Fugas - hotéis

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O design cai tão bem neste solar beirão

Por Sara Dias Oliveira ,

Os quartos têm nomes de plantas das serras da Estrela e da Gardunha. As almofadas são forradas a burel, o jacuzzi fica no antigo estábulo e a janela secular em forma de flor é a imagem de marca desta Cerca Design House, com as suas paredes de pedra. O chá de pés de cereja é cortesia da casa.

Já não nos lembrávamos de quão intenso é o frio da serra. Frio à séria, frio a valer, frio sem meios-termos. Ou é ou não é. A serra da Estrela está perto e a neve não tardará a cair. Arriscámos sair do carro sem casacos, numa corridinha, mas aquele frio depressa avisou-nos, na pele e nos ossos, que estamos numa aldeia beirã. À nossa espera, temos chá de pés de cereja – cereja do Fundão e não outra qualquer – e doce a condizer numa sala com bar e lareira a trabalhar, paredes de pedra, sofás, um puff-mesa, flores moldadas em burel, jornais, televisão. 

Marília Hilário, que recebe os hóspedes e trata de outros afazeres, e João Martins, responsável pelo marketing, dão-nos as boas-vindas num solar do século XVII que desde Março é um moderno hotel que tem design no nome. E não é por acaso. O toque do design não se disfarça, está à vista. E fica bem. 

A fusão de estilos pode não correr bem, passado e futuro nem sempre querem estar no mesmo espaço, mas aqui, no centro da aldeia de Chãos, a quatro quilómetros do Fundão, com vista para as serras da Estrela e da Gardunha, essa combinação não podia ter corrido melhor. 

Mantêm-se as paredes de pedra à vista, não se remove o barro nem as pedritas mais pequenas, não se modifica a traça original da escadaria de entrada, há madeira no chão. Os quartos têm bancos e almofadas forradas a burel de cores vibrantes, alcatifas vermelhas ou verdes, paredes com pedra, candeeiros de metal suspensos ao lado da cama, candeeiros de pé alto de madeira nos cantos, azulejos coloridos nas casas de banho. Eles avisam para esquecer o relógio, desligar o telemóvel, enxotar o stress, não obrigatoriamente por esta ordem, mas se possível tudo ao mesmo tempo. Temos livros numa estante contorcida na minibiblioteca caracol, temos sofás para esticar o corpo, lareira a funcionar, jacuzzi na antiga “loja das vacas” como lhe chamava o povo da aldeia – mas agora leia-se um estábulo com pedras na parede, vigas de madeira, que é um quente e reconfortante refúgio do corre-corre da cidade.Temos quartos com nomes de plantas das serras ali perto: sargaço, cardo, orvalhinho. Temos máquina de café no quarto, uma lista para escolher o que queremos à mesa do pequeno-almoço, quarto aquecido, jacuzzi à espera. Temos piscina lá fora que é tapada quando faz frio, como é o caso, e um pátio com mesas e cadeiras que se enche no Verão. E temos um livro de elogios à entrada com rimas de um escritor, desenhos de crianças e palavras de satisfação de quem ali ficou e prometeu voltar. 

Tradição e modernidade. Uma não ofusca a outra. Ambas se respeitam e os hóspedes agradecem a honestidade. O edifício não é um local qualquer da freguesia de Donas. O solar era conhecido como a Casa da Cerca, noutros tempos a Casa dos Machados do morgado da aldeia de Chãos. Permaneceu oito gerações na mesma família até mudar de mãos e acabar por ser restaurada para um hotel de turismo de charme que, de peito aberto, se apresenta como um refúgio elegante e contemporâneo longe da agitação da cidade. Temos a pedra dos tempos dos morgados e a suavidade do burel.

Potencial do interior 

Marília Hilário salienta os cuidados na intervenção que revelam respeito pelo passado, pela história da casa. O barro que se vê nas paredes de pedra, as pedras originais na escadaria da entrada. E depois há peças contemporâneas sem excessos. “É um design bastante moderno e que se enquadra no tradicional.” O hotel vai crescer já no próximo ano com cinco casas, cinco villas, que permitem uma maior privacidade às famílias que têm procurado o hotel. Marília Hilário conta que todas as decisões são devidamente ponderadas. “O projecto é sustentável, não podemos dar um passo maior do que a perna.” 

