Fugas - Vinhos

Nelson Garrido

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O novo mundo do Douro

Diversos factores contribuíram para este despertar intempestivo. Mas as duas condições mais decisivas para o assalto ao Douro Superior foram a saturação das sub-regiões do Baixo e Cima Corgo, que já quase não tinham espaço para a criação de novas vinhas, tal como os preços desmedidos que começaram a ser pedidos nestas duas sub-regiões. Seria, no entanto, redutor afirmar que o movimento de deslocação para a sub-região se deveu exclusivamente a pressões geográficas ou financeiras. Para tal também contribuiu o atrevimento de muitos produtores, que compraram terras que em muitos casos nunca tinham tido o privilégio de fazer vinho. Por muito que isso possa parecer chocante, a presença da vinha em muitos locais do Douro Superior é recente e inédita.

Finalmente, convém não esquecer que sem a rega, sem a água do Douro e demais afluentes para garantir a viabilidade das vinhas novas, a epopeia moderna do Douro Superior muito provavelmente não teria acontecido. Sem a frescura da água que permitisse aliviar os efeitos de um dos climas mais secos de Portugal continental, onde por vezes passa quase um ano inteiro sem chover, a implantação da vinha continuaria a ser impossível com a força e entusiasmo com que tem sido promovida ao longo da última década e meia. Talvez esta realidade ajude a explicar a querença latente pela compra de terras com frente para o rio Douro. Condição que ajuda igualmente a explicar por que abundam as vinhas jovens e muito jovens, muitas delas quase planas e sem necessidade de recorrer a socalcos.

Com esforço e investimento, o Douro Superior ganhou estatuto e autonomia, vivendo um momento de afirmação e diferenciação. Há quem tenha chegado logo no início desta diáspora, há quem tenha chegado mais recentemente e há quem ainda esteja a chegar hoje ao Douro Superior. Há quem tenha investido de forma pesada e há quem tenha contado todos os tostões. Em qualquer dos casos, a história é a mesma, a de descobrir um mundo novo dentro daquela que é a denominação mais antiga e conservadora de Portugal. E o Douro Superior vive mesmo dentro deste estranho paradoxo de ser o novo mundo na denominação mais antiga do mundo!

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