Fugas - hotéis

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Aqua quente em terra fria

Por Rute Barbedo ,

Neste Outono, a região Centro ganhou um alojamento cinco estrelas, o Aqua Village Health Resort & Spa. A nova unidade usa a altura dos choupos para massajar os que não sentem vertigens e as profundezas termais para aquecer quem tem medo do frio.

Cruza-se pela primeira vez o café-mercearia Adelino. “Boa noite.” Do outro lado, nada. À segunda, o olhar sai cerrado, a voz mais convicta: “Boa noite.” E o nada retumba de novo no silêncio do monte. É provável que os 63 habitantes de Caldas de São Paulo não tenham gostado muito que aqui, mesmo junto a eles, se erguesse um aldeamento turístico de cinco estrelas. E é certo que a aldeia nunca mais será a mesma. “Antes, se uma equipa de futebol, por exemplo, viesse ao concelho [de Oliveira do Hospital] não tinha onde dormir”, ilustra o director do Aqua Village Health Resort & Spa, Francisco Cruz. Também aqui nunca se tinham visto piscinas de água quente nem casulos brancos pendurados nas árvores — os proprietários chamam-lhes “gotas” — transformados em gabinetes de massagem. O borrego nunca havia chegado ao prato com uma redução de vinho generoso e frutos silvestres nem a boca tinha provado ameixas em forma de sorbet (a cozinha de autor do restaurante Roots é uma das apostas da direcção). 

Esta é a mais recente unidade hoteleira de um concelho pouco explorado do ponto de vista turístico (embora, curiosamente, tenham aberto três novos espaços nos últimos meses). Tem ainda os portões à espera da chuva, para que ganhem a cor da ferrugem e tudo se enquadre melhor na natureza, ao seu ritmo, tal como incita a filosofia do lugar. É por aqui que entramos, num rectângulo de quatro hectares que cheira a terra molhada, com a primeira pergunta no bolso: porque se chama Aqua? Os oito edifícios do resort, que incluem o restaurante, o bar, uma sala de cinema (sobretudo a pensar nos mais novos), o spa e 29 apartamentos desenhados numa lógica familiar, dispõem-se ao longo do rio Alva, que nasce lá em cima, nos Montes Hermínios, da vizinha serra da Estrela (o Parque Natural começa daqui a três quilómetros). E do aldeamento também faz parte uma praia fluvial privativa, que aguarda os últimos aperfeiçoamentos, antes do regresso do tempo ameno.

Mas o motivo mais protuberante (e diferenciador) do Aqua Village são as águas sulfúreas que brotam sob o choupal. Conta-se que os tempos áureos destas caldas, as de São Paulo, foram antes do 25 de Abril, quando os aldeões recebiam os visitantes nas suas casas para que tomassem os ditos banhos “milagrosos”. Mesmo assim, muito poucos terão usufruído do elixir natural, que hoje abastece duas das três piscinas do resort: a interior, a 34°C; e a exterior coberta, a 38°C, ambas voltadas para o choupal.

É para a piscina ao ar livre que vamos, entreter-nos com as folhas amarelas que vão chuviscando, com as rãs que pouco têm que fazer, mas também com os sopros de ar que emergem (ao comando de um botão) na zona baixa da piscina. E se as orelhas começam a arrepiar, há bom remédio: mergulhar no azul de 38°C não custa nada. A vida difícil prossegue debaixo de um chuveiro de sete metros de altura, na tisana de cheiro a canela à saída de uma massagem com um lençol de seda, na longitude de uma espreguiçadeira. Torna-se particularmente dolorosa quando afagamos o corpo em lençóis de alfazema, sobre um colchão de palmo e meio, e adormecemos. 

Mais virgem que a Estrela

Foi apenas um cochilo; nada mais. Mas um pouco mais de luz evitará o desastre. Corremos os cortinados que não terminam e o que não falta são vidraças amplas para aproveitar o sol que resta do dia. Por momentos, sentimo-nos no Norte da Europa, onde a vida corre em janelas escancaradas. Mas o mobiliário maciço diz-nos bem onde estamos, não fosse ele produzido pela Móveis Sancho, empresa de Oliveira do Hospital, mais precisamente de Catraia de São Paio. É com eles que temos a sensação de estar a pousar um livro na floresta ou a ajustar os cotovelos num tronco de carvalho.

