Fugas - viagens

  • O veleiro <i>Babilé</i> vai ser a casa de João Liberato e Natali Santos nos próximos três anos
    O veleiro Babilé vai ser a casa de João Liberato e Natali Santos nos próximos três anos
  • <i>Babilé</i>
    Babilé
  • <i>Babilé</i>
    Babilé
  • Natali Santos aos comando do <i>Babilé</i>
    Natali Santos aos comando do Babilé
  • Um dos objectivos da aventura passa por levar a Vela Solidária aos quatro cantos do globo
    Um dos objectivos da aventura passa por levar a Vela Solidária aos quatro cantos do globo
  • João Liberato dá os últimos retoques ao <i>Babilé</i>
    João Liberato dá os últimos retoques ao Babilé
  • A dupla de aventureiros João Liberato e Natali Santos
    A dupla de aventureiros João Liberato e Natali Santos
  • Marina do Mindelo
    Marina do Mindelo
  • Ponta do Sol
    Ponta do Sol
  • Praia da Laginha, Mindelo
    Praia da Laginha, Mindelo
  • Cueva de los Verdes, Canárias
    Cueva de los Verdes, Canárias

Uma dupla lusófona anda a correr o mundo em veleiro

Por Mara Gonçalves

Trocaram os empregos por um sonho: dar a volta ao mundo em veleiro. E a odisseia de João Liberato e Natali Santos já se fez ao mar

João Liberato e Natali Santos estão a dar a volta ao mundo num veleiro. Largaram empregos, viveram um ano no estaleiro onde reparavam o Babilé e em Novembro partiram de Portimão rumo ao sonho: velejar o globo. Uma odisseia que os levará pelos sete mares nos próximos três anos ou “até quando as saudades deixarem”.

João é português, engenheiro náutico e velejador desde os 11 anos. Natali é brasileira e oceanógrafa. Ele sonhava dar a volta ao mundo de veleiro desde pequeno. Ela sempre quis viver a bordo de um barco. Os sonhos cruzaram-se no momento em que se conheceram, há mais de cinco anos em Alfama, através de um amigo em comum. “Foi nesse dia que surgiu a ideia desta viagem e depois, com o passar dos anos, foi-se concretizando”, contam-nos a partir de Cabo Verde numa entrevista via Skype. “No dia em que nos conhecemos surgiu isto e a partir daí já não conseguimos fugir.”

Há um ano e meio deixaram os empregos em Angola, para onde tinham emigrado para juntar mais facilmente o dinheiro necessário à viagem, regressaram a Portugal e viveram a bordo do veleiro Babilé em pleno estaleiro até à data da partida. Depois da “decisão mais difícil” que tiveram de tomar – recusar ofertas de melhores condições profissionais e despedirem-se em tempos de crise – veio um ano igualmente “complicado”. “Choveu muito, o que atrasou os trabalhos, passou-se muito frio e foi desconfortável viver num barco em obras no estaleiro; mas foi importante para estarmos aqui agora e completamente à vontade com o barco”, recorda João.

No início de Novembro, João e Natali içaram âncora rumo ao sonho a partir de Portimão, cidade natal do português. Passaram quinze dias nas Ilhas Canárias e a 12 de Dezembro fundearam em terras da morabeza, onde ainda se encontram à espera de bons ventos para a primeira travessia oceânica rumo ao Brasil. “É muito bom chegar a um lugar que nunca vimos antes e hastear a bandeira desse país”, conta Natali.

O início da viagem tem sido marcado pela falta de sorte na meteorologia: mau tempo até às Canárias, percurso sem vento e por isso longo até Cabo Verde, chuva e céu nublado inesperados nas ilhas cabo-verdianas. Mas o que mais receiam é a pirataria. “O que se ouve falar mais é na costa da Somália, mas também acaba por acontecer na costa de muitos países da América do Sul, por isso depois convém evitarmos navegar com esteira e ter sempre o máximo de atenção a qualquer barco suspeito”, explica Natali. Por agora, afastados desse perigo, aproveitam para passear pelas várias ilhas de Cabo Verde e fazer pequenas manutenções no Babilé, o veleiro de casco amarelo e mais de 20 anos que os leva nesta odisseia.

Cabo Verde era um dos países mais aguardados da viagem, principalmente a capital da Ilha de São Vicente. “No Mindelo foi onde conseguimos passear mais, desfrutar da cultura e conviver mais com as pessoas dos sítios”, conta João. “É uma cidade muito activa culturalmente, o povo é muito acolhedor e está a ser muito giro nesse aspecto.” No Mindelo passaram os primeiros Natal e Fim de Ano da viagem, onde não faltou o bacalhau, trazido de Portugal, nem sequer as rabanadas, os sonhos ou o bolo-rei.

“Se as condições estiverem favoráveis, que em princípio no início de Janeiro sempre temos, devemos agora levar 20 dias até à Fernando de Noronha, que será a nossa primeira paragem no Brasil”, avançam. Depois de passarem por várias zonas do país, incluindo Santos, a cidade de Natali, o casal espera subir o Atlântico e atravessar o canal do Panamá até às Ilhas Galápagos, antes dos 40 dias de mar que os separarão da Polinésia Francesa, o destino mais aguardado.

“É um paraíso para quem tem um veleiro e gosta desta vida de estar ancorado e tomar banho de mar”, explica Natali. João pormenoriza o cenário idílico: “Ilhas de areia branca, coqueiros, bom tempo na medida certa, água quente, peixe…”. “Pensando num país tropical e num sítio para se parar, descansar e desfrutar da beleza natural, a Polinésia Francesa é sem dúvida o país que mais nos estimula”, conclui.

Depois de algum tempo no “paraíso dos velejadores” contam fazer uma paragem na Nova Zelândia para “esperar que passe a época dos furacões no Pacífico”, rumar ao Norte da Austrália, talvez passar por Timor-Leste e parar nas Ilhas Cocos (Keeling) antes de voltar ao continente africano, com possíveis paragens em Madagáscar, Moçambique, Ilha de Santa Helena e Cabo Verde. A última paragem deverá ser num dos arquipélagos portugueses e ancorar o fim da odisseia no regresso a Portimão.

O objectivo do casal, ambos de 29 anos, não é apenas navegar o mundo, mas sobretudo ir ancorando temporadas por diversos países, para conhecer “lugares, pessoas, culturas e gastronomias diferentes”. E levar a Vela Solidária aos quatro cantos do globo. A dupla de velejadores aceitou associar-se à iniciativa da associação Teia d’Impulsos para levar o conceito da Vela Solidária a outras partes do mundo, que procura mostrar os benefícios desta prática desportiva junto das populações mais desfavorecidas.

No final da odisseia, esperam “olhar para tudo de uma maneira muito diferente da que olhavam antes de sair de Portugal”. “Acho que, em termos profissionais, vai ser muito difícil voltar à carreira que tinha antes”, confessa João, antevendo também uma maior valorização das coisas simples da vida. “Aqui não temos televisão, não temos a pressão de um trabalho todos os dias, já vamos dando valor a outras coisas mais pequeninas, como tomar um banho de água quente, comer pão fresco ou comida feita no forno”, enumera.

Uma aprendizagem que continuará a ser feita nos próximos três anos ou “até quando as saudades deixarem”. “É um ponto muito difícil, porque quer queiramos quer não vai chegar uma altura em que vamos ter saudades da casa que não temos, da nossa família e das coisas da nossa cultura”, confessam. Até lá, a aventura pode ir sendo seguida via Facebook.

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