O novo Barca Velha, de 2008, passou o teste do tempo a que são sujeitos os grandes vinhos antes de chegarem ao mercado e começou esta semana a enfrentar o teste da crítica, depois de ter sido apresentado publicamente pela primeira vez. Ao fim de oito anos em garrafa, a equipa de enologia do Douro da Sogrape, liderada por Luís Sottomayor, decidiu que a colheita de 2008 merecia entrar na restrita e exclusiva lista do mais emblemático e extraordinário vinho português, mas não foi fácil chegar a essa decisão.
Em 50 anos, apenas 17 vinhos haviam sido declarados Barca Velha, se excluirmos a possibilidade de a colheita de 1955 não ter sido declarada. Na empresa não há registos desse Barca Velha, mas no ano passado foi descoberta uma garrafa dessa vindima numa garrafeira de Lisboa — e tudo indica que seja autêntica.
Alguns desses 17 vinhos já nasceram Barca Velha e nunca durante a sua evolução em cave suscitaram dúvidas aos enólogos da Sogrape. Mas a escolha do 2008 foi mais difícil. Depois do último, de 2004, um dos melhores de sempre, a equipa de Luís Sottomayor, tinha o desafio de escolher um vinho que pudesse, no mínimo, causar um impacto semelhante ao do anterior. Mas não poderia ser um vinho “moderno”, cheio de finesse e delicadeza. O ano de 2007, um dos melhores da última década, declarado vintage no Douro (todas as casas exportadoras declaram Porto Vintage com as marcas clássicas), era o mais óbvio. Mas num dia de caçada na ilha Terceira, nos Açores, Luís Sottomayor organizou um jantar vínico no qual serviu um Quinta de Leda de 2008 e ficou surpreendido com a forma como o vinho estava a evoluir.
Foi o clique. Passou a prestar mais atenção aos melhores lotes de 2008 com potencial para Barca Velha e foi seguindo a sua evolução. O ano de 2008 foi bastante menos quente do que o 2007. Alguns picos de chuva durante a fase de maturação fizeram alongar a vindima e possibilitaram a obtenção de vinhos frescos. Mas, ao contrário dos de 2007, não eram vinhos indiscutíveis logo à partida. Eram mais fechados e esquivos. Um dia prometiam muito, noutro escondiam-se e lançavam dúvidas sobre o seu futuro. Porém, quando chegou a hora da decisão final, o 2008 mostrou a Luís Sottomayor que era mais vinho, apesar de nesta fase exigir mais paciência e conhecimento por parte de quem o beber, por ser algo introspectivo e misterioso. E tinha uma virtude importante: era um vinho mais clássico do que os anteriores, mais másculo, com mais tanino e vigor.
“O estilo mudou. Se vai ser este o estilo no futuro ou se foi apenas fruto da colheita, não sei, mas o vinho está diferente. E está de ‘puta madre’. Está mais taninoso e vigoroso, com mais potência”, comentava o crítico João Paulo Martins. Na sua opinião, é um vinho que precisa de cave, mas não para ser esquecido na cave. “Dois ou três anos chegam. Muita gente guarda o Barca Velha para uma ocasião especial, mas essa ocasião nunca chega e, muitas vezes, quando o vão beber o vinho já morreu. E então perguntam-se: É isto o Barca Velha?”, diz.