Fugas - Vinhos

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Quinta dos Frades surpreende com um topo de gama

Por Manuel Carvalho e Pedro Garcias

Um Grande Reserva que homenageia Delfim Ferreira, um industrial que foi dono de Serralves, vem reafirmar a ambição dos seus herdeiros de colocarem a Quinta dos Frades na vanguarda dos produtores de DOC Douro.

Durante muitos anos, quem passasse pela estrada nacional que segue na margem esquerda do Douro entre a Régua e o Pinhão olhava para a Quinta dos Frades com um sentimento misto de espanto e de mistério. De espanto porque, desde o seu palácio no topo de uma pequena colina quase em cima do rio até às belíssimas encostas plantadas com vinho, a quinta pode facilmente ser incluída na lista das mais belas propriedades do Douro; de mistério porque para lá da sua existência física, a quinta nunca foi o lugar de nascimento de uma marca ou de um vinho que fizesse justiça à sua grandiosidade e beleza. Esses tempos acabaram de vez. Não pelo lado do espanto. Mas pelo do mistério. Hoje, a Quinta dos Frades é berço de uma gama de tintos do Douro que vale a pena conhecer e apreciar.

Uma vinha pode ser valorizada por um sem número de critérios, mas talvez o que melhor atesta o seu potencial é o que dá origem a vinhos que se destacam pela sua autenticidade e identidade. Uma prova vertical dos vinhos que compõem a curta história da quinta é suficiente para se constatar que, para lá das variações associadas às características de cada ano, há um perfil, uma paleta de aromas e sabores e uma estrutura que garantem a singularidade da Quinta dos Frades.

A sua exposição está essencialmente voltada a poente, o que garante uma maior frescura aos seus vinhos, mas o desenho das colinas que ocupam 200 hectares (um latifúndio para a escala do Douro) proporcionam um puzzle de exposições diversificadas. A altitude varia pouco, mas o suficiente para poder abraçar os humores da temperatura duriense, mais quente nas zonas junto ao rio, mais fresca nas vinhas mais elevadas. Depois, para lá desta diversidade que se conjuga para formar um terroir único, há ainda a considerar o trunfo fundamental da Quinta dos Frades: o património vegetal das suas vinhas.

Hoje, há na propriedade uma área de vinha que ronda os 75 hectares, dos quais cerca de 40 são de vinhas velhas ou muito velhas — algumas com mais de 90 anos. Quando aceitou o desafio dos proprietários da quinta (os herdeiros do industrial Delfim Ferreira), o enólogo Anselmo Mendes dedicou-se a estudar o potencial desse recurso. “Conseguimos identificar 23 castas diferentes”, recorda.

Mas não foi essa diversidade o que mais o surpreendeu, até porque é certo e sabido que as vinhas velhas do Douro são quase sempre campos de ensaios ideais para se observar videiras de diferentes naturezas. O que mais o impressionou foi, sim, o predomínio de castas que em alguns casos caíram no esquecimento, na vertigem modernizadora que tomou o Douro de assalto nos últimos 25 ou 30 anos. “Há lá uma proporção muito grande de Tinta Amarela, um número considerável de pés de Tinta da Barca, de Alvarelhão, de Rufete, de Tinta Carvalha ou até um pouco de Mourisco”, diz o enólogo.

Claro que há também pés de Touriga Nacional ou de Touriga Franca, a dupla obrigatória do vinho do Porto e, principalmente a Nacional, a estrela da companhia dos modernos DOC Douro. Mas estão longe de dominar. O que não preocupou Anselmo Mendes, um enólogo que questiona a opção (ainda) dominante na indústria do vinho que tende a privilegiar o álcool elevado ou a cor — ele diz que “a enologia ficou escrava da maturação fenólica”.

As características das vinhas velhas da Quinta dos Frades estão longe de produzir vinhos com pouca cor, pouco álcool ou pouca estrutura; mas garantem uma acidez natural aos vinhos que os torna admiravelmente elegantes e frescos e os poupa ao cansaço que por vezes vinhos mais opulentos proporcionam. “Nunca gastei um quilo de ácido tartárico (produto que serve para corrigir a acidez dos mostos) nos vinhos das vinhas velhas”, diz Anselmo Mendes.

Para a vinificação do primeiro Grande Reserva Homenagem ao Comendador Delfim Ferreira, da colheita de 2011, Anselmo Mendes foi mais longe e procurou as parcelas de vinhas velhas onde sabiam que havia “uma menor percentagem de castas convencionais”. As uvas foram pisadas a pé em lagares de pedra e após seis a dez dias de fermentação com temperatura controlada, estagiou em barricas novas de carvalho francês durante um ano. O resultado é impressionante (ver prova nesta página). Aquiles de Brito, o membro da família responsável pela gestão da Quinta dos Frades, diz que este vinho “genuíno, autêntico” é uma boa forma de homenagear a memória do seu bisavô. O Grande Reserva só será repetido em anos especiais.

Os vinhos

Homenagem ao Comendador Delfim Ferreira 2011
Douro imponente, de grande solidez tânica, profundidade e frescura mineral (fornecida pelas vinhas velhas). É um pouco mais seco e mais marcado pela madeira do que o Quinta dos Frades Vinhas Velhas do mesmo ano, mas com comida parece ganhar outra vida e elegância, mostrando melhor o que vale, que é muito. Um grande tinto.
Pontuação: 
95/100

Quinta dos Frades Vinhas Velhas 2008
O seu frescor é impressionante e o tempo deixou-o mais químico e balsâmico, deu-lhe finesse e comprimento. É super saboroso e digestivo. Um magnífico vinho de uma grande colheita. Os melhores tintos do Douro, aqueles que envelhecem bem, são sempre de anos mais frescos, como é o caso de 2008.
Pontuação: 
96/100

Quinta dos Frades Vinhas Velhas 2009
O ano de 2009 foi mais quente do que 2008 e este Vinhas Velhas reflecte bem isso, mostrando-se um nadinha mais alcoólico e volumoso. É um Douro musculado, tânico, mas, ainda assim, cheio de vivacidade e excelente complexidade (notas de couro, farmácia, chocolotate preto).
Pontuação: 
93/100

Quinta dos Frades Vinhas Velhas 2011
Ao primeiro impacto, este é o “mais tudo” de todos os Quinta dos Frades já produzidos. É o mais opaco, o mais denso, o mais profundo, o mais opulento. Junta notas mais quentes, tipo tabaco e chocolate preto, com outras mais frescas, de natureza vegetal e química. Apesar dos 14,5% de álcool, é um vinho muito equilibrado e sápido.
Pontuação: 
94/100

Quinta dos Frades Vinhas Velhas 2013
Vinho bastante apimentado, com boa fruta do bosque e boa acidez, muito fiel ao padrão aromático e gustativo dos seus antecessores. Ainda é novo, mas tem potencial para seguir as pisadas do 2008. Muito bom.
Pontuação: 
94/100

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