Fugas - hotéis

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As boas noites do design em Évora

Por Carla B. Ribeiro ,

É uma estalagem com uma oferta que varia entre espaçosas suites e quartos partilhados com tarifas low cost. Mas também uma galeria de arte e, desde há algum tempo, um showroom bem no centro de Évora. Isto tudo com o design sempre como fio condutor.

No princípio era a semiótica. Depois, e muito por causa desta, chegou a paixão pelo design. Daí a abrir uma loja dedicada ao tema demorou apenas o tempo de surgir uma oportunidade. E então tornou-se cada vez mais óbvio para Luís Carmelo, escritor e ensaísta, além de professor, tendo passado pelo IADE, a Escola Superior de Design, que os objectos deveriam começar a ter a utilidade que lhes é intrínseca. Assim surgiu o Evora Inn Chiado Design - uma hospedagem que se instalou num renovado edifício (as obras já foram pensadas para a receber) bem no centro eborense, virada para a movimentada Praça de Giraldo.

O velho edifício, cujo currículo inclui até um solene momento histórico - foi da janela do seu primeiro andar que foi proclamada a República a 5 de Outubro de 1910, como atesta uma placa exibida sob a janela de uma das suites do primeiro piso -, mantém alguns elementos do passado. Como as janelas e varandins ou algumas das portas dos quartos, talhadas a ferro e vidro (umas grossas cortinas interiores asseguram a intimidade do espaço). Mas, apesar de lembrarem tempos idos, desde Fevereiro deste ano estes elementos passaram também a compor uma moldura a um conteúdo mais contemporâneo.

Não há canto que não revele um ou outro detalhe estético, a começar pela entrada, cuja estreiteza é disfarçada por um jogo luminoso de cores criado pelo conjunto de candeeiros de tecto e onde o hóspede é recebido por um pouco da história de António Ribeiro Chiado, o poeta eborense e monge franciscano que trocou a ordem pela vida boémia de Lisboa - por onde, juram alguns, manteve o celibato até à morte, enquanto outros fazem crer que viveu dias verdadeiramente hedonistas -, foi adoptado para dar a sua bênção tanto às duas lojas de design como agora à hospegadem.

A subida por escada (não há elevador ou acesso a pessoas de mobilidade reduzida) vai adensando a curiosidade, quer pelos objectos expostos, quer pelo mobiliário escolhido: meticulosamente arrumados, na maioria de (ou pelo menos com algum apontamento de) cores vivas, alinham no espírito de quem nos recebe com familiaridade. E nem é para menos: a estalagem é gerida como uma espécie de negócio familiar (entre Luís, a mulher, o filho desta e a respectiva mulher: todos põem mãos à obra quando chega a hora de tratar de cada um dos aposentos).

A verdade é que por aqui, entre obras de Júlio Pomar, Maluda ou objectos com o selo da Kartell ou da Rotodesign, é o típico espírito anfitrião alentejano que mais sobressai, principalmente nos momentos em que hóspedes e proprietários se reúnem na sala de convívio, por onde também se pode tomar um bom pequeno-almoço, no qual não faltam os doces da região, ou visitar exposições temporárias (quando a Fugas por lá passou podiam-se ver fotografias de David Infante), envolvidos pela beleza das peças que se impõem sem, porém, se sobreporem. Isto sem nunca descurar o conforto ou a utilidade de cada peça. Afinal, foi sempre esse o objectivo primeiro: dar utilidade ao sentido estético. É o que acontece com uma das peças de mobiliário que mais se faz notar: um móvel, feito de encomenda especificamente para ali, que remete o imaginário para um comum, embora gigantesco, código de barras.

Pelas três espaçosas suites (Exuberância, Nostalgia e Viva la Vita), que podem albergar uma família recorrendo a uma inteligente e discreta solução de duas camas a imitarem um móvel de parede, ou pelos três quartos duplos (Português Suave, Diamonds e Travelling) volta-se a encontrar a preocupação com a unicidade de cada peça, quer no design do mobiliário, nos candeeiros, nas mesinhas de apoio, nas cadeiras, nas mesas de cabeceira, nas cómodas, nos aparadores, nas prateleiras, nos tapetes e até no papel de parede - a excepção surge na casa de banho, funcional, mas onde o conceito design se ficou pela apresentação dos produtos de higiene oferecidos ou por algum apontamento decorativo; já os azulejos, loiças e torneiras mantiveram-se como estavam antes das obras de recuperação. "É uma hipótese ainda a estudar [mudar as casas de banho]; mas não foi a nossa prioridade".

De volta ao espaço de dormir, cada detalhe mais ínfimo revela uma notável preocupação estética e utilitária. Kartell, Calligaris, Muno, Rotodesign, Poliform, Magis, Edições Dimensão são apenas alguns dos nomes sonantes que nos acompanham numa estada por aqui, onde a larga e confortável cama embala suavemente o sono pouco perturbado pelo barulho que chega da rua traseira, onde a animação nocturna pode ser uma boa aliada na tarefa de chamar gentes a estas paragens - para famílias com crianças pequenas, os quartos virados para a frente garantem noites mais sossegadas, embora seja provável amanhecerem mais cedo com o burburinho que vai enchendo a histórica praça logo nas primeiras horas da manhã.

Mas as ofertas de alojamento não passam apenas pelas suites ou quartos duplos. Inicialmente, a solução encontrada para o último piso foi criar quartos para serem partilhados, cada qual com casa de banho e ar condicionado (o que no Verão eborense pode fazer a diferença entre uma noite bem ou mal passada), tema subjacente e decoração adequada: Stars (6 camas), Pop (6 camas) e Revolution (4 camas). No entanto, o futuro do espaço poderá passar por acabar com este tipo de alojamento: "a área low cost não está a ter a procura desejada", justifica Luís Carmelo. "A oferta de camas em regime de hostel multiplica-se pelo centro" e, embora no Evora Inn haja "uma oferta diferenciada", com casa de banho privada ou roupas e atoalhados de qualidade, é certo que quem busca uma solução do género não está preocupado com estes detalhes e muito menos com a decoração do espaço: escolhe o que lhe oferece a solução mais barata. Por essa razão, um dos espaços já estava a ser transformado - o quarto Stars, que já deverá estar pronto por esta altura - e os restantes esperavam uma decisão.

Porém, Carmelo não está preocupado, até porque não pretende rivalizar com os hostels da urbe. O mais relevante para já, segundo nos confessam os proprietários, ao mesmo tempo que nos guiam por cada história impregnada em cada peça, é criar uma oferta diferenciadora. Por isso, além da vertente design, o Evora Inn aposta num turismo cultural, não só criando circuitos em que o hóspede pode ser o seu próprio guia, como estabelecendo parcerias com algumas entidades da região: sejam ligadas ao enoturismo, à gastronomia ou mesmo às actividades de desporto ao ar livre. Mas não só: a estalagem apresenta-se também como um showroom, no qual é possível não só adquirir algumas das peças expostas como pedir orçamentos se se quiser recriar um dos quartos da estalagem em casa. Sempre obedecendo ao mesmo princípio: juntar beleza à utilidade.

Nome
Evora Inn Chiado Design
Local
Évora, Santo Antão, Rua da República, 11 (junto à Praça do Giraldo)
Telefone
266744500
Website
http://evorainn.com
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