Fugas - hotéis

Há mais cinco estrelas no Bairro Alto. Mercy!

Por Luís J. Santos (texto), Ricardo Rezende (vídeo) ,

As novas cinco estrelas do Bairro Alto: o Hotel Mercy é a mais recente coqueluche da hotelaria alfacinha e não só promete pequenos grandes luxos nos seus quartos como alberga mais estrelas: novo restaurante Umai do chef Paulo Morais, um íntimo cocktail bar aberto a todos e um terraço-miradouro para mais admirações alfacinhas. 

É sob o olhar de Sophia que vamos dormir hoje. O nosso quarto faz parte da série de alojamentos que o novo cinco estrelas de Lisboa, o Mercy Hotel, dedica a escritores e poetas portugueses e a nós calha-nos o luxo não só do quarto mas de uma parede onde o conjunto de pontos forma o rosto de Sophia de Mello Breyner Andresen. Ao centro do quarto, a cama, etereamente iluminada por baixo. Atrás da cama, uma longa mesa, onde também repousam obras da poetisa. Entre uma espiadela à vida da Rua da Misericórdia que corre ao Bairro Alto, enquanto debicamos uma uva da taça de boas-vindas e iniciamos um Nespresso, abre-se Sophia para que nos fale aos sonhos. "Puro espaço e lúcida unidade/ aqui o tempo apaixonadamente/ encontra a própria liberdade". No mercy.

Este nosso recanto lúcido é uma metáfora para todo o edifício, um boutique design hotel de 47 quartos em prédio clássico restaurado, aberto no Outono com o coração da cidade aos olhos. No quarto, outra parede é negro acrílico e no seu reflexo prolonga-se-nos o quarto até à noite. É um mundo de sedas, algodões, camurças, com jogos de luzes a fabricarem o seu teatro e cores suaves a contrastarem com o preto, criando espaço nos espaços. Até a casa de banho se divide em três partes, entre quarto sanitário, átrio com lavatório servido com produtos deluxe Pascal Morabito e, especialmente, a ampla caixa de duche a fechar-se apenas em água e negro.

Mas, no mundo para lá do nosso quarto, há mais luxos privados. É subirmos até às cerejas no topo do Mercy: o último piso é dedicado a apenas duas suites, pequenos apartamentos repletos de detalhes e mimos, com direito a varanda privada onde se pode, às boas vistas de Lisboa, tomar um pequeno-almoço ou um jantar à luz de velas com mordomo ao serviço... Entre as suites, um terraço prestes a transformar-se em miradouro aberto a todos para o derradeiro postal ilustrado alfacinha, rio, colinas e o castelo à proa.

"Atenção ao detalhe", vai-nos repetindo Teresa Fernandes, a directora do hotel que nos guia passo a passo pelo Mercy, projecto iniciado há uma década por um dos sócios, Carlos Vaz Antunes, que por fim viu a luz do dia, erigido segundo o traço e conceitos do arquitecto Miguel Saraiva. Um minimalismo sóbrio que a cada twist vai surpreendendo com detalhes.

Seja na original parceria com o Umai, restaurante afamado de Anna Lins e Paulo Morais que, depois de conquistar São Bento com a sua cozinha asiática, abriu no Mercy uma segunda casa, funcionando como o restaurante do hotel mas também com a sua autonomia (aqui são também servidos os pequenos-almoços continentais, com o pormenor de serem servidos à mesa, completíssimos, e não em regime bufett). Seja no bar, um intimíssimo lounge na cave com uma lista de cocktails exclusivos. Seja no mobiliário criado especificamente para o hotel ou no impacto da decoração global e que pode impressionar logo à entrada (ou mesmo na casa de banho pública - espreite o criativo objecto de design que é o lavatório-onda).

Já visto de fora, subindo pela Rua da Misericórdia (cujo nome traduzido para inglês baptiza o hotel), o prédio impressiona com a sua fachada a azulejos (da Azulima) e janelões por onde espiam manequins. São figurantes, que teatralizam no átrio do hotel a vida da cidade. O átrio é corrido a negro cortado por dourados ou beges e nos tectos correm redes, também douradas, frisadas num imaginário entre ondas e colinas. É um exemplo de, explica-nos Teresa Fernandes, como por todo o edifício se procura mostrar "como materiais podem ser trabalhados de forma original".

Quando por lá passámos, a decoração do átrio era feita com trabalhos de vários estilistas portugueses que vestiram os manequins-anfitriões de forma natalícia. Mas a cada temporada a decoração será mudada, portanto o átrio terá sempre alma nova, que pode ser dada até por outras artes, da pintura à escultura, sempre com assinatura de criadores portugueses. Isto porque a portugalidade é um dos conceitos-chave do Mercy.

