Fugas - Vinhos

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Filhos de provador sabem fazer aguardente

Por Manuel Carvalho

Liliana e Tiago Rocha são dois jovens que se dedicaram à arte das aguardentes vínicas. Chegou a hora de introduzir sangue novo numa arte na qual o país tem pergaminhos depreciados.

Na história do vinho do Porto é comum encontrar dinastias de provadores que, geração após geração, dão continuidade a uma arte que exige memória, experiência e saber. Mas o mundo já não é o que era. Manuel Rocha é a quarta geração de uma família que ajudou a fazer o nome dos grandes Porto da Symington Family Estates, mas os seus filhos, Tiago e Liliana Rocha, não seguiram os seus passos e os dos seus antecessores nas salas de prova ou nas caves sombrias de Gaia. Deixaram o Porto de lado e dedicaram-se a fazer aguardente. Pelas peças de estreia que apresentam, o nariz da família não deixou de conservar os seus pergaminhos. A Mavem é uma belíssima aguardente.

Para se fazer Porto, como Manuel Rocha faz e fez durante anos e anos, é preciso aguardente vínica. Os seus segredos, perfis, qualidades ou métodos de processamento não lhe são estranhos. Os seus filhos acrescentaram a este saber certamente partilhado no seio da família alguns laivos de modernidade. Ou de marketing, se preferirem. O envelhecimento dos lotes, por exemplo, faz-se de acordo com a “Arte de Maturação Dinâmica”. E o que é isto? Tiago e Liliana explicam: “Aqui, cada lote envelhece debaixo de amplitudes térmicas extremas ao longo das estações do ano. Com o frio do Inverno retardamos o processo e deixamos brotar as notas frutadas e as fragâncias florais. Com o calor do Verão exploramos sabores de baunilha e maçapão.”

Para lá do esforço de conferir uma aura de modernidade a um processo de envelhecimento antigo, os dois jovens preocuparam-se em refrescar a imagem da aguardente. O conceito da marca tem por base a aventura dos Descobrimentos e a imagem sugere a arte da azulejaria portuguesa. As palavras de ordem que associam ao produto são desafiantes e inspiradoras. Como que se houvesse a preocupação de mostrar a aguardente como um produto irreverente e jovem. Para ser servido com gelo ou como base para cocktails. Se é verdade que as aguardentes velhas portuguesas são daqueles produtos de excelência que se perdem na obscuridade por falta de imagem, a Mavem quer alterar essa percepção e aliar o seu velho prestígio a novas roupagens.

Baseada no vale do Tejo, de onde vêm os vinhos originais para a destilação, a Mavem tem para já dois produtos para oferecer. A Mavem Real, “um blend de aguardentes vínicas muito raras envelhecidas durante pelo menos 40 anos”, (500 garrafas vendidas a 350 euros) e a Mavem de entrada de gama (edições de 5000 garrafas de meio litro vendidas a cerca de 40 euros). Um bom preço para a sua qualidade. Intensa no aroma e na prova, fina, macia e deliciosa, a Mavem faz justiça à grande arte portuguesa de fazer aguardentes. Afinal, o ADN dos filhos de provadores de Porto pode prosperar noutras latitudes.

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