A janela secular em forma de flor inspirou o logótipo do hotel. A janela está por cima da cama do quarto instalado na antiga capela do solar. As paredes também são de pedra. É um quarto que se quis romântico, decorado a preceito. João Martins anda sempre de olho aberto a ver o que um hotel no meio de uma aldeia da serra pode oferecer. “As pessoas estão tão inundadas de modernidade que procuram raízes”, comenta. As experiências que se proporcionam podem fazer a diferença. 

A primeira vez que esteve na Cerca Design House foi como cliente-mistério para perceber como o local funcionava. Chegou da cidade, ficou impressionado. Internet em todo o lado, bom gosto na decoração, combinações elegantes, gente simpática. “É uma casa de campo diferente que mantém o tradicional, o típico, com um toque de modernismo.” Um antigo solar transformado em hotel moderno que não perturba a paisagem. “Está inserido na cultura desta terra. E descobri que esta zona tem tanta coisa para oferecer.” 

Assim é. A Cerca Design House sabe o que há à sua volta e aproveita o que tem ao pé da porta para mostrar aos hóspedes de que é feita a fibra de uma aldeia beirã. Aldeia beirã que se preze tem ofícios para revelar. Tânia Moreira é tecedeira e está disponível para mostrar como tecer à moda antiga num tear manual. Se há animais por perto, então é possível passear a cavalo, ser cavaleiro por um dia, pela zona rural do Fundão, de olho nas serras da Estrela e da Gardunha, e ainda levar uma cesta para um piquenique com produtos locais e regionais. Também é possível surpreender a cara-metade com massagem de relaxamento, acesso exclusivo ao jacuzzi e jantar romântico. E aos sabores da Beira não se diz que não e há possibilidade de ter à mesa as iguarias da região, as carnes, os enchidos, os doces. Os encantos do Fundão, as aldeias históricas e de xisto, o património histórico, cultural, judaico-cristão, a aldeia de Castelo Novo, que tem mesmo um castelo, e a vila de Alpedrinha entram num roteiro preparado à medida. São precisos quatro dias para esta aventura que inclui paisagens oferecidas pelo rio Zêzere e as aldeias da Barroca e Janeiro de Cima.

Os programas não estão fechados. Nunca estarão. Eles continuam atentos e se na Quinta do Zé Matos, ali a dois passos, há quem saiba explicar quais os cogumelos selvagens que se podem ou não cozinhar, porque não tentar proporcionar essa experiência a quem aprecie o alimento? E se há antigos lagares de azeite, que ainda usam os capachos, vislumbra-se então a oportunidade de incluir essa experiência no cardápio do hotel. Há várias opções.

A recuperação do solar tem uma história. Uma empresa familiar de Lisboa, da área da construção civil e imobiliário, apaixonou-se pelo edifício e não mais o largou. O fascínio pela casa, pela aldeia, pelo lugar, foi imediato. Marta Rafael, uma das proprietárias do hotel, fala desse encanto. “Não temos raízes na zona, mas gostamos do local, da envolvente das serras, e apaixonámo-nos pelo solar.” “Na arquitectura, na decoração, encontramos uma harmonia entre o antigo da pedra e da história do solar com o contemporâneo da decoração”, refere. A Cerca reabriu como hotel há nove meses. “Queremos proporcionar ao cliente, num solar antigo, tudo o que lhe traga conforto, calor. Que se sinta em casa mas com outros serviços e condições.” Marta Rafael passa os dias em Lisboa e sabe-lhe bem descansar na aldeia que oferece sensações pouco comuns na cidade. Calma e tranquilidade. “Acreditamos no potencial do interior, é uma pérola a ser lapidada, dada a conhecer”, comenta. Percebemos perfeitamente as suas palavras.

A Fugas esteve alojada a convite da Cerca Design House 

Nome
Cerca Design House
Local
Fundão, Donas, Largo da Praça, 1
Telefone
275759060
Preço
70€
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