Começa neste uso e promoção dos criadores, passa pelos tais quartos dedicados a escritores (além de Sophia, também Agustina, Torga, Camões ou Garrett são homenageados) e sente-se nos materiais nobres utilizados por todo o lado com uma aposta, "sempre que possível", em "produção 100% portuguesa". "Tentamos enaltecer o que é português, abrir a cultura portuguesa aos clientes, que são maioritariamente estrangeiros", diz-nos Teresa Fernandes.

No geral, garante a directora, é um hotel "contemporâneo mas quente", "clean mas com uma certa envolvência", onde o "conforto e atendimento personalizado são palavras-chave". Bons exemplos? Não há cliente que não tenha "tratamento VIP à chegada". "Há sempre uma fruta ou um doce conforme a temporada", diz-nos, lembrando que, "no Natal, foram convidados todos os clientes para um bolo-rei".

Entre seis tipologias (e devidos preços) diferentes, há particularidades no alojamento, não tão comuns hoje em dia: há quartos para fumadores e a Internet sem fios é gratuita (aqui uma adenda para sublinhar que há muitos hotéis de luxo que cobram e bem por este "luxo"...).

Todos os quartos, conforme a sua categoria, têm um espacinho de sala, um LCD de boas dimensões, além de máquinas Nespresso ou o obrigatório minibar. E bem pode não haver spa ou ginásio - não faz parte do conceito e o espaço também não chegava -, mas é pedir uma massagem no quarto e fica compensada tal ausência. Quem for fã da clássica banheira, pode optar pelos quartos Prestige, alojamentos premium no 5.º piso.

Ou então seguir para o derradeiro luxo, as tais suites no topo, onde os terraços são minijardins com cipestres, as camas apresentam-se num gigante king size, os roupeiros são closets e a música é servida por estação iPod personalizada. Os nomes das suites são, já de si, toda uma promessa: Moon River e Stars on the Sky.

E a propósito de estrelas, como se quer impor o jovem Mercy, um investimento de cerca de 11 milhões de euros, face às cinco estrelas clássicas do rei da zona, o mui prendado Bairro Alto Hotel? Teresa Fernandes enaltece o trabalho feito pelo "concorrente", em "voltar a dar vida ao Bairro Alto em termos de hotelaria" mas defende a "complementaridade": "Pode até haver entre-ajuda. Temos conceitos e estilos diferentes. Nós oferecemos quartos contemporâneos, eles têm quartos Belle Époque... Há espaço para ambos."

Mesmo em tempos sob o signo da palavra crise, ou não haverá crise no mercado do luxo? "Existe, existe", diz-nos a directora. "Mas Lisboa está cada vez com maior visibilidade e os cinco estrelas lusos têm preços muito convidativos para a maioria dos mercados externos." A crise condiciona tudo, portanto, sublinha, o que há a fazer "é trabalhar muito, nada cai do céu".

Já os hóspedes, pelo menos dentro do Mercy, a última coisa que terão vontade é de trabalhar, antes aproveitar este oásis urbano repleto de mimos. Para quem tem a sorte de cair numa das fofas camas do hotel, dormir cercado dos seus luxos, elevado por um mar de luz, para esses, sim, há mesmo misericórdia. Lá fora, como escrevia a Sophia que hoje vela o nosso sono, fica toda a "Lisboa oscilando como uma grande barca".

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A misericórdia do Umai
Anna Lins e Paulo Morais, considerado um dos melhores chefs portugueses de cozinha japonesa, já tinham conquistado fiéis com o seu Umai da Rua de São Bento. "Cozinha asiática no seu esplendor" inspirada nas culturas gastronómicas do Japão à China, do Vietname à Tailândia ou Índia. Chamam-lhe asian twist. Oferece degustações, dias dedicados a cada país, além de uma longa e variadíssima carta. Como por todo o hotel, mantém a sobriedade com toques e recantos que realçam o espaço, como os biombos orientais. O restaurante funciona para pequenos-almoços até às 10h30 e serve diariamente almoços e jantares (12h/15h e 19h30/23h).
Leia a crítica gastronómica de Fortunato da Câmara aqui

Intimíssimo cocktail bar
Chama-se Lisbon Lounge Bar, fica em cave e é um recanto confortável aberto a toda a cidade, a meia-luz, com parede-bar em iluminação etílica. Há jornais, revistas e livros à disposição. A especialidade são os cocktails, incluindo os clássicos, mas alguns deles de criação exclusiva. O da casa tem um nome misericordioso e baseia-se em vodka preta: Black Angel. O bar abre das 15h às 1h.

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Preços: Com pequeno-almoço desde cerca de 150€ (sem pequeno-almoço desde 120€) em época baixa - 160/190€ em época alta. Depois é sempre a subir até às suites, por cerca de 400€.

(A Fugas esteve alojada a convite do Mercy Hotel)

Nome
Hotel Mercy
Local
Lisboa, Mercês,
Telefone
212481480
Website
www.mercyhotel.com
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