Royal Palmeira Loureiro Sur Lies Fines 2009 e Principal Rose Tête de Cuvée 2009. Vale a pena fixar o nome destes vinhos. Nos próximos tempos, vão certamente somar prémios e distinções nacionais e internacionais e ganhar um lugar no exclusivo lote dos melhores vinhos portugueses.
Vale a pena fixar também o nome do produtor: Carlos Dias. É um novo Mourinho mas com mais dinheiro. Não se intitula special one, mas tem a mesma filosofia ganhadora e o mesmo orgulho de ser português. Não se contenta em ser o melhor na sua terra. Em tudo o que se mete, quer fazer o melhor do mundo.
Carlos Dias é um bairradino de 55 anos que deixou Portugal pouco antes da revolução de Abril de 1974 para fugir à tropa e poder estudar ciência política (o pai tinha uma pequena fábrica de motos e bicicletas). Em Paris, foi ganhando a vida a fazer limpezas em prédios comerciais, tendo chegado depois a gerente de uma cadeia americana de hotéis. Nos anos 80, mudou-se para Perugia, em Itália, onde prosseguiu os estudos e acabou a desenhar e a comercializar os seus próprios móveis. Dos móveis, e já em Bolonha, passou para as gravatas, os cintos, os sapatos e as camisas.
Numa passagem de ano em Genebra, conheceu a sua actual esposa, uma portuguesa emigrada na Suíça e a sua vida nunca mais foi a mesma. Na Suíça, encontrou o ambiente perfeito para dar asas à sua antiga paixão por relógios antigos. Em 1993, já bem metido no ramo, ajudou o seu amigo Franck Muller a lançar as bases da que é hoje uma das mais reputadas marcas de relógios da Suíça. Dois anos depois, Carlos Dias criou a sua própria empresa de relógios, a Roger Dubuis, que era o nome do mestre relojoeiro que contratou.
O que aconteceu depois é quase história de filme. Em apenas uma década, Carlos Dias criou uma manufactura de alta relojoaria com dezenas de calibres próprios altamente complicados com o selo de qualidade Poinçon de Genève; e tirou a relojoaria suíça do classicismo em que estava mergulhada, criando um estilo extravagante que foi somando admiradores ilustres em todo o mundo, desde Vladimir Putin a Bill Clinton e George Bush, passando por George Clooney, Tom Cruise e Jô Soares, entre muitos outros. Muitos deles passaram pela fábrica, em Genebra, um edifício moderno e high-tech e cuja cantina era um dos melhores restaurantes da Suíça.
A Roger Dubuis virou um fenómeno fashion à escala mundial. No dia de abertura, a loja de Tóquio facturou mais de cinco milhões de euros. Um dos segredos da marca, para além do tamanho avantajado dos relógios e da sua complexidade, é a exclusividade. Apenas são produzidos 28 exemplares de cada modelo, a preços que chegam a atingir as centenas de milhares de euros. A ideia dos 28 exemplares foi inspirada no sultão do Brunei, cliente de Carlos Dias e para quem aquele número trazia sorte.
O melhor do mundo
Trazia ao sultão e trouxe ao empresário português que, em 2008, vendeu a maioria do capital da Roger Dubuis ao Richemont Group. Segundo algumas fontes, a transacção terá rendido cerca de 850 milhões de euros. Em poucos anos, Carlos Dias tornou-se num dos homens mais ricos de Portugal e também dos mais disputados pela banca nacional e até por alguns governantes, que já lhe tentaram vender dívida pública.
Como emigrante, Carlos Dias nunca teve outro passaporte que não o português. A inspiração para o sucesso vai buscá-la a Vasco da Gama, que cita frequentemente. Acredita no país, mas reconhece que Portugal só será conhecido e respeitado no mundo quando tiver 100 produtos de qualidade universal.
Foi essa convicção que o fez regressar de novo a Portugal, como investidor. Nos últimos dois anos, tem feito negócios atrás de negócios sem grande alarido. Tem andado pelo país como um cometa: primeiro passa e só depois é que surge o seu rasto. Começou pelos vinhos, uma das suas grandes paixão (possui uma das melhores garrafeiras do mundo) comprando a empresa Colinas de São Lourenço, em Anadia. Comprou depois o Paço da Palmeira, em Braga, ao BCP (por sete milhões de euros, diz-se), a Quinta da Pedra, em Monção, à Unicer, adquiriu olivais em Alfândega da Fé, uma quinta no Dão, está a construir um hospital em Coimbra (50 milhões de euros de investimento). Estes são apenas os investimentos que se conhecem, mas os seus negócios, em Portugal e noutros países, são mais vastos.
Carlos Dias não se contenta em fazer coisas boas. Gosta de dizer que quer fazer o melhor do mundo. Para isso, rodeia-se dos melhores. Para fazer "o melhor azeite do mundo", foi a Itália em busca do melhor técnico. Disseram-lhe que era português, o professor José Gouveia. Não o conhecia. Foi ter com ele e lançou-lhe o desafio. José Gouveia respondeu-lhe algo do género: "Não sei se consigo fazer o melhor azeite do mundo, mas podemos tentar". O primeiro azeite que saiu para o mercado, com a marca Principal, engarrafado e arrolhado como se se tratasse de um vinho, é já uma coisa séria.
Carlos Dias também quer fazer "o melhor chocolate do mundo" e já tem a pessoa certa: o italiano Cláudio Corallo, um antigo produtor de café que teve de fugir do Congo por causa da guerra e se instalou em São Tomé e Príncipe, onde, com inúmeras dificuldades, tem vindo a produzir café e chocolate de grande qualidade. Carlos Dias vai investir nele.
Na Quinta de Pedra, o empresário construiu de raiz o melhor alambique da região para fazer "os melhores licores do mundo" e contratou o melhor mestre da arte, um italiano. Nos vinhos, o empresário foi buscar Anselmo Mendes e o francês Pascal Chatonnet, dois pesos-pesados da enologia. O primeiro é responsável pelos vinhos da Bairrada, o segundo pelos vinhos do Minho.
Ambos já mostraram o seu génio: o primeiro com o Principal Rosé Tête de Cuvée 2009, entre outros; o segundo, com o Royal Palmeira Loureiro Sur Lies Fines 2009. Citamos apenas estes dois vinhos porque eles representam o estado da arte em Portugal, a confirmação de que é possível sonhar com "o melhor do mundo".
O rosé, feito de Pinot Noir a partir das primeiras prensas, é um vinho que mostra todo o seu potencial se for servido a 14 graus, algo impensável à partida. Se fecharmos os olhos, não diremos que se trata de um rosado. É simplesmente extraordinário, aliando frescura, complexidade e requinte. Na escala de 10 pontos da Fugas, merece 9 (na garrafeira Aromas de Vinho, em Valença, custou 22 euros)
O Royal Palmeira (que custou o mesmo) é um branco que eleva a casta Loureiro a um patamar nunca alcançado até agora (só os Loureiros das marcas próprias de Anselmo Mendes e da Quinta do Ameal se aproximam). O vinho passou vários meses sobre as suas borras finas, ganhando complexidade aromática, sabor e profundidade. Tem o cunho floral típico do Loureiro, mas com contenção e finesse. É muito fresco, vibrante e requintado. Explode na boca e deixa o mesmo rasto de frescura de um grande champanhe. Formidável. Merece 9/9,5 pontos.
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Precisos e requintados, como os relógios Roger Dubuis