pesado acabou”. Dirk reconhece que os seus vinhos menos extraídos e com menos álcool são penalizados em prova cega, mas a recepção dos cosumidores e as vendas “têm sido fantásticas”, assegura, mostrando-se convicto de que os críticos “vão ter que se adaptar ao mercado”.

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