Fugas - hotéis

  • Nelson Garrido
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A nova casa da masterchef

Por Sandra Silva Costa ,

A vista é relaxante, à noite ouvem-se os barulhos do campo, dorme-se bem e come-se ainda melhor. Reduzir a experiência à mesa será injusto mas é completamente inevitável – ou não estivéssemos hospedados num refúgio onde os temperos estão à mão de semear. Literalmente.

Há males que vêm por bem. Acreditamos quando nos dizem que nos dias anteriores à nossa chegada o termómetro passou dos 30 graus, mas este sábado de Julho acordou acabrunhado e pouco mudou de disposição ao longo do dia. O sol quase não dá ares da sua graça e no alto de Padreiro/Santa Cristina o vento também manda qualquer coisa. Posto isto, saíram-nos furados os planos para uma tarde de preguiça na piscina a olhar o vale do Lima e transferimos a sesta para um quarto perfumado a alecrim. 

E foi então que, numa tarde de Verão envergonhado, medimos o pulso à cama. Pousamos a cabeça nas almofadas, deixamo-nos afundar nelas e, voilà!, passamos para o outro lado em poucos minutos. Quanto à qualidade do sono que aqui se pratica, estamos conversados, concordam?

Acordamos já a tarde caiu e o cabrito no forno que comêramos ao almoço num restaurante bem típico de Arcos de Valdevez é agora apenas uma boa memória. Há males que vêm por bem, dizíamos: estamos prontos para uma refeição masterchef, quase sem passarmos pela casa de partida. Bem-vindos às Casas da Li.

Foi em 2011 que Lígia Santos se tornou na primeira Portugal, ao sagrar-se vencedora do popular concurso, na altura transmitido na RTP1. Temos que admitir: não acompanhámos o programa mas, pelo que nos foi dado a provar, não temos por que duvidar de que Lígia merece o título. Estamos à mesa quatro adultos e duas crianças. Lígia está lá em cima, a comandar o fogão instalado na ampla cozinha que conhecemos esta tarde. Vasco, o marido, é o chefe de sala e é ele quem trata do desfile de sabores.

Para entrada, tarteletes de alho francês e umas tão simples quanto deliciosas espetadas mediterrânicas: tomate cherry, presunto, manjericão e mozarela com vinagreta e orégãos. Avança-se depois para uma tosta de broa de milho com chouriça e maçã e logo a seguir para um bacalhau à Brás (com as batatas a chegarem fritas às rodelas) que se apresenta delicioso. O pão-de-ló com coulis de frutos silvestres e flor de poejo (antes do jantar, vimos Vasco a colhê-lo de um canteiro – as ervas aromáticas têm grande destaque na gastronomia de Lígia e aqui estão literalmente à mão de semear) poderia muito bem ter sido a cereja no topo da refeição. Mas deu-se o caso de termos provado, ainda, um licor de especiarias que Lígia engarrafou há um ano e meio e se revelou numa explosão de sabores memorável. 

Fosse esta uma noite de Verão a sério e agora avançaríamos para a mesa próxima da piscina iluminada. Talvez nos quedássemos apenas a contemplar o céu estreladíssimo (mas a manhã seguinte acordou triste na mesma) e a ouvir os barulhos do campo – ao longe, o ribombar de foguetes denuncia que hoje há festa na aldeia. Não está, porém, uma noite agradável, pelo que voltamos ao aconchego do alecrim. Este é apenas um dos cinco quartos que compõem as Casas da Li – os outros chamam-se alfazema, chocolate, castanheiro e azul. São espaços despojados, com decoração simples e funcional.

O nosso tem paredes pintadas em tons de verde, almofadões em cima da cama, mesas-de-cabeceira e candeeiros brancos. A casa de banho é separada da área de dormir apenas por uma parede (não há porta) e da banheira tem-se vista para uma nesga de Minho que entra pela janela. (Alerta: da banheira há também um vidro que dá directamente para a cama. Quem preservar absolutamente a privacidade no duche, é melhor pedir o quarto chocolate ou castanheiro). À frente da cama há uma televisão e por baixo dela, num móvel de apoio de aspecto vintage (mas apostamos que é contemporâneo), está uma taça com uvas e um cestinho com biscoitos, cortesia de Lígia. Já à chegada tínhamos experimentado outro mimo da casa, um cocktail de boas-vindas – no caso, sangria de Vinhão (casta tinta com implantação no Minho). 