A família Cruz — que antes deste empreendimento se estreou no sector com uma unidade de turismo rural muito próxima do Aqua Village — acredita que a região fronteiriça da serra da Estrela tem “muito potencial” e qualidades ainda pouco exploradas. Acredita também no azeite, no vinho, no pão e no ar puro deste Portugal interior. É este lado virgem, sobretudo, que mais poderá cativar os amantes da natureza no seu estado bruto. O Turismo do Centro admite que o objectivo estratégico tem sido “sempre atrair o turista à serra da Estrela”, dando-lhe, a partir daí, “argumentos para prolongar a sua estadia noutros locais da região”, explicou à Fugas o presidente, Pedro Machado. 

Talvez esse movimento seja hoje mais equilibrado. Dadas as características do concelho de Oliveira do Hospital, montanhoso, aquoso e com ruínas romanas e pontes medievais, o turismo de natureza tem assumido cada vez mais protagonismo. É também por isso que faz parte dos planos de Francisco Cruz a programação de actividades como passeios pedestres e de bicicleta ou visitas guiadas à volta das águas quentes e frias da Beira Alta. Como uma casa, o Aqua Village quer estar sempre em construção. 

Como ir

A partir de Lisboa, o trajecto mais simples é conduzir pela A1 até Coimbra e, aí, tomar o IP3 em direcção a Viseu. De seguida, vira-se para o IC6 (Covilhã/Arganil). Alguns minutos depois, acompanha-se a N17 e toma-se a EM514, chegando ao destino. A viagem dura pouco mais de três horas. Do Porto, também a A1 serve de elo de ligação até Coimbra, e a duração total da viagem é de cerca de duas horas. 

Onde comer

O Roots Restaurant & Bar (aberto ao público não hospedado no aldeamento) quer tocar nas raízes e produtos originais da região beirã num salto ágil até às criações do chef Anderson Miotto. Ou, como o próprio afirma, concentra-se num misto de “comida regional e brincadeiras moleculares”. 

Porque a carta de vinhos privilegia o Dão e o restaurante privilegia a enologia, beber um Casa de Mouraz (biológico) ou um Vinha Paz num dos jantares vínicos que a direcção pretende organizar mensalmente será uma forte possibilidade. Para os amantes da cerveja, a artesanal Rapada dá o derradeiro toque regionalista — os seus criadores são da aldeia vizinha de Santo António do Alva, que outrora teve o nome de Rapada.

O que visitar

Parque Natural ?da Serra da Estrela
O parque começa a cerca de três quilómetros da unidade hoteleira, o que vale um convite para se subir, pelo menos, até ao ponto mais alto de Portugal continental. 

Praia Fluvial de Alvoco ?das Várzeas
Com bandeira azul desde 2014, é um dos espaços mais concorridos da região nos meses de Julho e Agosto. Fica a cerca de dez quilómetros do Aqua Village e inclui um bar, chuveiros, um parque de merendas com churrasqueira e a vista para uma ponte medieval. 

Piódão
Foi alcunhada de “aldeia-presépio” por ser uma implantação abrupta e escadeada de xisto na vegetação da serra do Açor. O Piódão é uma das aldeias históricas mais visitadas do país e fica a pouco mais de 20 quilómetros do aldeamento turístico.

Ponte das Três Entradas
No cruzamento dos rios Alva e Alvoco, ergue-se uma ponte sui generis em forma de Y que liga as freguesias de Aldeia das Dez, Santa Ovaia e São Sebastião da Feira. 

Aldeia das Dez
É também conhecida como “aldeia das flores”, pela decoração que os moradores costumam dar às ruas e parapeitos. Subindo ao Santuário de Nossa Senhora das Preces, ?a mata envolvente convida ?a um passeio que pode culminar no Monte do Colcurinho, ?um dos pontos mais altos ?da serra do Açor. 

Igreja de São Pedro de Lourosa
É uma das mais antigas de Portugal e um dos únicos (senão o único) exemplares do período moçárabe no país, facto comprovado pelos arcos em pedra com 1104 anos.

Cascata da Fraga da Pena
Com 19 metros de altura, esta queda de água abre uma pequena piscina natural (gelada, claro) nas proximidades da aldeia de Pardieiros (serra do Açor), onde foram rodadas várias cenas do filme Aquele Querido Mês de Agosto, de Miguel Gomes. 

A Fugas esteve alojada a convite do Aqua Village Health Resort & Spa

Nome
Aqua Village
Local
Oliveira do Hospital, Penalva de Alva, Caldas de São Paulo
Telefone
238 249 040
Website
www.aquavillage.pt
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