Fugas - Vinhos

  • Daniel Rocha
  • Daniel Rocha
  • Daniel Rocha
  • Daniel Rocha

Quinta do Gradil, um pedaço do Novo Mundo no Oeste

Por Manuel Carvalho

A Quinta do Gradil reinventou-se há sete anos. Desde então, já refinou a aposta no casamento de castas nacionais e internacionais, já afinou os seus vinhos, começa a pensar no aumento da oferta e, principalmente, em outra ambição no jogo da qualidade.

Há um pedaço de vinha um pouco abaixo da adega da Quinta do Gradil que exibe neste Outono tardio uma tonalidade vermelha intensa. Um pouco mais ao lado, numa das encostas suaves da quinta que fica perto do Cadaval, na região de Lisboa, uma outra vinha destaca-se com a mesma cor entre os amarelados pálidos do restante vinhedo.

Nesta sua aparição, uma e outra vinha denunciam pela cor das parras no final do ciclo vegetativo a sua origem nacional: na primeira está plantada a casta Aragonez (a Tinta Roriz do Dão e do Douro); na outra, um pouco mais distante do coração da quinta, encontram-se uns milhares de pés de Alicante Bouschet. Estas duas castas marcadamente nacionais que se destacam na paisagem, são, no entanto, apenas uma parte da vinha do Gradil e estão longe de ser a maior parte. Há outras castas nacionais aí plantadas, da Viosinho branca à Vinhão (ou Sousão) tinta, mas metade da quinta está plantada com castas internacionais que vão desde a cada vez mais familiar Syrah à Cabernet Sauvignon, ou até à bastante mais exótica Tannat, de origem sul-americana.

A proliferação de castas internacionais na região de Lisboa não é de agora e nada garante que se tenha intensificado. Da mesma forma, se é possível dizer-se que o Gradil baseou a sua vinha nos modelos do Novo Mundo, mas não se deve dizer que os vinhos do Gradil têm uma identidade própria do Novo Mundo. Para o Gradil como para muitos produtores da região de Lisboa, as castas internacionais são mais uma ferramenta comercial do que uma tentativa de imitar a Austrália ou o Chile.

No Gradil, o grande desafio da enóloga Vera Moreira e do consultor António Ventura é produzir vinhos nos quais as castas nacionais entrem em diálogo com as variedades internacionais. Depois, o estilo dos vinhos do Gradil foi-se depurando nos últimos anos, abdicando da potência aromática ou da extracção para procurar modelos nos quais a frescura, uma certa secura até, ou a finesse predominam. Sejam os lotes dominados, ou não, por uma casta nacional ou estrangeira, o facto é que os vinhos com a chancela da Quinta do Gradil começam a criar uma identidade própria.

Condições não faltam para que ali, naqueles 120 hectares de vinhas, se possam fazer vinhos com nível e com graça. Vista da estrada que segue para o Cadaval neste Outono ameno, a vinha é de uma evidente beleza, começando numa pequena faixa de planície antes de se erguer pelas colinas suaves que fazem parte da tradicional orografia do Oeste. Ali há diferentes exposições, solos mais arenosos ou mais argilosos e mesmo que as variações de altitude sejam pequenas, a possibilidade de ajustar castas a diferentes parcelas e de as tratar de forma diferenciada é razoavelmente ampla. Bento Rogado, responsável pela viticultura do Gradil, explica por exemplo como o controlo de produção da Aragonez em diferentes zonas serve para obter vinhos com maior ou menor acidez.

Uma vinha com esta dimensão no Oeste é uma gula para os mentores da quantidade. Luís Vieira, o proprietário que adquiriu o Gradil em 1999, sabe disso como poucos. Ele é o representante da terceira geração de negociantes que fizeram fortuna na transacção de enormes quantidades de vinho. Quando comprou a quinta à família Sampaio de Oliveira (dona da conhecida marca de salsichas Isidoro), teve certamente em consideração os 94 depósitos em betão com capacidade para 30 mil litros cada um. De resto, na época, o estado da quinta, que até por volta de 1940 esteve nas mãos da família dos sucessores do marquês de Pombal, era deplorável. “Tinha aí uns 80 hectares de vinha com 30 anos ou mais que produziam 200 hectolitros”, diz Luís Vieira. Era preciso começar de novo.

--%>