Antigo, moderno

Entusiastas dos passeios na natureza e frequentadores assíduos das terras do Gerês, Lígia e Vasco andavam em busca de um lugar para instalarem o seu projecto de turismo rural. Quando encontraram à venda este terreno no alto de Padreiro/Santa Cristina perceberam que não valia a pena procurarem mais. “Tinha as características que pretendíamos. Queríamos que fosse nesta zona, e idealmente um espaço que estivesse bem inserido numa aldeia”, recorda Lígia. Mais inserido seria difícil: aqui do alto, junto ao castanheiro frondoso que dá nome a um dos quartos, tem-se vista para as casas em redor, para as brincadeiras do cão da vizinha, para o campo onde pasta um rebanho de ovelhas. À nossa volta, um imenso vale, verde Lima.

Os dois blocos que hoje compõem as Casas da Li (abriram no início de Junho) resultam da recuperação do edificado já existente. “É fácil perceber o que fizemos aqui: o granito da base das casas era o que cá estava, o ripado foi o que acrescentámos”, explica Vasco. Tanto ele como Lígia eram da área da engenharia civil, pelo que foi o casal que idealizou o que temos à frente dos olhos.

O trabalho de decoração também foi obra dos dois – sempre num diálogo entre tradição e contemporaneidade. Por exemplo, na sala de jantar (que também faz as vezes de recepção e sala de estar) mantiveram-se os nichos que existiam nas paredes, mas acrescentou-se uma moderna lareira embutida; resgataram-se dois aparadores da casa da avó de Lígia e a mesa de refeições foi feita com os tampos do balcão da confeitaria do avô de Vasco, mas em compensação a cozinha é do mais moderno que há. Poderia ser de outra maneira, quando sabemos que este é um território masterchef

É nesta grande cozinha que, quem quiser, poderá também participar nos workshops de culinária que as Casas da Li vão oferecer – Lígia já os faz em Famalicão, onde vive com o marido e dois filhos, mas a ideia é torná-los também uma imagem de marca deste seu projecto de turismo rural. Só para abrir o apetite: as casas originais tinham dois fornos a lenha, entretanto trasladados para o exterior, e Lígia já tem várias ideias a marinar na cabeça. “Mais para o Inverno, é provável que façamos um workshop de broa de milho…”, desvenda Vasco. 

A Fugas esteve alojada a convite das Casas da Li

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Como ir

Por estes dias, já deverão estar colocadas as placas que indicam o caminho para as Casas da Li. Quando a Fugas as visitou ainda não havia indicações e chegar não foi muito fácil. O GPS será um instrumento muito útil. De qualquer forma, quem partir do Porto deve tomar a A3 em direcção a Valença e sair para o IC28/Arcos de Valdevez. Uma vez nesta via, deve usar a segunda saída, em direcção à zona industrial de Padreiro. Passa-se entretanto por uma rotunda e deve virar-se à esquerda, seguindo novamente a indicação Padreiro; e depois outra rotunda, seguindo a placa que diz acesso local. Há-de encontrar a padaria Panilima e, chegando ao cruzamento, deve seguir em frente, tomando sempre a indicação Padreiro/Santa Cristina. Depois, serão uns 10 minutos a subir a encosta. Passa-se a Igreja de Cendufe e é continuar a subir. Na segunda igreja, estamos em Padreiro/Santa Cristina. Pode dar-se o caso de até já conseguir ver as Casas da Li, mas ainda há umas quantas ruelas a percorrer. 

O que fazer

As Casas da Li têm uma parceria com a Nature4, uma empresa de animação turística de Arcos de Valdevez, e podem providenciar um conjunto muito alargado de actividades, que vão da canoagem ao rafting, passando pelos passeios a cavalo ou aproveitando a ecovia do Lima. Quem pretender passear por sua conta em risco, pode fazê-lo com relativa facilidade: à distância de uma caminhada de uns 25 minutos, mais coisa menos coisa, poderá encantar-se com um passeio pelo bosque já em território da Paisagem Protegida de Corno do Bico. Se tiver a sorte que tivemos, poderá mesmo deparar-se com uma manada de garranos, os cavalos autóctones – encontrámo-los calmamente à beira da estrada, num daqueles momentos que tem tanto de inesperado como de mágico. De resto, a Porta do Mezio, que permite a descoberta do Parque Nacional da Peneda-Gerês, está a curta distância – assim como Arcos de Valdevez, Ponte da Barca ou até Ponte de Lima. É só adequar as possibilidades ao seu gosto pessoal.

Nome
Casas da Li
Local
Arcos de Valdevez, Padreiro (Santa Cristina), Lugar de Outeiro/Portelada
Telefone
917412895
Website
http://www.casasdali.pt/
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